A SEITA DA GRÃ ORDEM DA LAMPARINA SAGRADA - PARTE X

A SEITA DA GRÃ ORDEM DA LAMPARINA SAGRADA

PARTE X

O universo possui um centro. A teoria do universo inflacionário argumenta que estamos dentro de uma bolha em constante expansão. O tempo, o espaço, a matéria como a conhecemos, tudo existe apenas dentro desta bolha. E esta bolha, como qualquer outra forma, possui um centro geométrico.

Os cientistas acreditam que, dependendo da quantidade de matéria presente no momento inicial do Big Bang, esta bolha vai se expandir de forma continua até o infinito, ou vai chegar a um limite máximo de expansão, de onde, a gravidade forçará á um retorno ao ponto de origem. É o que os estudiosos chamam de Big Crunch.

De qualquer forma tem que existir um centro.

E o umbigo do quarto personagem desta serie, se localizava bem no centro geométrico do universo. Pelo menos era nisto que ele acreditava...

No Apocalipse dos metafísicos, ou no Big Crunch dos teóricos, o universo se extingue pela sua própria força. O fim sempre é um fator inerente da matéria. Para uns são as vilanias do homem, e para outros, é o fim de um ciclo, como em qualquer processo natural. Mas o que importa é que no momento em que entrasse em cena os acontecimentos do apocalipse, e as bestas começassem a soar suas trombetas, ou o universo começasse a se dobrar sobre seu próprio peso, o ultimo ponto a ser esmagado pela força do colapso gravitacional seria o seu centro absoluto e geométrico.

Ramis Seomis – o mais megalomaníaco ser orgânico constituído de carbono, dotado de nome esquisito que jamais existiu em todo o universo conhecido, e que casualmente é o derradeiro personagem desta serie – acreditava que este ponto lendário, previsto tanto nas teorias cientificas quanto nos delírios místicos, era um ponto móvel. Mobilidade só limitada pela sua vontade.

Ramis Seomis era um homem livre, de espírito indômito. As fronteiras internacionais, as forças de coerção do estado constituído, os dogmas das instituições religiosas, e qualquer outra norma de rigidez moral, não eram poderosas o suficiente para frear sua ânsia de liberdade. Era um mochileiro por natureza. E sendo assim, gostava de movimento. Seu maior prazer, era uma distancia mínima de cem kilometros entre o nascer do sol de um dia e o alvorecer do próximo.

Ramis Seomis levava sempre o seu umbigo pra onde quer que fosse, e neste movimento, arrastava junto, o centro geométrico do universo.

Alic Sirp considerava Ramis um demente com mania de grandeza. Esta estória de que o seu umbigo era o centro do universo, não fazia muito sentido pra ela. Mesmo porque não entendia direito estes papinhos de Big Bang, Big Crunch e Universo Inflacionário. Mas acima de tudo era uma pessoa crédula e ingênua, e quando ouviu falar que o ultimo ponto a ser esmagado, segundo a tal da teoria, seria o tal do centro do universo, e que este vinha acoplado ao umbigo do Ramis Seomis, resolveu ficar nas imediações por uma questão de segurança.

Casaram-se.

Entraram na igreja ao som de “Children of The Sea” do Black Sabbath. Não foi um casamento convencional. Ramis Seomis subiu ao altar vestido com a indumentária dos “Abutres do Asfalto”, pilotando uma Harley “depenada”. O padre, com o cabelo na altura dos ombros e um óculos redondinho que fazia lembrar o John Lennon, perguntou:

___Aí, a mina tá paradona na sua. Vai rolar de juntar os panos?

___Pode crê! Respondeu Ramis Seomis, soltando uma baforada de canabis sativa, e tentando fazer uma expressão inteligente e decidida. Tendo como resultado do esforço, apenas ter conseguido dizer:

___ Nó, bicho! Tou muito louco!

___ E você mina? - Continuou o padre, balançando o corpo pra lá e pra cá, como se estivesse cantando “Given For Peace” – Rola de cair pra dentro da caxanga do maluco?

___ Sóó...Mas aí, tem um elefante vermelho, rindo pra mim, escondido dentro da bíblia.

Após a cerimônia, caíram na estrada, mas antes, escandalizaram os convidados pela ultima vez, fazendo uma sessão de sexo oral na escadaria da igreja.

Com o passar do tempo, este casamento, por certo, cerceou em muito, a mobilidade de Ramis Seomis, e o centro do universo em seus quatorze bilhões de anos de existência, nunca ocupou um espaço tão reduzido.

Como tudo mais na galáxia, a redução linear, teve pontos positivos e pontos negativos, como tudo mais, dependia do ponto de vista sob o qual o observador se colocaria.

Observado sob o prisma dos teóricos do big crunch, seria de grande valia se eles soubessem que o ponto onde ocorreu o evento que deu origem a todo o universo, estava agora restrito a uma circunferência de no máximo cem metros, que era a área em que Ramis se deslocava quando cumpria a sua obrigação diária de levar o lixo da cozinha até o portão da rua.

Com base nesta informação á respeito de onde tudo começou, os estudiosos poderiam calcular, medindo a presença de resquícios de níquel-56, em nebulosas oriundas de explosões de super novas, a velocidade do movimento inicial de expansão e conseqüentemente a idade precisa do universo.

Mas os cientistas – para a desgraça do conhecimento – não sabiam que o grande Ramis Seomis tinha se casado (e nem sabiam também, no que é que ele era grande). Não sabiam que Seomis estava agora limitado a se movimentar de sua cozinha até a calçada em frente a sua casa. Mas mesmo se soubessem não teria grande valia, porque os estudiosos não acreditavam que o umbigo de Ramis Seomis estava acoplado ao centro do universo. Quem acreditava nisto era só o próprio Ramis e Alic Sirp, que por segurança, tinha até se casado com ele.

Outro ponto positivo, diz respeito à Cia de Correios e Telégrafos.

Na época em que Ramis seomis ainda era solteiro e tinha o espírito indômito e sede de liberdade, e a cada dia amanhecia em uma cidade diferente, a dificuldade dos caras dos correios em lhe entregar a correspondência era enorme. Agora era diferente. Sabiam que o espírito indômito do grande Ramis Seomis tinha sido domado. Agora ele tinha logradouro pra correspondência, e comprovante de residencia para o cadastro.

Só no ultimo mês, conseguiram entregar vinte e nove convites personalizados idênticos para adquirir um cartão de credito que ele já tinha adquirido, vinte e sete cartas ameaçadoras idênticas dizendo que ele não tinha pago a fatura de um cartão de credito que ele não tinha adquirido, e setenta e três cartas idênticas dizendo que ele era uma cara legal e de bom gosto, e que por isto foi selecionado entre milhares para adquirir um jazigo para toda a família no “Cemitério Parque Enterrou Está Morto”.

O lado negativo de cerceamento de mobilidade, era do ponto de vista do próprio Ramis Seomis. Ele achava meio chato só poder se deslocar dentro de uma circunferenciazinha de apenas cem metros, mas o pior é que de todo lugar dentro desta circunferência, ele podia ver e ser visto por Alic Sirp com seus indefectíveis bobs na cabeça.

Era principalmente por isto, que ele agora estava muito feliz em ter conseguido sair de casa e de acampar naquele lugar sobrenatural, mesmo que para isso tivesse que trazer junto Alic Sirp, os bobs e o centro geométrico do universo.

milimetro
Enviado por milimetro em 05/09/2007
Reeditado em 28/12/2007
Código do texto: T639923
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