A PADARIA

Caros amigos:

Este texto de humor é uma paródia ao famoso poema A CATEDRAL, de autoria do grande poeta mineiro e meu tio-avô, Alphonsus de Guimaraens. Transcrevo, antes, o referido poema, respeitosamente, publicando a paródia em seguida.

A Catedral

(Alphonsus de Guimaraens)

Entre brumas ao longe surge a aurora,

O hialino orvalho aos poucos se evapora,

Agoniza o arrebol.

A catedral ebúrnea do meu sonho

Aparece na paz do céu risonho

Toda branca de sol.

E o sino canta em lúgubres responsos:

"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O astro glorioso segue a eterna estrada.

Uma áurea seta lhe cintila em cada

Refulgente raio de luz.

A catedral ebúrnea do meu sonho,

Onde os meus olhos tão cansados ponho,

Recebe a benção de Jesus.

E o sino clama em lúgubres responsos:

"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

Por entre lírios e lilases desce

A tarde esquiva: amargurada prece

Poe-se a luz a rezar.

A catedral ebúrnea do meu sonho

Aparece na paz do céu tristonho

Toda branca de luar.

E o sino chora em lúgubres responsos:

"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O céu e todo trevas: o vento uiva.

Do relâmpago a cabeleira ruiva

Vem acoitar o rosto meu.

A catedral ebúrnea do meu sonho

Afunda-se no caos do céu medonho

Como um astro que já morreu.

E o sino chora em lúgubres responsos:

"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

A PADARIA

(Mario Roberto Guimarães)

INTRÓITO

De vez em quando, nada como ser criança

E, em vez de, das portas bater as aldravas,

Muito melhor é brincar com as palavras,

Mantendo sempre vivo na lembrança

Que, até ao se fazer uma paródia,

Há que estar atento à prosódia.

A PADARIA

Afinal, ao longe, surge a aurora.

Tenho que levantar-me agora,

Livro-me do lençol.

A padaria abre-se no meu sonho

E eu, rápido, de pé me ponho,

Num belo dia de sol.

E na rua ouço os vadios cães:

Pobre Guimarães, pobre Guimarães.

Do pão saboroso sai a primeira fornada.

E uma fila se forma, de gente apressada,

Já à primeira luz.

A padaria aberta do meu sonho

Está cheia de um povo tão risonho

E tem um cheiro que seduz.

E a balconista diz, ao entregar-me os pães:

Pobre Guimarães, pobre Guimarães.

À tarde, novamente me aparece,

Para o lanche, de que cada um carece,

O ter que o pão comprar.

A padaria aberta do meu sonho

Está menos cheia, com um ar tristonho,

E o dono a reclamar.

Ouço as mesmas palavras das manhãs:

Pobre Guimarães, pobre Guimarães.

Mais tarde, enfim, nasceu a lua.

Não me adianta mais sair à rua,

A noite já desceu.

E a mesma padaria do meu sonho

Está fechada e a pensar me ponho.

O dia já morreu.

E assim, não posso mais comprar os pães:

Pobre Guimarães, pobre Guimarães.

EPÍLOGO

A paródia está pronta e, certamente,

O poeta, com o que fez, ficou contente,

Tem o dever cumprido.

E se hoje fora vivo, o mestre Alphonsus

Haveria de enviar-me os seus responsos,

Decerto comovido.

E encerraria com um recado aos meus fãs:

Grande Guimarães, Grande Guimarães.

Mario Roberto Guimarães
Enviado por Mario Roberto Guimarães em 26/07/2019
Reeditado em 26/07/2019
Código do texto: T6705120
Classificação de conteúdo: seguro