O ENTERRO DO SAPO  -  Cap. VII


_ Sábado parece sexta-feira, mas parece também com domingo. No dia de sábado as pessoas grandes trabalham até meio dia. Depois os homens saem do trabalho, passam no bar e bebem pinga. Têm outros que só compram coisas de casa e balinhas para os filhos, como o papai faz. Depois disto, todo mundo vai pra casa, almoça, vem à tarde, aí todos dormem e aí começa o domingo.

Menina achou a explicação meio complicada e falou com Zico.

_ Depois eu explico pra você o que ela disse. Sábado é diferente mesmo.

À noite, durante o jantar, o assunto foi a tempestade. As crianças contaram para o pai tudo que acontecera na tarde e todos riram muito. Sinhá Doninha não gostou das brincadeiras de que foi vítima. Ela era muito religiosa e estava convencida de que graças à sua interferência junto aos santos, conseguira que chovesse no último dia da novena e que parasse de chover, tudo isso em um único dia.

No manhã seguinte, logo após o café, os garotos saíram pra frente da casa. Os estragos causados pela chuva tinha sido considerável. Centenas de galhos caídos das árvores se espalhavam em volta da casa. Os pequizeiros quase perderam os frutos todos. Jatobás e aroeiras não pareciam mais às árvores da manhã anterior. Ao ver aquela desolação, Zico exclamou com tristeza:

_ Puxa! As árvores estão carecas.

Liviva apressou-se a explicar para o irmão, porque aquilo acontecia.

_ É assim que Deus corta as árvores, pra elas não crescerem muito e não tocarem no céu.
Ao ouvir isto, Menina indagou:

_ Pra não crescer como aquele pé de feijão, que o papai contou pra gente?

_ É sim, é por isso - concordou Liviva.

_ Com que Deus cortou os ramos? - quis saber Zico.

_ Com a chuva, ora! - disse Liviva.

_ Chuva não corta nada! Foi o vento que quebrou os galhos. Interveio Menina.

_ Nós olhamos pela janela. Ontem à tarde vimos que foi o vento, não foi Zico?

_ Foi sim! Agora vamos lá ver a casa do calango, vamos?

_ É mesmo. Essa hora nem dá mais pra ajudar os bichos que estão machucados. A gente demorou muito - disse Menina ansiosa.

Ao chegarem junto à paineira, Liviva sugeriu que os ramos caídos fossem afastados com cuidado. Podia ser que sob um deles tivesse algum animalzinho ferido. Zico aproximou-se do tronco partido e ficou na ponta dos pés para olhar o interior do mesmo. Depois, passando os dedinhos no ferimento da árvore, perguntou pra Menina:

_ Moço! Vem ver uma coisa, árvore tem sangue?

A garota aproximou-se do tronco rachado e respondeu:

_ Sangue de árvore se chama seiva. Lembra? O papai contou pra gente, quando ele leu a história da deusa grega...

_ Isso está doendo na árvore? Ela está toda espetada.

Realmente, o raio deixara a paineira com a aparência de um porta-flechas, cujas pontas afiadas apontavam para o alto. Menina tocou com o dedo indicador em uma das pontas e concluiu:

_ É claro que está doendo. O raio foi muito ruim com ela. Agora esta árvore vai crescer só de um lado, vai ser corcunda.

_ Corcunda como aquele homem que a gente viu na calçada da padaria do tio Francisco?

_ É sim. Corcunda como aquele homem.

_Então eu não venho mais aqui. Eu fiquei com medo daquele  homem.
Hull de La Fuente
Enviado por Hull de La Fuente em 17/07/2008
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