A Mulher Fantasma da Ilha Fit - Capítulo VI - Daqui ou d'Além, Vem Cá Meu Bem!

Todo mundo acordou uns dois palmos mais alto no dia seguinte à pajelança frustrada, inclusive eu. Fiquei muito espantado, até que um dos nativos me explicou que estavam todos compridos de desapontamento. Depois passava. Satisfeito com a explicação, fui tomar café. Na ilha havia uma máquina automática dessas da Nescafé, e todas as opções eram gratuitas. Muito legal! O pajé estava todo ressabiado por causa do fracasso, e evitava conversa. Sentei-me sobre um tronco, e ele aproximou-se, desconfiado:

- Infelizmente falhamos, missifio... Deve ter sido a tinta sagrada...

- Missifio uma porra, pajé. Tu ficas falando essa estória de "Missifio" com esse sotaque de Campina Grande, e vem tirar onda de feiticeiro. Põe um véu na cara e um fio dental pra ver se lembra a Feiticeira, que é mais negócio!

- Epppaaa! Não é por aí não, Missifio! Sou macho! Facão! Mão-única entendeu?

- É, tudo bem, me desculpe. Tô exaltado.

- Você está é arretado. Tome aqui mais um café com leite ali da máquina.

E me estendeu um copo que já tinha na mão. Achei o gosto esquisito, mas sabem como são essas máquinas... Pensei que fosse normal. Normal o escambau, porque mal terminei de beber e me bateu uma zonzeira. O pajé olhando engraçado pra mim. Só então me deu o estalo:

- Pajé, você me dopou?

O Pajé balançou a cabeça, envergonhado, mas convicto:

- Desculpe, Missifio, mas sabe como é. Você é recém-chegado. Por causa da maldição do esquecimento tem gente aqui que não sabe mais a diferença entre uma mulher e um fusquinha 74. Sua memória tá muito fresquinha ainda e você leva vantagem demais. Agora Pajé te bota pra dormir e assim quando você acordar tribo já vai ter começado busca. Assim negócio fica mais justo.

- Pajé, só posso te dizer uma coisa, não me leve a mal...

- Diga, Missifio! O que é?

- Você é um grande filho de uma... - E desmaiei. Acordei com o sol já alto e nem viva alma. Haviam largado tudo e partido na busca à mulher fantasma, morta ou morta. Levantei meio zonzo e foi então que percebi a presença de Juvenal sentado numa pedra e com um porrete na mão. Evidentemente ele esperava que eu acordasse. Agradeci:

- Ei, velho, e aí? Tava tomando conta de mim? Obrigado!...

- Obrigado uma porra. Os outros foram começar a busca, mas eu sei que você ainda lembra direitinho como é mulher, e não vai adiantar o fantasma despistar você, por isso você vai me guiar. - Juvenal estava obcecado, e vi que era perigoso. Ele já estava com os olhos duros, e não só os olhos... Aceitei a situação enquanto pensava numa saída. Fui caminhando na frente enquanto ele me seguia com o porrete na mão e um vidrinho de perfume na outra. Perguntei pra que era aquilo.

- O porrete é pra quebrar tua cabeça. E o perfume... É pra botar quando a gente achar o fantasma. Quero estar cheiroso.

E lá fomos. Depois de andar a esmo por horas, tive uma idéia. Demos de cara com um caracol gigante da ilha, com sua carcaça cheia de voltas. Abaixei-me rápido e disse: - É ela!

Juvenal jogou-se no chão, frenético: - Aonde? Aonde? Aonde?

Contendo-me pra não rir, apontei o caracol gigante. Ele já jogando perfume pelo corpo tudo, principalmente no bilau.

- Que é que faço agora? Digo que conheço de algum lugar? Convido pra sair? - disse o homem, fora de si.

- Olha, Juvenal, você está muito no atraso e acho que não tem tempo pra esses rodeios, até porque ela é um fantasma e pode virar fumaça no meio da frase...

- É isso mesmo! Vou mandar ver! Olha só que gostosa! Eu bem que ainda lembrava que mulher é assim, cheia de curvas...

E partiu pra cima do pobre caracol, esquecendo totalmente de mim. Aproveitei pra me mandar, subi um pequeno morro, e curioso, me voltei pra ver o que acontecia entre Juvenal e o caracol. E meus amigos, foi nesse momento que eu vi a cena mais bizarra já protagonizada entre um ser humano e uma inocente e indefesa criatura de Deus.