Capítulo 13 – Desentendimento na Família.



Foi uma gravidez muito boa; sentia-me saudável; preparava o enxoval do bebê com alegria. Quando meus sogros desocuparam o quarto, dediquei-me à arrumação com entusiasmo.
Eu tinha um guarda roupa de madeira maciça, feito quando a minha irmã nasceu. Tinha um lado alto, para pendurar roupas e ao lado uma cômoda com quatro gavetas grandes. Mandei laquear de vermelho e branco, como se usava na época.

Meu pai ficou bravo:
- Como você tem coragem de laquear uma madeira dessa qualidade? Que judiação! Mas eu não quis nem saber; comprei o berço, também laqueado, combinando; uma banheira com pés altos e em cima o trocador. Escolhi um tecido alegre, de bichinhos e fiz a cortina e uma colcha para a cama de solteiro.

Lembro-me que eu mesma confeccionei um armarinho dobrável e um abajur, feitos com um tecido vermelho de bolinhas brancas. O quarto ficou uma gracinha; eu acendia o abajur, fechava as cortinas e imaginava o meu bebê ali no bercinho...

Comprei um livro famoso, grosso, “A Vida Do Bebê” do Dr. De Lamare.
Lá explicava tudo e lembro-me que dizia que um recém nascido dorme dezoito horas por dia! Que maravilha! Eu lia tudo e achava que sabia tudo, eu era a própria “mãe de manual”...
Doce ilusão...
Arranjei uma empregada que cozinhava muito bem, a Neusa, e preparei-me para o nascimento que seria no início de julho.

Meu pai me aconselhava:
-Não seja boba, faça cesariana, é muito melhor.
Ele era farmacêutico; tinha ajudado em muitos partos em fazendas e tinha visto muitas barbaridades em lugares sem recursos, sem hospital, com mulheres que davam à luz em casa.
Eu por minha vez, também era medrosa, não me sentia com coragem de enfrentar o parto normal. O médico, percebendo a minha insegurança, também aconselhou a cesariana.

O meu bebê nasceu no dia 3 de julho de 1973. Era uma graça: forte, cabelos e olhos escuros.
Eu o sentia muito próximo de mim, como se fosse alguém já muito conhecido, uma pessoa que estaria sempre ao meu lado, ao meu favor; uma sensação de paz e alegria profunda como nunca tinha sentido antes. Pusemos o mesmo nome do pai: Mauro Filho.
Hoje eu sei que isso não é bom, pois aumenta a confusão que já existe naturalmente entre as personalidades do pai e do filho; mas era uma tradição das famílias italianas e então foi assim feito.

Depois de três dias na maternidade, fomos para casa e aí começou a verdadeira labuta!
O meu estudo do manual do bebê não serviu para muita coisa; a prática foi decisiva! Logo na primeira noite, ele não dormiu nada: chorava, eu dava de mamar, evacuava; eu trocava as fraldas e pensava que ele agora ia dormir as tais dezoito horas prometidas!
Que nada!
Mais um pouco e lá estava o bebê berrando; e para piorar a situação, era inverno e estava um frio de congelar! Eu dava de mamar, ele evacuava de novo e troque as fraldas outra vez!
E assim foi a noite toda; de manhã eu tinha um tanque cheio de fraldas sujas (naquele tempo quase não se usava as fraldas descartáveis) e eu apavorada, ligando para o pediatra!
Ele explicou:
-É assim mesmo mamãe, fique calma...

Foram passando os dias; o bebê continuava dormindo muito pouco e chorando muito...
Eu estava louca da vida com o livro do Dr. De Lamare: ou meu filho não se enquadrava nas regras ou ele estava errado...
É claro que o livro estava certo: a criança não dormia porque eu era uma mãe ansiosa e preocupada...

Um dia uma amiga, a Zulmira, foi me visitar.
Quando ela chegou eu estava no fogão, fervendo uma quantidade enorme de mamadeiras, bicos, chupetas, colheres.
Meu pai ensinava a fazer isso; ele temia os micróbios e as infecções. A Zulmira começou a rir:
-Engraçado isso! Eu só tive uma mamadeira para os meus três filhos; eu só lavava e passava de um para o outro...

Aí é que fui me dar conta de como eu era complicada!
A Zulmira é assim: tranqüila, confiante, nada consegue abalar sua calma.
As crianças a adoram porque ela as deixa à vontade, sempre com uma porção de guloseimas no armário da cozinha. Ela nunca se preocupou com remédios e seus filhos nunca ficaram doentes...

Minha empregada, a Neusa, era excelente; cozinhava muito bem, cuidava da casa, da roupa e do bebê.
Quando terminou a minha licença de gestante, três meses, voltei às minhas aulas, sossegada: ela cuidava bem do garotinho.
Nessa época eu dava aulas de português numa outra escola técnica e continuava com as aulas no colégio estadual.
O Mauro trabalhava muito e ficava pouco tempo em casa; não podia curtir muito o filho mas dava todo o apoio que podia.

Então, meus sogros, que até então quase não davam sinal de vida, apareceram com uma notícia que acabou causando acontecimentos desagradáveis.

Eles tinham uma casinha na praia de Massaguaçu, em Caraguatatuba. Era para lá que íamos na época do namoro; ficávamos lá com o irmão mais velho dele, o Rob e com a Marilu, esposa dele.
Era uma casinha simples, no começo nem tinha eletricidade e usávamos lampiões; mas o Mauro tinha loucura por aquele lugar, adorava aquela praia e estava planejando reformar e melhorar a casa.

Meus sogros estavam sem dinheiro e precisavam montar algum negócio para poderem se sustentar; foram conversar com o Rob e explicaram que precisavam vender a casa da praia para arranjar algum capital.
Então eles combinaram em vender a casa sem contar nada para o Mauro, pois sabiam que ele não concordaria.
E esse fato foi o estopim para uma serie de desentendimentos e desarmonias na família.

Nesse dia meus sogros apareceram na nossa casa para contar que tinham vendido a casa; o negócio já estava concretizado e não tinha mais volta.
A briga foi horrível, o Mauro gritou com o pai, disse que não aceitava de jeito nenhum, principalmente por estar se sentindo traído tanto pelos pais como pelo irmão.

Eu ficava de fora, assustada, como quando era criança e meus pais brigavam; eu não participava, não tomava partido e o meu marido também não falava muito sobre tudo isso comigo: ele sabia que eu não aprovava a forma como os pais dele viviam e conduziam seus negócios.

Cortaram relações, não se falavam mais; ficaram um bom tempo sem aparecer.
O Maurinho foi crescendo e eles quase não o viam; eu sentia uma ponta de remorsos; será que eu tinha culpa do que acontecera?
Quando pedi para eles saírem, era para sair da minha casa; não me importaria se meu marido pagasse aluguel para eles enquanto eles precisassem.
Mas meu sogro não aceitaria uma situação ainda mais humilhante do que a que estava vivendo quando moravam conosco.
Convenhamos que ele não era uma pessoa previdente, nunca tinha pagado aposentadoria nem previdência social; sempre dizia que era melhor pagar aluguel do que ter casa própria; nunca permitiu que a mulher trabalhasse fora.
E ele teve nas mãos grandes negócios e boas oportunidades, que infelizmente nunca conseguia manter, por causa de sua própria instabilidade.

Não pretendo assumir qualquer culpa ante os acontecimentos: eu fiz aquilo que era possível dentro do meu entendimento da época, e sendo sincera, hoje não sei se faria diferente.
Talvez se fosse hoje, tentasse dialogar mais, encontrar soluções em conjunto, resolver as coisas de outras formas.

Sei que todos os acontecimentos são a conseqüência natural da lei de ação e reação e que nesta vida temos a liberdade de plantar o que quisermos; sei também que a colheita será obrigatória...
Isso vale tanto para mim, como para eles, como para todas as pessoas: é uma Lei Universal.

O que aprendi com o passar dos anos é que não vale a pena levar tudo a ferro e fogo e que muitas vezes uma boa e sincera conversa resolve em uns minutos problemas que de outro modo perduram por anos e anos...

Que Deus nos ilumine e abençoe nossos relacionamentos!
E nos dê muita, mas muita paciência e sabedoria!


   continua.....                         
Malu Thana Moraes
Enviado por Malu Thana Moraes em 28/08/2009
Reeditado em 13/11/2009
Código do texto: T1779943
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