Ouvi contar
Ouvi contar...
Era uma vez um lobisomem cansado, envelhecido de desencantamento, que inventou uma arapuca pra pegar galinhas porque lhe faltava ar e pernas pra correr atrás delas.
Botou a armadilha no terreiro do sítio de uma viúva e esperou a noite inteira até ouvir um estalo de penas. Foi ver e não é que tinha capturado um anjo?
Um anjo...
O lobisomem tímido, sem jeito, não sabia se pedia desculpas, autógrafo ou se assava o anjo.
Ficou um tempo matutando se anjo a gente come, já que tem asas e penas de frango.
Assim, amanheceu satisfeito de dúvidas.
Abriu a arapuca e soltou o anjo que com graciosidade divina bateu asas e foi-se embora. E concluiu com seus botões o lobisomem: nem posso contar isso pras pessoas porque ninguém anda acreditando muito em anjos e muito menos em palavra de lobisomem.
E, tal como o anjo, com a divina graça, também foi-se embora.
Porque em horas perdidas, o lobisomem, envelhecido de desencantamento, era poeta e contador de histórias.