À GIOVÂNIA ROCHA (GIO AMOR) Para seu texto "Felicidade"

Gio Amor!? Há quanto tempo? Eu estava com saudades de seus comentários! Quanto ao seu texto: “FELICIDADE” aproveito para lhe enviar minha homenagem de fim de ano. Gostei dos versos, por isto vou repetir o segundo aqui:

A luz do fogaréu

Do meu pensar a queimar,

Minha alma sem véu

Devasta pelo ar! (Gio Amor)

Esta trovinha me fez lembrar de um pensamento, que escrevi num de meus antigos poemas, é o seguinte:

“No limiar do sonho e da realidade, existe uma fenda, onde a paixão e a saudade se incendeiam, queimando esperanças, gerando uma fumaça, que tragada pelo sonhador, apanha o mal da depressão”

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Anexo aqui o trecho de um livro meu: “HISTÓRIAS DE UM VIOLINO” Da páginas 149 a 152:

O HORIZONTE DA VIDA

A estrada longa, a geografia e os lugares estranhos, juntos com a saudade, aumentava a tortura da distância, eram para o peregrino, torvelinhos de pensamentos, marcados por horas de lembranças e fagulhas que incendiavam a alma.

Porém na rota de sua vida sempre havia o contraste, que entre a felicidade e o desgosto, fazia parte dela.

O martírio aumentavam as angustias. A realidade era mais dor do que prazer, porém o sonho era o pai da esperança, pelo menos ele preenchia os momentos em que a solidão fazia seus ferimentos pelo vazio da lembrança.

O tormento era como tempestade: Uma obra da saudade; era como uma via esburacada à frente, onde um carro, transportando seu ocupante, cansado pelos solavancos, ia encurtando as distâncias no horizonte da vida!

Mas deixemos as divagações e o incêndio entre a saudade e a paixão, para descrever os movimentos do viajante pelas estradas incertas, com perigos constantes à espreita. A cada curva, cada ultrapassagem ou mesmo seu veículo, poderiam ser a fonte de algum acidente.

O velho Goliver obedecia sempre seus comandos, contudo dirigi-lo era um contínuo suspense, pois transportando sempre um sonhador, tinha dele momentos de desatenção.

Uma curva! A divagação era tanta que quase errou o golpe de vista, matematicamente calculado em último instantes. Cantaram os pneus, a gravidade e a inércia brigaram, mas o bom Goliver se equilibrou. "Desta escapei" - pensou o viajante.

"Ai, minha mãe! Vim de um lugar distante, dei conselhos, insisti, fui mal compreendido. Eis-me aqui agora, curvo, abatido, vazio e atormentado pelas recordações.

“Filho, pare o carro à sombra de alguma árvore e durma, ainda que seja um curto sono; mas esqueça da vida por uns momentos”.

-OH! Minha mãe! és boa conselheira – dizia à consciência.

Dez minutos de descontração. O viajante acorda, volta à realidade, a estrada a sua frente, parecia-lhe uma serpente a engoli-lo, agora mais atencioso, dava continuidade ao seu empreendimento, seu destino era Capelinha, última cidade se sua rota, ia cumprir uma missão, distante de sua casa mil e trezentos quilômetros.

Na rodovia o viajante via as conduções vindo em sentido contrários como a deslizar sobre as águas. Eram visões de óticas; os veículos não, porém a pista se apresentava como um rio. Compreendia tal ocorrência que desde adolescente sempre observava, quando, as vezes com sede, via além, a tal miragem.

Seriam os sonhos, como miragem?

Dos quilômetros iniciais, percorrera trezentos e trinta, mas a saudade continuava queimando com a paixão em seus sonhos. De onde provinha aquela energia? Chamada Saudade?

Ela atrapalhava o serviço do viajante; era como noite escura, sem luz, em que alguém tenta fazer algo, porém por falta de visão ficava perdido em seus movimentos.

Mas as angustias do viajante ia além das recordações. Seu sofrimento era por ter encontrado uma forte inimiga, por nome revolta. Enquanto ele queria distribuir os conselhos de bem, ela fazia prosperar as ações do mal entre os seres humanos.

A cento e dez por hora, continuava a equilibrar o carro, cujo nome, Goliver, se relacionava com o modelo de fabricação, (Gol), e parte de seu último sobrenome, (Oliveira), num pequeno arranjo, para melhor identificar o veículo de um viajante, com o nome (Gúliver) antigo viajante; romance de Jonathan Swith.

As horas passavam, e com elas outras geografias se apresentavam: Ribeiros, vales, planícies, regiões com serrados ou plantações diversas, tudo à beira da rodovia, numa composição que haveria de ficar registrada em sua mente para recordações futuras, que certamente traria novas angustias, pela saudade daqueles momentos.

O viajante peregrino tinha certeza de suas convicções, sempre voltadas para o bem, mas nos últimos tempos tudo parecia se opor aos seus ideais. Um inimigo tinha feito interferências em seu trabalho, se tal fosse visível poderia enfrentá-lo e vencê-lo; porém era em forma de pensamento, um sentimento, delineado por uma angústia depressiva que lhe tirava totalmente a vontade de viver.

Mas ainda que desanimado, continuava. Lembrava-se que no lugar de onde viera, ocorrera um acidente com um ônibus, no qual se feriram algumas jovens e morreu um menino. Fora lá para levar consolo às famílias, principalmente a enlutada. Eram amigos de tempos. Rodara em seu Goliver mais de mil e quinhentos quilômetros. Agora ali estava, remoendo a dor da saudade, com pensamentos incertos sobre sua nova missão.

Com as distâncias, as lembranças se avolumavam; recordava-se das crianças, da mocidade, das pessoas com meia idade e dos velhos, tanto homens como mulheres.

Para ele, o descortinar de novas paisagens trazia esperanças de retornar por onde havia passado e viver novamente os momentos de confraternização junto à seus muitos conhecidos, embora tristes com os acontecimentos daqueles dias.

A noite aproximara-se. A região montanhosa recebia uma tênue claridade vinda do oeste; era o astro rei, parecendo cansado e enfraquecido pelo arrebol do dia, emitindo seus estertores de vida. No céu as nuvens adquiriam formas diversas, o viajante às delineavam, criando imagens de animais ou seres humanos gigantes. Aos poucos desapareceram dando lugar às estrelas. A cidade próxima seria Diamantina, onde pretendia pousar. Suas meditações se fundamentavam na existência do Rei. As maravilhas da natureza: o dia, a noite, as montanhas, as nuvens e as estrelas, enfim, eram obras do Criador.

Ao chegar à cidade procurou um hotel onde pernoitou. Descansou, para na manhã do dia seguinte iniciar a jornada.

Logo nos primeiros quilômetros deu carona para um rapaz que lhe acenou a mão; nos poucos momentos que transportou aquele homem pode acrescentar mais filosofias às suas. Soube da vida das pessoas que vivem na vasta região do Vale do rio Jequitinhonha, da falta de chuvas, das terras estéreis, dos garimpos de cristais e outras vivências dos habitantes.

O companheiro de improviso seguiu até uma cidade baixa, por nome Couto Magalhães, onde ficou.

Em tal localidade, o peregrino conversou com muitas pessoas, já que optara em permanecer lá algumas horas. Gostava de arranjar novos amigos e tornar-se conhecido. Só partiu dali depois das cinco da tarde, satisfeito pelas novas amizades.

Seguindo por entre os relevos das grandes montanhas, logo chegou nas regiões planas. O final daquele dia chegava gradativamente.

A cento e dez por hora, tendo a rodovia um tráfego ameno chegou em um posto de abastecimento; parou uma meia hora para um breve descanso. Ao sair das dependências do posto olhando pelo retrovisor, viu um veículo opala também partindo dali. Os quilômetros foram passando, as regiões desertas chegaram; o tal carro vinha atrás do Goliver desde o posto que ficara à mais de quarenta quilômetros; o viajante começou a se preocupar, diminuiu a velocidade para ser ultrapassado, porém o outro veículo também diminuiu; acelerou para adiantar; o motorista do opala fez coisa idêntica. O viajante começou a ter pensamentos obscuros. A região, famosa pelas ações de assaltantes e a estrada deserta naquele trecho, seria propício, caso fossem bandidos, agirem contra ele. Percebeu quando carro que o se-guia aparelhou com o seu, ultrapassando-o e fechando-o a seguir. Sem pensar nas conseqüências virou a direção do Goliver pra direita, saiu no acostamento a cem por hora, apertou mais o acelerador, o retrovisor esquerdo estilhaçou-se ao triscar no do veículo que o fechou, o Goliver avançou. O coração do viajante estava aos pulos, a noite caíra, os faróis iluminaram as ramagens cortadas pelo carro à beira da estrada. Com o acelerador ao fundo destacou-se na frente do opala, entrou novamente na pista; com nervos tensos continuou fustigando o motor; o velocímetro foi pra cento e sessenta, naquele momento viu faróis em sentido contrário, gostaria de parar e pedir socorro, mas não havia tempo; os ameaçadores faróis do opala estavam atrás, vagarosamente se distanciando. De repente viu uma placa iluminada pelos faróis, indicando uma saída. O opala estava a uns quinhentos metros; diminuiu a velocidade do Goliver, entrou na direção em que a placa indicava: SERRARIA, o carro fez poeira, o opala continuou seguindo-o, o viajante mais preocupou-se: agora sim! Estava do jeito que queriam! O acelerador teria que ser acionado com mais cuidado; a estrada apresentava perigo, pois além do dos ladrões, ainda havia as irregularidades da pista.

Dois quilômetros! Enfim a indústria! toda iluminada. O opala voltou depois de um quilômetro talvez, sem sucesso de alcançá-lo. Ufa! Oh! minha mãe, o que faço?

A amiga consciência, disse-lhe para solicitar ajuda na indústria, onde aconselharam-no a permanecer por lá aquela noite, pois os assaltantes estavam agindo por aqueles lados, roubando carros e matando motoristas.

Dormiu dentro do Goliver próximo da serraria, no outro dia seguiria seu destino. Atrasaria a viagem, mas Deus o livraria!

O dia amanheceu lindo. O sol com sua vibrante luz foi iluminando os horizontes repletos de eucaliptos. O viajante pouco dormira devido os sobressaltos pelo ocorrido. Estava temeroso de continuar sua viagem.

Na parte da tarde um caminhão deveria levar madeiras para Capelinha, optou aguardar, já que fizera amizades com o proprietário da serraria: Pode muito falar das grandezas do Rei. No período que ali ficou teve oportunidade de aprender coisas a respeito das plantações de eucaliptos e do meio ambiente. Eram dezessete horas quando o cami-nhão, carregado de madeiras o escoltou até seu destino.

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Aí está querida Giovânia. Foi eu mesmo que passei os apertos pelos horizontes da vida. Naqueles dias eu tragara a fumaça da combustão dos sonhos com a realidade e tive dias de depressão.

Desejo-lhe um auspicioso ano novo. E que estejas sempre de bem com a vida e com o Peregrino de Luzirmil. Um abraço a ti, estendido aos teus entes queridos. Deus te abençoe agora e sempre.