Aos meus mestres, com carinho! Parte 1

Sempre fui o que se pode chamar de aluna "cdf" e apesar do termo ser depreciativo, jamais me incomodou, ao contrário, devotei-lhe sempre mais e mais horas de estudo e dedicação. Tive as melhores notas durante todo o fundamental até o ensino médio, quando a coisa se complicou.

Comecei a me questionar sobre tudo incluindo eu mesma e achei meu excesso uma forma de defesa para tudo que me incomodava e não queria pensar. Meu papel de boa aluna passou a ser teatro e como me reservava o direito de ser tímida, conclui que representar não seria uma solução. Não era mais possível ser “boa em tudo”, até porque “tudo” não era motivo do meu interesse. Passei a me concentrar em Humanas.

Realmente, debater, pensar e contestar era verdadeiramente o que me incentivava a folhear os livros e querer descobrir mais e mais. Meus professores eram mestres queridos e muito mais leitores e cultos que eu e isso nos dava muita segurança e vontade de imitá-los. Nunca tive a pretensão de confrontar, combater, não, queria sugar-lhes até o último suspiro e nossa convivência era misto de admiração e cumplicidade.

Meus pais me educaram de forma que tive acesso muito cedo ao estudo de idiomas. Aos quatorze anos dominava o inglês e o francês fluentemente, lendo todos os clássicos no original. O interessante de tudo isso é que sempre me imaginei professora universitária de francês ou literatura, meu sonho mais dourado. E nunca fui estimulada pelos meus mestres que aspiravam “vôos mais promissores” para mim. O fato é que à época da inscrição para o vestibular estava mais animada em fazer intercâmbio do que colocar a cruzinha indicando a opção de curso.

Sabe o quê mais? Nunca havia durante todos aqueles anos pensado que deixaria de fazer o que mandavam e passaria a agir por minha cabeça. Essa obrigatoriedade me fez entrar em pânico. Não estava acostumada a querer. Só havia aprendido a obedecer e cumprir regras. Era tão cruel ter que decidir toda a minha vida quando para visitar a minha melhor amiga, ouvia: “Pra quê, se você vai vê-la amanhã na escola?” Eu nunca havia tomado ônibus sozinha, como poderia eu dirigir minha própria vida? Construir uma carreira?

Por outro lado, havia uma parte de mim que se sentia presa, refém do conforto. Crescia também a vontade de alçar outros vôos. Sem dúvida eu sabia muito mais que as adolescentes da minha faixa etária, mas também havia vivido muito menos que todas.

Continua...

Arsenia Rodrigues
Enviado por Arsenia Rodrigues em 20/10/2007
Reeditado em 30/06/2008
Código do texto: T702739
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