CELSO MARQUES PENTEADO SERRA - IN MEMORIAM

 

Hoje, nove anos após sua morte, resolvi apanhar na gaveta aquele maço de cartas que meu falecido marido me enviou quando ainda éramos namorados. Peguei, ao acaso, a segunda daquele maço e li. Pincei algumas frases incomuns para uma carta romântica. Ele escreveu: “O Universo desperta em mim um fascínio indescritível, do qual jamais conseguirei fugir. Há anos atrás quando me preparava para o vestibular, esbarrei pela primeira vez na Teoria da Relatividade. É claro que nada entendi, nem lhe pude dedicar mais tempo, os exames estavam próximos e ela não fazia parte da matéria. Foi, posteriormente, que comecei a me envolver seriamente com a Teoria. Não havia como compreendê-la em um plano meramente qualitativo, e eu não dispunha das bases para nela me aprofundar quantitativamente. Não desanimei e tratei de adquirir essas bases. Exerci um grande esforço em um campo totalmente extracurricular, pois nada daquilo interessava diretamente ao curso que então iniciava. Esbarrei em obstáculos, aparentemente intransponíveis. Não me restou senão atacá-los, um por um, em trabalho tedioso e estafante.”

 

Celso fazia o curso da Academia Militar de Agulhas Negras, onde graduou-se com destaque e saiu como tenente. Foi trabalhar no Quartel de Jundiai, onde ministrou instrução e treinamento aos recrutas recém engajados na tropa. Após algum tempo decidiu fazer o Curso de Engenharia do IME (Instituto Militar de Engenharia) no Rio de Janeiro. Graduou-se na Área de Telecomunicações, com distinção. Mudou-se para São Paulo, onde trabalhou no Serviço Rádio da Região Militar por alguns anos, passando depois para a reserva, indo para a iniciativa privada, sempre exercendo cargos na área de telecomunicações.

 

Quando deixou o Exército, seu superior escreveu em seu livro de anotações: “Foi sempre um oficial exemplar. Lamento que a Força esteja perdendo um cientista que muito poderia contribuir para o engrandecimento de seus quadros.” Ele deixou a carreira militar com a patente de Tenente Coronel.

 

Eu que convivi com ele por trinta felizes anos, como companheira, bem sei de seu valor. Mesmo depois da aposentadoria, após os 65 anos, dedicava muitas horas de seu dia à pesquisa e ao aprimoramento de seus conhecimentos. Foi um pioneiro no uso do computador, quando poucos havia em nosso país. Aprofundou-se no estudo da matemática e da física. Era entusiasta da Astronomia. Mesmo idoso, permaneceu jovem de espírito, um homem adiante do seu tempo. Brilhante, culto, bem-humorado, foi uma companhia formidável e com ele adquiri muito conhecimento.

 

Falava muito bem o inglês e não saía-se mal no Alemão e no Russo que aprendeu por conta própria. Conhecia muito de arte e dedicava-se à pintura em aquarela. Amava a música clássica, embora não tocasse nenhum instrumento. Ganhou o prêmio Jabuti de Tecnologia em 1984 com o livro “Teoria e Projeto de Filtros” na área de telecomunicações.

 

Sou suspeita por falar tão bem dele, porém a convivência me fez admirá-lo, além do amor que por ele sentia. Teria muito mais a dizer sobre sua personalidade, pois compartilhamos o mesmo teto por trinta anos, entretanto não quero me alongar. O que registrei aqui é o bastante para mostrar sua genialidade e a generosidade de sua maneira de ser. São reminiscências que o tempo não apaga e a saudade não deixa esquecer.

 

Depois de tantos anos já consigo ler suas cartas sem chorar.

 

 

Aloysia
Enviado por Aloysia em 15/09/2022
Reeditado em 10/02/2023
Código do texto: T7606650
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