O BENZEDOR E O TIME DE FUTEBOL EM MÁ FASE

Quando eu era criança, havia uma enorme rivalidade entre os dois maiores times de futebol da cidade: Independente e Abaeté Atlético. O Atlético era mais elitista, o Independente o mais popular. Na escola Frederico Zacarias onde eu estudava, falavam que os ricos torciam para o Atlético e os pobres para o Independente.

Eu era ferrenho torcedor do Independente, Valdirinho meu irmão era goleiro. Nós, os torcedores do CIA, vivíamos sofrendo “bullying” na escola, certa vez ouvi um aluno filho de um doutor, falando que era fácil identificar torcedor: era só olhar os pés, se estivesse descalço e sujo, era torcedor do Independente... Em defesa do alvirrubro, volta e meia eu saia nos tapas com algum colega.

Passaram-se vários anos sem que houvesse um confronto entre as duas equipes, durante um, houve um grande tiroteio, com vítimas fatais. A rivalidade continuou.

Certa vez o Independente passou por uma “zica” danada: não ganhava os jogos, levava constantes goleadas, o alambrado caindo aos pedaços, a torcida não comparecia aos jogos, os sócios deixaram de pagar as mensalidades... O presidente Waldir Rodrigues, o popular Waldir do Bar, acreditava que era alguma mandiga de atleticano. Resolveu contratar um famoso benzedor para que fizesse um trabalho para acabar com a “Inhaca”. O benzedor acompanhado pela diretoria do clube e alguns torcedores, fui ao campo, rodeando-o várias vezes dramatizando o trabalho, ora rezando, ora falando palavras cabalísticas, fazendo pantomimas, aspergindo um tipo de óleo e esparramando sal grosso e ramos de arruda pelos quatro cantos. Em dado momento, como se estivesse em transe, pegou uma enxada e cavou na parte traseira de uma das traves. Após várias enxadadas, exclamou triunfante:

-Arrá... Achei!

Havia encontrado enterrado ao pé da trave, um chifre bovino cheio de cabelos humanos e fitas coloridas. Explicou que era mandinga de algum torcedor adversário. Os presentes ficaram boquiabertos com a eficácia do benzedor.

Aí tudo ficou como dantes no Quartel de Abrantes: tinha acabado o malefício. O Independente foi como a Fênix: ressurgiu das cinzas. A”cafinfa” acabou, o time voltou a vencer, a torcida voltou aos jogos e os sócios voltaram a pagar as mensalidades e o número deles aumentou.

Anos depois, o benzedor se mudou para outra cidade e confessou a um vizinho a farsa: Como sabia da situação do Independente teve a premonição que, cedo ou tarde o procurariam para um trabalho. Sorrateiro, durante uma noite, pulou o muro do estádio e enterrou ele próprio, o chifre, para dar maior realismo ao trabalho...

Mas valeu pelo lado psicológico, elevou o moral da equipe...

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HERCULANO VANDERLI DE SOUSA
Enviado por HERCULANO VANDERLI DE SOUSA em 01/09/2022
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