A Franjinha!

Na tenra idade, eu com meus oito anos era igual qualquer garota da minha idade: frequentava a escola, brincava muito e me divertia a beça.

Mas uma diferença existia entre eu e as outras meninas: eu não brincava de boneca e nem de casinha. Eu gostava mesmo era brincar de carrinho de rolimã, bolinha de gude, bater bafo e claro disputar lutinhas.

Eu não tinha preocupações com o amanhã, nem responsabilidades ou contas. Bom, com as contas em me preocupava sim. Para minha infelicidade as contas já estavam inseridas na minha vida, elas viviam aparecendo nas aulas de matemática e principalmente nos dias de prova.

O lado bom da minha infância, quando não estava no colégio, era que podia me vestia como quisesse, sem esquentar a cabeça com a moda atual ou padrões impostos pela sociedade e pelos comerciais da televisão com famosos modelos ou artistas. Eu não estava nem ai!

Eu era a design da minha humilde e pequena coleção de peças vestuais, e desfilava cada dia como bem quisesse. Vestia saia com tênis, blusa florida com calça florida e ficava tipo uma floresta em pé, blusa xadrez com calça social e sandália.

Falavam alguma coisa? Claro!!! Sempre e toda hora. Naquela época nenhuma criança se importava com que se vestia ou como se vestia e muito menos com opinião dos outros.

Se eu me vestia conforme meu gosto natural, imagine você caro leitor, como é que eu fazia para manter o cabelo arrumado. Escova progressiva era um luxo do qual eu não dispunha, e naquele tempo não era hábito a criança ter entre seus brinquedos a milagrosa chapinha.

Meu cabelo era quase ruivo. As mechas indomáveis que nem um leão com fome. Os fios ligeiramente espetados, igual umas almofadinhas que nossas avós usavam para guardar as agulhas de costura. Fios rebeldes que nem nossos jovens de hoje, cada um para um lado, contrariando a natureza sem saber para onde vão.

Como amansar a fera? O jeito era se virar e usar o gel de cabelo do meu irmão mais velho. Ah, isso eu podia!

O gel bozzano fixação máxima azul dele diminuía a cada dia. Um pouquinho por vez, para ele não notar. Mas parecia que aquele pote de gel nunca ia ter fim, parece que ao invés de acabar ele aumentava. Mesmo “emprestando” um tiquinho todos os dias, aquele pote de gel durou uns bons anos.

Eu não podia dar um desfalque grande no gel do meu irmão, ele fazia um escarcéu quando pegava alguém mexendo nas coisas dele. Eu não poderia dar bandeira, e decidi usar somente um tiquinho de gel a cada dia. E tinha que fazer valer a pena este pequeno furto, e como escolher naquela juba enorme e incontrolável qual parte mais necessitada?

Eu fazia milagre com aquele tiquinho de gel. Primeiro eu penteava o cabelo, digo, tentava pentear, ou nem tentava. Pegava o tiquinho de gel, espalhava bem na mão e então deslizava aquela meleca toda na única área do cabelo que a quantidade de gel dava, a franja! E olha que não era uma franjinha que vai somente até a testa não, era uma franjona.

A franjona era bem comprida e como se não bastasse eu modelava com a escova para ficar um topete, quase um obelisco. Hoje o penteado estaria classificado como estilo retrô numa referência as divas do cinema anos 60, só que sem aquele glamour todo. Não, acho que não, acho que o topete era mais estilo o rei do rock, Elvis Presley. Ou melhor, um punk mesmo.

A franjinha quase ruiva ficava intocável naquele topete. Poderia dar o maior vendaval, aquela franjinha em formato de topete afunilando em direção as nuvens, firme e imóvel, e o restante do cabelo ao sabor do vento fazendo jus a palavra juba.

Eu virei quase uma “Jassa” do mundo hair. Uma habilidade extraordinária na arte capilar. Meu cabelo era um arraso só. Na minha modesta opinião. E também era a alegria das minhas irmãs, colegas de sala e de quem quisesse tirar uma casquinha comigo. Na época não ligava. Mas se fosse hoje? Aí o barraco estava armado e é melhor não entrar nos detalhes.

Hoje a franjinha já não existe mais, mas de vez em quando os fios rebeldes são controlados pelo poderoso poder do gel bozzano azul fixação média, não mais do meu irmão, agora, do meu marido.

Rosana Dias do Nascimento Czornei
Enviado por Rosana Dias do Nascimento Czornei em 14/04/2015
Reeditado em 29/04/2015
Código do texto: T5206907
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2015. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.