DRUFF DAMASKUS

CAPÍTULO UM

Estavam a poucos metros da praia. As águas azuis do mar pareciam agora mais azuis, sob o reflexo do sol da tarde. Uma espumazinha batia na areia e depois sumia. Umas gaivotas sobrevoavam o horizonte. O grupo estava sentado debaixo da sombra de uma grande árvore, uma árvore que os mais velhos chamavam de centenária. Os meninos não sabiam o que isso significava, mas era assim que a tratavam. E era assim que Druff os convocava: Amanhã, debaixo da centenária, depois da aula. A centenária dava uma sombra bem grande. Os meninos não subiam nela. Era proibido. Não podiam subir nela. Não podiam fazer fogo debaixo dela. Não podiam sequer arrancar as folhas.

“Menina no grupo ninguém quer”, disse Druff, com ênfase.

Pensou um pouco, olhando os olhos arregalados dos outros meninos. Eles não diziam sim e não diziam não.

“Alguém quer?”

Todos levantaram um braço, à exceção de Brihi, que levantou os dois braços.

“Meninas?” Druff perguntou, quase sem acreditar.

“Sim!”, gritou Brihi. “Uma menina.”

“Mas a gente tinha combinado que meninas não iam entrar.”

“Essa menina é diferente, Druff”, retrucou Flámil.

“Então vocês já escolheram?”

“Quase isso”, alguém disse e os demais balançaram a cabeça, concordando.

“Quem é?”

“Élida.”

Druff não gostou nada daquilo. Élida era mandona e possivelmente muito mais inteligente que todos eles juntos. Seria perigoso alguém como ela no grupo.

“Por quê?”

“Posso falar?”, perguntou Luc.

Luc era muito respeitado. Druff fez que sim com a cabeça

“Olha, Druff, Élida é muito boa, sabe? Ela é forte e bem inteligente. Acho que a gente deveria aceitar ela no grupo.”

“Ela sabe escalar montanhas”, aduziu Guz.

“Ela gosta de acampar e já ganhou brigas com meninos mais forte que ela”, completou Naíl.

“E... ela não é nada bonita”, riu Luc.

Todos riram, menos Druff.

Druff pegou um graveto e ficou partindo-o em pedacinhos.

“Não sei...”

“Druff”, falou Flámil. “E se a gente colocasse ela pra fazer um teste? Ela só entra se passar no teste.”

Todos concordaram, rindo e batendo palmas.

Druff estava silencioso.

“Vou pensar.” Disse Druff, dando um ponto final naquela conversa. “Mais algum assunto?”

Brihi levantou o braço.

“Fale, conselheiro Brihi.”

Cinco meninos estavam sentados com as pernas dobradas, formando um semicírculo. Druff e outro menino, que até o momento nada dissera, Helius, sentavam mais afastados, de frente para os demais, como se liderassem o grupo.

“Amanhã vai chegar o circo.”

“Como obteve esta informação, conselheiro?”

“Meu pai.”

“Então, conselheiros, vamos ao circo?”

O garoto ao lado de Druff sorriu amarelo e disse:

“Eu não vou.”

“Por quê, Helius?”, quis saber Luc.

“Por que não tenho dinheiro.”

Helius era o mais pobre do grupo. Nem morava no bairro dos outros garotos.

“O grupo resolve isso”, garantiu Druff.

“Não precisa.”

“Estou dizendo que o grupo vai resolver, conselheiro Helius.”

O garoto aquiesceu.

“Algo mais?”

“Nada”, disse o gorducho Guz.

“Então declaro a reunião encerrada”.

Toda aquela seriedade mudou subitamente. Viraram meninos de novo. Levantaram o correram para a praia. Druff gostava das reuniões. Mas todos os detalhes para que ocorresse dentro da formalidade foram trazidos por Luc. Luc acompanhava o pai nas reuniões do Conselho da Igreja. Lá eram metódicos, sérios, ninguém sequer esboçava um sorriso. Os meninos acharam interessante imitar o jeito dos adultos de fazerem reuniões. E ainda implantaram alguns detalhes que viram em filmes antigos.

“O último a chegar vai comer cocô”.

Carreira desabalada pela areia. Os pés afundando. Guz chegava por último, todas as vezes.

“Isso não vale”, ele gritava, arfando e correndo.

A água estava fria. Luc entrou. Os outros ficaram olhando.

Druff sentou na areia.

Naíl encostou a ponta do pé na água.

“A água só é azul lá longe”, disse. “Aqui é dessa cor...”

“Igual ao céu”. Druff falou. “Meu avô disse que o céu também só é azul de longe. Na verdade lá em cima não tem nada. É somente um buraco enorme, cheio de planetas e estrelas”.

“Como ele sabe disso?”

“Ele estuda muito. Tá nos livros”.

“Eu não acredito nos livros”.

“E no Manual do Criador? Você não acredita no Manual?”

Naíl fez uma cara de fastio:

“Cara, tantas histórias, será que é mesmo verdade?”

“Eu acredito”. Druff estava tranqüilo. Sabia que acreditava mesmo.

Os meninos estavam brincando na água, fazendo algazarra.

“E o teste?” perguntou Naíl.

“Que teste?”

“Pra Élida?”

“Cara, não sou a favor de meninas no grupo”, falou Druff, sério e aborrecido. “A gente vai ficar sem poder conversar direito. Já pensou quando fizermos trilha? Ficar cuidando dela, meninas sempre se machucam. E não adianta dizer que ela é alpinista. Eu não acredito. E não vamos mais poder tomar banho na cachoeira.”

“Eu nem pensei nisso tudo”, disse Naíl ficando preocupado.

“Tô lhe dizendo. Isso não vai dar certo”.

“É.”

O sol estava sumindo no horizonte quando voltaram, brincando por todo o caminho.

(CONTINUA...Aguardo seus comentários)

Edilson Paulo
Enviado por Edilson Paulo em 17/11/2012
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