A PREMÊRA VÊIZ DO PROFETA...- Causo Matuto Verídico

Esquecer é uma necessidade, lembra Machado de Assis. Mas, existem fatos, datas, coisas e/ou pessoas que jamais devem ser esquecidos, como diz o poeta Diógenes da Cunha Lima, sob pena de se perder algo de muito valioso. É o causo do Profeta, um ex-empregado de meu pai, lá na Fazenda Pocinhos, em Cabaceiras-PB, que quero excluir do adágio do mestre Machado de Assis. Jamais soube seu nome de batismo, pois para mim era o que menos importava. O mais importante e valioso nêsse indivíduo, além de sua disposição para o trabalho e sua lealdade, era que mesmo trabalhando, de três gestos seus, quatro eram fuleragens; molecagens leves, livres, soltas e cristalinas como as águas de uma vertente. Sua figura “desingonçada” por causa de uma queda que levou ainda no tempo de criança, de carro de boi, já chamava atenção. E quando o peste estava “encangando grilo ou enfiando bufa em cordão” e começava a “cunversá miôlo de quartinha” era um Deus nos acuda... Certa feita, lá no armazém onde os “cassáco” dormiam, passou-se com Profeta o fato que êle me contou quando tomávamos o café da manhã “e papai já tinha se levantado da mesa”:

- Mais Bob, assanoite o peste do Careca, subríin de Antôin Mingau, se acordô agarrado na “correia”, mandando eu pegá no “tróço” qui êle me dava dois conto...

- E tu pegasse, Profeta ?

- Vôte; Nossa Sinhora me defenda!...

- E se êle tivesse te oferecido em vêz de dois, cem conto, tu topava pegá?

- Taí Bob, era bem capaiz d’eu tê me lascado; mode qui cem conto dava prá eu comprá um terreno...

Era assim, a ingenuidade daquele homem rude, nascido no meio do mato, onde como dizia o poeta na música "Riacho do Navio" se nascia, vivia e morria "SEM RÁDIO E SEM NUTIÇA DAIS TERRA CIVILIZADA"...

Êle mesmo me contou que foi se confessar para fazer a primeira comunhão, ainda rapazinho, quando morava lá p’rás bandas de Barra de Santa Rosa, no brejo paraibano. Já dizia mestre Zé Cavalcante, saudoso escritor paraibano, ex-prefeito da cidade de Patos-PB, de quem fui aluno e sou fiel discípulo, de quem não canso de falar, que Deus, fez o Céu bem longe da terra, para ficar a salvo de muitas almas de indivíduos gerados, nascidos e criados por dentro da fuleragem e a fuleragem por dentro deles...E mesmo assim às vezes não consegue ficar a salvo desses “troço”. Assim era o pároco com o qual o Profeta foi se confessar; que vivia no meio da meninada de sua paróquia, sorrindo com êles e êles com êle. E no cofessionário, o Profeta se ajoelhou muito contrito e solene, enquanto o padre, tentando manter a seriedade que estava muito longe de possuir, lhe encorajava a contar seus pecados “imensamente cabeludos”:

- Diga, meu filho; pode contar tudo!

- Tudo mermo seu pade ? Tem umas coisa qui num dá mode eu contá p’ro sinhô não!

- Pois vamos fazer o seguinte; conte o pecado mais cabeludo que você acha que cometeu. Eu lhe perdoando dele, estou lhe perdoando dos outros; tá bom assim ?

- Tá!

- Pois diga logo o que foi e como foi, que eu já estou é curioso...

- Foi...foi...foi...foi no buraco da venta!

- Buraco da venta de quem, meu filho ? Me diga pelo amor de Deus!

- De uma vaca!

- Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah!!!...

A gaitada do padre foi daquela “de estralo”, prá lá de escandalosa, a ponto de espantar os outros fiéis, no que foi advertido pelo próprio Profeta:

- Tá vendo ? O sinhô mandô eu dizê só mode mangá d’eu!

- Não, meu filho; longe de mim, querer mangar de você. Eu estou pensando é no espirro que ela deu:Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah-Ah!!!.

Bob Motta
Enviado por Bob Motta em 05/10/2008
Código do texto: T1212501
Copyright © 2008. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.