POR QUE DIA DO TRABALHO E NÃO DIA DO TRABALHADOR?

Como o sistema consegue iludir as pessoas e como a sociedade se deixa manipular pelo capitalismo e suas mentiras. A maior armadilha é fazer o trabalhador comemorar sem perceber o Dia do Trabalho e não o seu dia propriamente dito. Se trabalho fosse bom não seria derivado de um termo em latim “tripalium”, instrumento de três pés utilizado no passado para manter presos os bois ou cavalos difíceis de ferrar. Há quem diga ainda que “tripalio” ou “tripalium” era um instrumento de tortura. No latim vulgar significa “pena” ou “servidão do homem à natureza”. Inicialmente passou-se à concepção de esforço e sobrevivência, neste caso é menos mal, já que esforçar-se para sobreviver é o mínimo que um ser humano normal tem que fazer, entretanto, a palavra SOBREVIVER não significa VIVER, porque, o termo SOBRE nos remete a um esforço que está além, muito maior para se manter respirando, já VIVER nos remete a um pouco de tranqüilidade, prazer e todos os derivados de uma vida saudável. Após a invenção do capitalismo e do lucro, os supostamente ma1s “espertos” se apropriaram da força de trabalho alheia para aumentar seus ganhos. Esses especuladores imobiliários da força produtiva alugam ou se apossam da inteligência, das habilidades e das capacidades dos outros, e os transformam em “mão-de-obra” barata pessimamente remunerada ao final de um estafante dia de trabalho, em troca obtém-se uma progressão geométrica de seus ganhos. Na relação capital-trabalho, os ganhos dos patrões são exorbitantes, crescem geometricamente, e o salário dos trabalhadores parece crescer em ordem inversa.

Como explica o professor Joaquim Julio Marcondes Sigaud deixa claro a diferença entre os conceitos de Progressão Aritmética e Progressão Geométrica:

“Chamamos de progressão aritmética, ou simplesmente de PA, a toda seqüência em que cada número, somado a um número fixo, resulta no próximo número da seqüência. O número fixo é chamado de razão da progressão e os números da seqüência são chamados de termos da progressão.

Observe o exemplo: 50, 60, 70, 80 é uma PA de 4 termos, com razão 10.

Progressão geométrica

Denominamos de progressão geométrica, ou simplesmente PG, a toda seqüência de números não nulos em que cada um deles, multiplicado por um número fixo, resulta no próximo número da seqüência. Esse número fixo é chamado de razão da progressão e os números da seqüência recebem o nome de termos da progressão.

Observe este exemplo: 8, 16, 32, 64, 128, 256, 512, 1024 é uma PG de 8 termos, com razão 2. Enquanto na aritmética o valor sobe de 10 em 10, na geométrica, o valor dobra de oito para 16, de 16 para 32, 64, 128 até 1024. É assim, o capitalista ganha sempre, já o trabalhador, só perde.

É exatamente o tipo de exercício que os capitalistas mais aprenderam a fazer nas escolas particulares por onde estudaram. Eles não são muito bons em dividir, mas adoram somar e multiplicar. Dividir é coisa de socialista, dizem!

Na lógica matemática de um capitalista, a maneira de contar é assim: um, dois, três, quatro pra mim, e, um e dois para vocês (no plural, porque é o que sobra para os trabalhadores).

Analisando o conceito de progressão geométrica logo se percebe que TRABALHO só é mesmo bom para os expropriadores, exploradores e supostamente “donos do capital”. São expropriadores, porque tudo que os ricos possuem não passa de uma expropriação da força de trabalho. Segundo os dicionários expropriar é “desapossar alguém da sua propriedade ou parte dela, pagando-lhe um preço estipulado” (Priberan).

A única riqueza do trabalhador é...

Sua força de trabalho, sua a capacidade no exercício de funções, suas habilidades e as múltiplas inteligências que possui, inteligências essas, hoje mapeadas por especialistas de RH, na hora da seleção do trabalhador, estas são (quer dizer, eram) propriedades do trabalhador, porém, vendo-se desprovido do nada e a mercê do capitalista, o mesmo torna-se refém dos interesses de alguém, que praticamente toma posse dessa força produtiva individual, que multiplicada aos milhares rendem bons lucros aos empresários. A burguesia torna-se dono da força de trabalho de outrem. Se o trabalhador, já não tinha nada e nenhum tipo de propriedade, agora é que não possui nada mesmo, pois a única coisa que lhe restava foi apropriada legalmente por alguém de posse do capital, ou seja, o especulador capitalista, tal como um especulador imobiliário sai à procura da força de trabalho mais barata e a adquire por um preço irrisório, alugam e compram pessoas como na época da escravidão, tudo isso com respaldo de leis que os favorecem, e favorecem à expropriação capitalista. Ainda querem desejar ao trabalhador um...

Não, jamais aceitaria isso!

Imagine um patrão apertando a sua mão cheia de calos e dizendo: “Feliz dia do trabalho”. Certamente eu o mandaria plantar batatas!

Feliz dia do trabalho. Esse é um tipo de felicitação que não significa nada, exceto fazer-me indignar, se trabalho fosse bom no contexto capitalista onde se trabalha de 8 a 12 horas (contando com as horas extras) os patrões trabalhariam e não pagariam alguém para executar tarefas para eles. A lógica perversa do capitalismo tem transformando o trabalho num conceito religioso, pior é que as religiões cristãs ocidentais incluíram em suas liturgias essa visão idiota de que “o trabalho enobrece o homem”. Lembro-me muito bem de quando trabalhava que na gráfica Bradesco, Cidade de Deus, em Osasco. Eu tinha 20 anos de idade, eu rolava aquelas bobinas de papel o dia todo para as máquinas Offset onde eram feitos os talões de Cheques, à noite ia para a escola, esgotado. Os talões eram colocados em caixas com as inscrições do livro de Provérbios do tipo: “Vai ter com a formiga, ó preguiçoso; olha para os seus caminhos, e sê sábio” (Provérbios 6:6). Quando chegava ao final do expediente, depois de um dia estafante de trabalho duro, assim que colocava os pés do lado de fora o trabalhador topava com uma placa enorme com dizeres reforçando o trabalho. Eu olhava para as inscrições e logo me lembrava do dono do Bradesco Amador Aguiar, e murmurava: “filho da mãe, está podre de rico, e eu aqui lendo essas besteiras”.

Tudo isso faz parte de uma ideologia, um conjunto de doutrinas, crenças, ideias, normas, procedimentos e valores estipulados pelo tipo de sociedade em que vivemos com objetivos claramente explícitos de ganhar sempre mais encima dos outros, e essa ideologia é imposta pela classe social burguesa e empresarial através de vários mecanismos. Através de uma representação imaginária do real que induzem homens e mulheres a agir de forma subalterna, completamente dominados por uma falsa consciência e uma falsa sensação de liberdade e de felicidade em nome das quais o trabalho não poderia ficar alheio.

Como pode a ideologia do trabalho ser tão forte ao ponto de levar uma pessoa a acreditar que os ricos são ricos porque merecem ou porque trabalharam de fora estafante para isso? O que leva as massas oprimidas subalternas a pensar que o trabalho enobrece o homem sem se perguntar: “Que homem ele enobrece”?

As classes parasitárias do capitalismo conseguiram induzir milhares a pensar que esse seu dia é o Dia do Trabalho, quando na verdade deveria ser o contrário, e Getulio Vargas introduziu na Lei Federal exatamente como o patronato queria. Viva o 1º de Maio!

Se antes o operário ia para as ruas realizar seus protestos, agora, o mesmo comemora junto com seus patrões o dia do trabalho, e o melhor funcionários, o mais puxa-saco é homenageado como funcionário do ano ou funcionários padrão. Pelo menos foi isso que assistir até os anos 90, com direito a musica cerveja e churrasco dentro da fábrica.

Neste modelo de sociedade capitalista o trabalhador não trabalha para viver, ele vive para trabalhar. A proposta socialista era que o homem trabalhasse para viver, por isso esse modelo é e sempre será odiado pelos parasitas capitalistas que tenta fazer de todas as maneiras a cabeça dos subalternos que o certo é viver para o trabalho, assim, eles não se importam se o trabalhador irá ou não chegar a se aposentar em suas empresas. No Congresso já se discute a aposentadoria aos 70 anos. É a volta da escravidão!

É preciso sim discutir as aposentadorias milionárias de políticos, é preciso discutir as aposentadorias vitalícias dos generais que são transferidas para suas esposas após a morte, e ao invés de aumentar para 70 anos a aposentadoria dos trabalhadores, porque não reduz a desses marajás?

Se depender de senadores e deputados federais, não demorará muito e trabalharemos até a morte, já que aos 60 anos não agüenta mais nada quem pega no pesado. Na Lei dos sexagenários os senhores de escravos foram mais generosos que os nossos governantes atuais, já que aos 60 anos o negro que era escravo era libertado, apesar de não prestar mais pra nada devido ao desgaste físico provocado pelos castigos e cortes de cana ou trabalho nas minas. Estaremos em condições semelhantes em pleno século XXI, e ainda querem que comemoremos o Dia do Trabalho? Comemoremos então, brindemos meus amigos o Dia da Tortura. O dia do martírio e do sofrimento e com certeza as elites abastadas estarão sorrindo do outro lado. Os sindicatos promoveram grandes shows, mas o que comemoraram?

ODE AO DIA DO TRABALHO

Não devem comemorar esse dia os desempregados

Não devem comemorar esse dia os maltrapilhos

Não deve comemorar esse dia o agricultor

Nem o sem-terra nem o sem-teto têm razões para comemorar

Não devem comemorar esse dia os professores mal remunerados

Não devem comemorar esse dia os que trabalham noite e dia nos túneis

Os soterrados da Linha 4 vermelha ou amarela

Nem as famílias que choram, enquanto o governador apenas lamentou

Não há razões para comemorar os que ganham um salário mínimo

Não devem comemorar cortador de cana, a empregada doméstica nem o gari

Poderíamos até comemorar o Dia do Trabalhador, mas nunca o Dia do Trabalho

Trabalho é sofrimento, e mal remunerado é sacrifício e martírio

Trabalho é calvário para quem ganha pouco

Trabalho é exploração é apropriação indébita de alguém sobre outro alguém, que foi desapropriado ao nascer

Trabalho é espólio de patrão que com artimanha se apossa da única e legitima propriedade do trabalhador que é sua força de trabalho

Trabalho em condições indignas é escravidão

Enquanto o bóia-fria ingere sua comida azeda, o rico come caviar e dorme tranquilo

É por isso que o saudoso poeta e músico diz:

“Amou daquela vez como se fosse a última

Beijou sua mulher como se fosse a última

E cada filho seu como se fosse o único

E atravessou a rua com seu passo tímido

Subiu a construção como se fosse máquina

Ergueu no patamar quatro paredes sólidas

Tijolo com tijolo num desenho mágico

Seus olhos embotados de cimento e lágrima

Sentou pra descansar como se fosse sábado

Comeu feijão com arroz como se fosse um príncipe

Bebeu e soluçou como se fosse um náufrago

Dançou e gargalhou como se ouvisse música

E tropeçou no céu como se fosse um bêbado

E flutuou no ar como se fosse um pássaro

E se acabou no chão feito um pacote flácido

Agonizou no meio do passeio público

Morreu na contramão atrapalhando o tráfego

Amou daquela vez como se fosse o último

Beijou sua mulher como se fosse a única

E cada filho seu como se fosse o pródigo

E atravessou a rua com seu passo bêbado

Subiu a construção como se fosse sólido

Ergueu no patamar quatro paredes mágicas

Tijolo com tijolo num desenho lógico

Seus olhos embotados de cimento e tráfego

Sentou pra descansar como se fosse um príncipe

Comeu feijão com arroz como se fosse o máximo

Bebeu e soluçou como se fosse máquina

Dançou e gargalhou como se fosse o próximo

E tropeçou no céu como se ouvisse música

E flutuou no ar como se fosse sábado

E se acabou no chão feito um pacote tímido

Agonizou no meio do passeio náufrago

Morreu na contramão atrapalhando o público

Amou daquela vez como se fosse máquina

Beijou sua mulher como se fosse lógico

Ergueu no patamar quatro paredes flácidas

Sentou pra descansar como se fosse um pássaro

E flutuou no ar como se fosse um príncipe

E se acabou no chão feito um pacote bêbado

Morreu na contra-mão atrapalhando o sábado

Por esse pão pra comer, por esse chão prá dormir

A certidão pra nascer e a concessão pra sorrir

Por me deixar respirar, por me deixar existir,

Deus lhe pague

Pela cachaça de graça que a gente tem que engolir

Pela fumaça e a desgraça, que a gente tem que tossir

Pelos andaimes pingentes que a gente tem que cair,

Deus lhe pague...”

Não há mesmo o que comemorar!

Há sim, razões para odiar cada vez mais os patrões

Pois eles não ligam se morremos ou se vivemos

Tudo que eles precisam é de trabalhadores alienados

Como aquele que o poeta descreve: Operário em Construção...

“Era ele que erguia casas

Onde antes só havia chão.

Como um pássaro sem asas

Ele subia com as casas

Que lhe brotavam da mão.

Mas tudo desconhecia

De sua grande missão:

Não sabia, por exemplo

Que a casa de um homem é um templo

Um templo sem religião

Como tampouco sabia

Que a casa que ele fazia

Sendo a sua liberdade

Era a sua escravidão.

De fato, como podia

Um operário em construção

Compreender por que um tijolo

Valia mais do que um pão?

Tijolos ele empilhava

Com pá, cimento e esquadria

Quanto ao pão, ele o comia...

Mas fosse comer tijolo!

E assim o operário ia

Com suor e com cimento

Erguendo uma casa aqui

Adiante um apartamento

Além uma igreja, à frente

Um quartel e uma prisão:

Prisão de que sofreria

Não fosse, eventualmente

Um operário em construção.

Mas ele desconhecia

Esse fato extraordinário:

Que o operário faz a coisa

E a coisa faz o operário.”

É esse tipo de operário que as elites adoram

Esse tipo alienado que mal sabe que o patrão o considera menos valioso que um parafuso

Esse que valia mais, hoje, escravo da mais-valia.

O que esse pobre diabo foi comemorar nas ruas de São Paulo nesse 1º de Maio?

Porque foi dançar se já dança o ano inteiro o samba do criolo doido

Esse tipo operário, esse tipo trabalhador alienado que se encontra nas repartições públicas e privadas

Privado de suas necessidades mais prementes, o trabalhador vê o filho chorar a falta do pão e do leite

Enquanto os filhos do patrão passeiam no exterior, o pobre não dinheiro nem para a condução

Comemorar o Dia do Trabalho, ah, isso não!

O que devemos fazer é lutar, resistir, indignar

E se tiver manifestação, sair às ruas, parar toda a produção

Parar metrôs, os trens e todas as conduções

Fazer como o trabalhador que despertou na poesia, encheu-se de grandeza e partiu para a luta, com resignação...

“De forma que, certo dia

À mesa, ao cortar o pão

O operário foi tomado

De uma súbita emoção

Ao constatar assombrado

Que tudo naquela mesa

- Garrafa, prato, facão -

Era ele quem os fazia

Ele, um humilde operário,

Um operário em construção.”

Com certeza o operário que descreve é também esse de hoje em dia

Sem razões para comemorar, de repente descobre o seu valor

Descobre que ele é quem carrega nas costas a sua nação

Ele é quem produz o lucro, mas quem usufrui é o patrão

Não será mesmo essa, uma boa razão para a sua indignação?

Faça como o operário da poesia, olhe a sua volta

Observe os prédios, os arranha-céus, observe no cemitério a diferença entre os mausoléus

O mausoléu do rico tem coroas de fores, o do pobre uma cruz apodrecida

Observe o jardineiro, cedo cuida do jardim, mas a noite tem que tirar a água da chuva, pois ao regressar percebe que seu barraco alagou.

Enquanto o patrão dorme tranquilo, pobre não tem nem acomodação

Quando volta pra casa, descobre que a dispensa está vazia

Já que seu salário não acompanhou a inflação

Vê se hoje há motivos para comemoração?

Ainda mais que é o Dia do Trabalho, Deus me livre e guarde

Ninguém deve comemorar dia de oblação

E já que “quem é rico mora napraia

Quem é pobre não tem nem onde morar

Quem não chora dorme com fome

Mas quem tem nome joga a prata pro ar

Ô tempo duro...!”

Não há mesmo o que comemorar.

“Tá vendo aquele edifício moço?

Ajudei a levantar

Foi um tempo de aflição

Eram quatro condução

Duas pra ir, duas pra voltar

Hoje depois dele pronto

Olho pra cima e fico tonto

Mas me chega um cidadão

E me diz desconfiado, tu tá aí admirado

Ou tá querendo roubar?

Meu domingo tá perdido

Vou pra casa entristecido

Dá vontade de beber

E pra aumentar o meu tédio

Eu nem posso olhar pro prédio

Que eu ajudei a fazer”

Há sim, motivos mil pra se indignar

Fazer como “Operário em Construção”, despertar do sono da alienação e num estalo descobrir...

“Que tudo naquela mesa

- Garrafa, prato, facão -

Era ele quem os fazia

Ele, um humilde operário,

Um operário em construção.”

“Mas é preciso ter garra, é preciso ter raça, é preciso ter gana sempre” e enxergar além

Faça como o Operário....

Olhou em torno: gamela

Banco, enxerga, caldeirão

Vidro, parede, janela

Casa, cidade, nação!

Tudo, tudo o que existia

Era ele quem o fazia

Ele, um humilde operário

Um operário que sabia

Exercer a profissão.

Ah, homens de pensamento

Não sabereis nunca o quanto

Aquele humilde operário

Soube naquele momento!

Naquela casa vazia

Que ele mesmo levantara

Um mundo novo nascia

De que sequer suspeitava.

O operário emocionado

Olhou sua própria mão

Sua rude mão de operário

De operário em construção

E olhando bem para ela

Teve um segundo a impressão

De que não havia no mundo

Coisa que fosse mais bela.

Foi dentro da compreensão

Desse instante solitário

Que, tal sua construção

Cresceu também o operário.

Cresceu em alto e profundo

Em largo e no coração

E como tudo que cresce

Ele não cresceu em vão

Pois além do que sabia

- Exercer a profissão -

O operário adquiriu

Uma nova dimensão:

A dimensão da poesia.

E um fato novo se viu

Que a todos admirava:

O que o operário dizia

Outro operário escutava.

E foi assim que o operário

Do edifício em construção

Que sempre dizia sim

Começou a dizer não.

E aprendeu a notar coisas

A que não dava atenção:

Notou que sua marmita

Era o prato do patrão

Que sua cerveja preta

Era o uísque do patrão

Que seu macacão de zuarte

Era o terno do patrão

Que o casebre onde morava

Era a mansão do patrão

Que seus dois pés andarilhos

Eram as rodas do patrão

Que a dureza do seu dia

Era a noite do patrão

Que sua imensa fadiga

Era amiga do patrão.

E o operário disse: Não!

E o operário fez-se forte

Na sua resolução.

Como era de se esperar

As bocas da delação

Começaram a dizer coisas

Aos ouvidos do patrão.

Mas o patrão não queria

Nenhuma preocupação

- "Convençam-no" do contrário -

Disse ele sobre o operário

E ao dizer isso sorria.

Dia seguinte, o operário

Ao sair da construção

Viu-se súbito cercado

Dos homens da delação

E sofreu, por destinado

Sua primeira agressão.

Teve seu rosto cuspido

Teve seu braço quebrado

Mas quando foi perguntado

O operário disse: Não!

Em vão sofrera o operário

Sua primeira agressão

Muitas outras se seguiram

Muitas outras seguirão.

Porém, por imprescindível

Ao edifício em construção

Seu trabalho prosseguia

E todo o seu sofrimento

Misturava-se ao cimento

Da construção que crescia.

Sentindo que a violência

Não dobraria o operário

Um dia tentou o patrão

Dobrá-lo de modo vário.

De sorte que o foi levando

Ao alto da construção

E num momento de tempo

Mostrou-lhe toda a região

E apontando-a ao operário

Fez-lhe esta declaração:

- Dar-te-ei todo esse poder

E a sua satisfação

Porque a mim me foi entregue

E dou-o a quem bem quiser.

Dou-te tempo de lazer

Dou-te tempo de mulher.

Portanto, tudo o que vês

Será teu se me adorares

E, ainda mais, se abandonares

O que te faz dizer não.

Disse, e fitou o operário

Que olhava e que refletia

Mas o que via o operário

O patrão nunca veria.

O operário via as casas

E dentro das estruturas

Via coisas, objetos

Produtos, manufaturas.

Via tudo o que fazia

O lucro do seu patrão

E em cada coisa que via

Misteriosamente havia

A marca de sua mão.

E o operário disse: Não!

- Loucura! - gritou o patrão

Não vês o que te dou eu?

- Mentira! - disse o operário

Não podes dar-me o que é meu.

E um grande silêncio fez-se

Dentro do seu coração

Um silêncio de martírios

Um silêncio de prisão.

Um silêncio povoado

De pedidos de perdão

Um silêncio apavorado

Com o medo em solidão.

Um silêncio de torturas

E gritos de maldição

Um silêncio de fraturas

A se arrastarem no chão.

E o operário ouviu a voz

De todos os seus irmãos

Os seus irmãos que morreram

Por outros que viverão.

Uma esperança sincera

Cresceu no seu coração

E dentro da tarde mansa

Agigantou-se a razão

De um homem pobre e esquecido

Razão porém que fizera

Em operário construído

O operário em construção.”

Pena que o Operário apanhou, foi traído pelos seus próprios colegas e entregue ao patrão, mas uma linda lição nos deixou, ele um humilde Operário, um Operário em Construção. Ele descobriu o seu valor, a sua essência roubada e tornou-se um ativista revolucionário contra a exploração.

Com certeza, para esse operário, o 1º de Maio não é o Dia do Trabalho, mas o Dia do Trabalhador.

Mesmo que se insista nessa distorcida concepção, não devemos dar o braço a torcer, devemos resistir e não aceitar nem comemorar esse dia da tortura, mas aproveitar o 1º de Maio, para fazermos juntos que esse seja o dia da nossa libertação, nem que seja apenas na consciência de cada um, porém é nela que tudo começa, para depois fazermos uma Revolução.

Viva o Dia do Trabalhador!

Abaixo a alienação!

REFERÊNCIA

CARMO, Paulo Sérgio do- Ideologia do Trabalho. 5ª edição, SP. Editora Moderna.

MORAIS, Vinícius de- in Operário Em Construção.

Buarque, Chico- in Construção.