Por aqueles que da Lei da Morte se foram Libertando...


A 25 de Novembro de 1975 desenrolou-se em Lisboa um dos episódios Militares mais importantes para a Restauração das Liberdades Democráticas que o POVO tanto aclamava e reclamava  desde o dia 25 de Abril do ano anterior.
Hoje vos trago aqui estes depoimentos que me foram passados pelo Nobre Amigo Coronel Manuel Bernardo. Historiador Militar da História contemporânea do nosso País, com várias Obras Editadas e considero este texto-depoimento em forma de Relatório cuja transcrição faço na íntegra, para que os Vindouros saibam algumas verdades que vão se perdendo na poeira do tempo.
Nós, aqueles que tivémos a Honra e a Glória de ter vivenciado de perto a maioria destes acontecimentos, deixamos esta homenagem e rogamos a Deus para que os receba na Sua Santa Paz Eterna!

INÍCIO DE CITAÇÃO;     
 Relatório do 25 de Novembro de 1975 (1)
Durante o período de 25 a 26 de Novembro de 1975, depois de conhecida a condição de insurreição armada, com sedição de algumas unidades do Exército e da Força Aérea e sob as ordens do Comando Operacional, instalado pelas autoridades legítimas no Regimento de Comandos, na Amadora, este recebeu missões operacionais com a finalidade de repor a legalidade.
 
1. Missão
a. Em 25 de Novembro
(1) 17H00
- Cercar o quartel do GDACI (Grupo de Detecção e Alerta), em
 
Monsanto;
- Aprisionar todos os elementos lá existentes;
- Capturar todo o material;
- Aniquilar, se necessário, qualquer resistência;
- Apoderar-se, manter a segurança e desligar a antena da RTP, em Monsanto;
 
(2) 23H00 (após decretado, pelo Presidente da República, o recolher obrigatório em
toda a área da Região Militar de Lisboa):
- Dispersar a população concentrada frente ao Palácio de Belém.
 
b. Em 26 de Novembro
(1) 05H00
- Cercar o quartel da PM (Polícia Militar), na Ajuda;
- Desmotivar todo o pessoal lá existente e capturar ou abater qualquer elemento que oferecesse resistência;
- Prender o Cmdt, 2.º Cmdt e outros responsáveis pela sublevação do Regimento se, até às 8H00, não houvesse desistência da insurreição pelos mesmos;
- Manter a segurança do quartel, depois de ocupado;
- Entregar o comando e a administração da unidade ao pessoal da Polícia Militar, que tinha abandonado a unidade antes da sublevação, e acompanhava a nossa força.
2. Composição e articulação das forças
- Cmdt – Cor. Grad. Inf.ª “Cmd” n.º 50575411, Jaime Alberto Gonçalves
das Neves.
- C. Cmds 112 – Cap. Inf.ª “Cmd” n.º 62721965, António José Afonso
Lourenço.
- C. Cmds 113 – Cap. Art.ª “Cmd” n.º 13908469, Manuel António
Apolinário.
- C. Cmds 121 – Cap. Mil.º Inf.ª “Cmd” n.º 07249364, José Manuel
Sousa Gonçalves.
- C. Cmds 122 – Cap. Mil.º Inf.ª “Cmd” n.º 05789865, Manuel Jorge
Sampaio de Faria.
3. Descrição das Acções
Todas as acções com vista ao cumprimento das missões cometidas ao R.Cmds foram directamente comandadas pelo Comandante, Coronel “Cmd” Jaime Neves.
a. Para ocumprimento da 1.ª missão, em 25 de Novembro, as C.Cmds 121 e 122, reforçadas com um pelotão de Art.ª Anti-Aérea (-) do CIAAC, constituindo um Agrupamento de Comandos, sob o comando do Cmdt do Regimento, deslocaram-se, em 251800NOV75, pela estrada Sintra-Lisboa-Auto-estrada-rotunda de Monsanto. Nesta rotunda estava uma viatura chaimite das forças sublevadas, cuja tripulação, à aproximação das nossas tropas, debandou, abandonando a viatura.
O quartel do GDACI e o Comando da 1.ª Região Aérea foram cercados pelas duas estradas de acesso existentes na zona, e que os circundavam. O quartel da Marinha, existente na área, foi avisado da nossa acção. Pelo Cmdt das forças do Regimento foram dadas instruções aos elementos sublevados de que estavam cercados, tinham um quarto de hora para se entregarem e os “Comandos” estavam dispostos a terminar com a sua insurreição. Foi então verificada a fuga de militares com uniforme camuflado, usado pelos pára-quedistas. Ao expirar o período de 15 minutos, o Cmdt do GDACI pediu mais dez minutos, que lhe foram concedidos. Após este prazo e face à desistência da insurreição pelos elementos no GDACI, mandou-se formar todo o pessoal que lá se encontrava. As armas, carregadores e munições foram recuperados e transportados em duas viaturas. O pessoal, depois de ter recebido dois cobertores/homem, foi recolhido ao refeitório.
Foram detidos os principais responsáveis pela insurreição, entre os quais dois civis. Foi desligada a antena da RTP. O pessoal pára-quedista foi entregue ao Coronel Pára-quedista Marques da Costa, ficando sob o seu comando.
A seguir, os “Comandos” instalaram-se em todo o perímetro do quartel, com uma segurança na rotunda e no posto da Rádio Naval, a 200 metros da citada rotunda.
No início da acção, cerca de uma centena de populares pretendeu concentrar-se junto ao quartel sublevado, mas foram rapidamente dispersados por duas equipas de “Comandos”.
Pelas 5H00, depois de rendidos por uma companhia de atiradores, as forças regressaram a quartéis.
b. Para o cumprimento da 2.ª missão, foi nomeada a C.Cmds 113 que, em 260100NOV75, dispersou uma concentração de populares que se encontrava no largo fronteiro ao Palácio de Belém.
c. O cumprimento da 3.ª missão foi atribuído às C. Cmds 112 e 113, constituindo um Agrupamento de Comandos do Cmdt do Regimento.
A força articulou-se em três colunas no cruzamento de Monsanto: a C.Cmds 112 dirigiu-se para o Regimento de Polícia Militar, pelo lado superior da Calçada da Ajuda; a C.Cmds 113, pela Rua do Museu da Agricultura e a 3.ª coluna, comandada pelo Cmdt do Regimento, pela frente do Regimento da PM, aproximando-se pela parte inferior da Calçada da Ajuda.
Pelas 08H07, quando as colunas se aproximavam das suas posições, a partir do Regimento de Polícia Militar e do antigo quaterl de Cavalaria 7, as forças sublevadas abriram fogo, ao qual as forças “Comando” ripostaram, preparando o assalto. As forças “Comando”, depois de atingirem as posições de cerco, suspenderam o fogo,  cercando os quartéis ocupados. Esta acção demorou cerca de vinte minutos e no decorrer dela, foram mortalmente atingidos primeiro, o Furriel Mil.º “Cmd” Pires, da C.Cmds 113 e depois, o Tenente Inf.ª “Cmd” Coimbra, da C.Cmds 112. Arrombou-se, então, o portão de armas do quartel da PM com uma chaimite e exigiu-se a apresentação do Cmdt, do 2.º Cmdt e Adj. do Cmd. Só então do quartel da PM, foi suspenso o fogo. Depois de reunidos os responsáveis pela sublevação, já citados, foram presos e conduzidos sob escolta ao Palácio de Belém (PR). O pessoal PM foi formado na parada do quartel e entregue o seu comando aos militares PM que, para o efeito, tinham acompanhado as forças “Comando”. O material foi recolhido em arrecadações.
Pelas 14H30, as forças “Comando” foram rendidas por forças do R.I.Q.
e recolheram a quartéis.
4. Conclusões e ensinamentos
a. 1.ª Missão (GDACI)
Foram importantes para os resultados obtidos a determinação e decisão que animava todos os efectivos, aliada ao aparato militar que se conseguiu mostrar às forças insurrectas e ainda as palavras que lhe foram dirigidas com megafone, que esclareceram intenções e evitaram mal entendidos, ajudando a desmobilizar as pretensões dos sublevados.
b. 2.ª Missão
A neutralização e dispersão da concentração de pessoas no largo fronteiro ao Palácio de Belém foi conseguida sem uso de violência.
c. 3.ª Missão
Não foi possível o diálogo, pois os insurrectos abriram fogo antes que os “Comandos” tivessem montado o dispositivo de cerco.
De salientar a brilhante acção de comando do Coronel Jaime Neves que, embora com baixas nas tropas “Comando”, conseguiu limitar ao mínimo o derramamento de sangue das forças insurrectas, expondo-se frontalmente e com grave risco da sua própria vida, conseguindo cumprir a missão com o emprego da força minimamente indispensável, demonstrando excepcional bravura, coragem e sangue-frio debaixo de fogo, excepcionais qualidades de Valor Militar e capacidade de comando de homens em combate, prestigiando aos olhos do mundo, os “Comandos”, o Exército e Portugal.
De salientar ainda:
(1) A excepcional disciplina de fogo e o alto grau de eficiência das tropas “Comando” empenhadas, que cumpriram todas as missões que lhes foram atribuídas, com o estrito uso da força necessária.
(2) A acção do Ten. Inf.ª “Cmd” José Coimbra que, quando comandava, debaixo de fogo, o seu Grupo de Combate, na acção de envolvimento pela retaguarda, do quartel do R.P.M. e ao verificar que o militar que seguia à sua frente fora ferido, e com total desprezo pela vida e rara abnegação, audácia e coragem, deslocou-se à frente, debaixo de fogo, para socorrer o militar e apoiar a sua retirada da zona de morte, sendo mortalmente atingido.
(3) A acção do Fur. Mil.º “Cmd” Joaquim Pires, integrado no 1.º Grupo de Combate, salientando-se pelo cumprimento imediato e altamente disciplinado das ordens que lhe iam sendo transmitidas. Ainda debaixo de intenso fogo, conseguiu deslocar a sua equipa para o local que lhe fora atribuído, atravessando a Calçada da Ajuda, instalando devidamente os seus homens e dando sempre exemplo de bravura, sangue frio e determinação. O Furriel Pires, com a sua atitude corajosa e audaciosa, galvanizou todo o pessoal e com a acção da sua equipa possibilitou a manobra imediata da sua companhia, decisiva para a neutralização dos elementos sublevados, sendo mortalmente atingido aquando desta acção.
(4) A Associação de Comandos, pelo apoio que prestou ao Regimento de Comandos, nas acções excecutadas.
 
Nota:
(1) Relatório conjunto elaborado posteriormente no Reg. Cmds. Os relatórios das companhias não foram encontrados nos arquivos.
FIM DE CITAÇÃO

 
Silvino Potêncio
Enviado por Silvino Potêncio em 25/11/2016
Reeditado em 25/11/2016
Código do texto: T5833953
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