O Jesus que não perdoava



     Aconteceu numa cidadezinha do interior maranhense. O vigário da paróquia resolveu encenar uma peça teatral sobre a Paixão de Cristo. Arranjou local, escalou atores, atrizes, figurantes, o escambau. O ator escolhido para o papel de Jesus Cristo era Josias, um cabra magrelo, mas mais zangado do que um siri na lata. Aqui entre nós: nunca ficou devidamente comprovado se Jesus Cristo era gordo ou magro, então, por que só escolhem atores magrelos para desempenharem o papel do Homem?
     Bom, deixemos isso pra lá. O certo é que Josias, com muita seriedade e devoção, preparou-se para representar dignamente o seu papel. O problema é que, por motivos óbvios, ninguém queria fazer os papéis dos soldados romanos que no dia do Calvário espancaram Jesus, e já no desespero, apenas na quarta-feira da Semana Santa o vigário conseguiu convencer três rapazes a aceitarem esses papéis. Por triste coincidência, entretanto, todos os três tinham uma rixa antiga com Josias, fato de que o vigário jamais tomara conhecimento.
     E então, com toda a pompa, levou-se a efeito na principal praça da cidade, a Paixão de Cristo. Foi com um certo susto que Josias - o Jesus Cristo - viu que os três soldados que o prendiam eram três rancorosos desafetos seus, mas, como o bom cabrito não berra, ficou na sua. Contudo, mais lá na frente, sentiu que os soldados o agarravam, o empurravam, e lhe batiam pra valer mesmo. Aquelas chicotadas nem o próprio Jesus suportaria e Josias só não deu berros de dor porque nunca ouvira falar que Jesus tivesse amarelado nessa hora!
     Para sorte de Josias, acabou o ato e o pano desceu. Um novo ato só começaria 10 minutos depois, mas o contrarregra era desastrado e subiu o pano antes do tempo.
     E o que se viu, ninguém jamais verá: Jesus Cristo estava armando o maior barraco nos bastidores do palco! Furioso, mandando os mais cabeludos palavrões, estava caindo de porrada e pontapés nos soldados romanos, depois de quebrar duas cadeiras nas costas deles!
Santiago Cabral
Enviado por Santiago Cabral em 13/04/2009
Reeditado em 14/04/2009
Código do texto: T1537141
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