[Original] Ela me faz - Capítulo 5

Capítulo 5 – O céu como única testemunha

Aproveitando toda a adrenalina dos últimos acontecimentos eu cheguei em casa com a vontade ainda maior em me vingar de Conrado. Arquitetei todo o meu plano durante a noite e início da madrugada. Era muito fácil. A única coisa que me faltava era um meio de transporte. Eu poderia pedir o carro do pai da Kelly, ele se sente em dívida comigo desde que salvei sua filha de uma festa em que ela quase sofrera abuso sexual, mas não sei dirigir. Se eu for a pé vou demorar pra chegar. Preciso de ajuda.

E nesse momento quase como um milagre, recordei de quando Lucas me contou que a própria Kelly vendera pra ele uma bicicleta. Mesmo sabendo que a nossa convivência estava sempre muito tênue, segui para seu quarto determinada a fazê-lo me ajudar.

Entrei em seu quarto e o encontrei dormindo pesado. As mãos pra fora da cama, só estava coberto da cintura pra cima. O rosto sereno.

- Se você não fosse tão idiota, estranho e confuso, eu provavelmente... – Não consegui completar. Tenho medo do poder das palavras. Ajoelhei-me ao seu lado e mexi em seu cabelo. – Lucas... – Ele não acordou ou mexeu o olho. – Acorda, preciso de ajuda.

- Não, Lennon... Mais 5 minutinhos. – E virou-se para o outro lado.

- Acorda idiota!!! – Peguei seu travesseiro do chão e bati em seu rosto, ele acordou sobressaltado, e ao me ver, fechou a cara. – Achei que teria de jogar água.

- O que tu quer?

- Você. - Ele franziu o cenho e eu tratei logo de me corrigir. – Digo, quero sua ajuda.

- Bah, são 2 da manhã, Rafaela!

- Eu sei olhar no relógio.

- Queres a minha ajuda pra que? – Perguntou, sentando-se na cama.

- Você vai comigo me ajudar na vingança com Conrado.

- Vou?

- Sim.

- Por que?

- Porque eu estou pedindo.

- Problema é teu. – Voltou a se deitar, mas ainda me olhava. – E eu preciso dormir, Rafaela.

- Por favor!!

- Não. Tu ainda gosta dele, esquece isso de vingança. Tanta gente é corna no mundo. – Eu me baixei sob ele, olhando-o furiosamente. Seu olhar resistiu ao meu.

- Eu não gosto dele, Lucas. E mesmo se gostasse, ainda me vingaria.

- Gostaria de acreditar em tu. – Ele suspirou, voltando-se a sentar na cama. Eu fiz o mesmo. – Como é esse plano?

- É assim...

(...)

- Tá explicado porque precisa de mim. – Ele murmurou, irônico. Eu abri o portão de casa lentamente, para não fazer nenhum barulho que acordasse Iasmin. Lucas passou com a bicicleta.

- Não reclama vai!

- Lógico que tenho que reclamar, isso vai dar errado e vamos ser pegos.

- Que nada. – Falei, tranquila. – Você nunca viveu uma aventura?

- Não. – E ele olhou pro céu. – Bah, vai chover.

- Se formos rápidos não pegaremos chuva.

Lucas se sentou primeiro e eu me sentei no ferro da bicicleta. Ele comandava o pedal, apoiando as mãos em minhas costas e eu controlava o guidão. Descemos a ladeira rumo a casa de Conrado.

- Tens certeza de que vai dar certo? – Lucas perguntou, sem esconder o medo na voz.

- Tenho. Eu só vou tirar algumas fotos dele. As meninas do grupo me disseram que há algo muito constrangedor que eu preciso descobrir.

- Grupo?

Direcionei o guidão pra entrada do segundo quarteirão que dava acesso a confeitaria da tia do Conrado. Lucas continuou pedalando a todo vapor.

- É, um grupo no facebook que me convidaram pra participar. Todas as ex do Conrado participam.

- Sério?

- Sim. Quando souberam que eu terminamos, trataram de me convidar. Há cerca de 50 garotas, ex-namoradas, ficantes e e

rolos. A casa é aquela azul no fim da rua, mas vamos entrar por trás.

Rodeamos a rua. Lucas parou e encostamos a bicicleta no muro que dava entrada aos fundos da casa.

- E eu tenho uma pessoa que me disse algo comprometedor de Conrado.

- E quem garante que essa pessoa só não quer te pregar uma peça?

Sorri para Lucas

- A minha intuição.

- Tem cachorro? – Perguntou ele, aparentemente satisfeito com a minha resposta.

- Sim... O Thor. Já trouxe algo pra ele não nos atrapalhar.

- O que?

- Sonífero num pedaço de carne!

Lucas meneou a cabeça, mas riu. Como a luz estava fraca, tateei a parede procurando alguma coisa que me ajudasse a subir.

- Vai, me ajuda a subir. – Pedi e ele fez “cadeirinha” com a mão para me ajudar. Com certo esforço, consegui subir o muro e pulei pra dentro, mas cai de joelhos, o que me fez gritar de dor. – Ai, droga.

- Machucou?

Thor já me olhava confuso por minha presença ali.

- Sim. Fica ai pra eu acalmar o Thor. – Abri a bolsa e tirei o pedaço de carne guardado num pote. – Oi garotão!! Olha o que a Rafa trouxe pra você!!

- Ele é um cachorro, não um bebê. – Lucas sussurrou. Mesmo sem ter visto, tive certeza de que ele revirou os olhos.

- Cala a boca! – Abri o pote e joguei a carne. Faminto, comeu em 1 minuto. Depois ele foi cambaleando, cambaleando até cair duro, num sono muito pesado. – Espero que ele não morra.

- Só se tu tiver confundido chumbinho com sonífero. – Lucas pulou o muro com graciosidade.

- O quarto é aquele ali. – Murmurei. A janela de madeira encontrava-se, para minha sorte, aberta.

- Vocês paulistas não tem medo de serem assaltado? Que mania de dormir com janela aberta.

- Invés de falar bobagem, me ajude a procurar uma escada.

- Acho que aquilo ali perto da máquina de lavar é uma escada. – As cegas, fui até a máquina de lavar e de fato, havia uma escada. Juntos, posicionamos a escada próxima a janela. Eu subi primeiro e entrei no quarto, Lucas entrou em seguida.

O meu parceiro no crime acendeu a luz e eu pude ver, com certa surpresa o quarto dele completamente arrumado. Quando olhamos a cama, vi a cena mais ridícula de toda a minha vida: Conrado dormia abraçado com um ursinho branco e preto.

- Agora eu sei porque poucas vezes ele me deixou entrar no quarto. – Murmurei, baixo. Lucas tapou a boca, tentando não rir alto.

Tirei a máquina fotográfica da minha bolsa e tirei cerca de 20 fotos e por último fiz um vídeo. Só para a vingança ser maior.

- Tens um batom ai? – Perguntou ele, contendo o riso.

- Não. Porque?

- Bah, ia escrever uma coisa na testa dele.

- Tenho canetinha, serve?

- Sim.

Passei a canetinha pra ele, que se aproximou de Conrado e riscou em sua testa com letras garrafais “trouxa”.

O som de alguém abrindo a porta de outro quarto nos fez sair do quarto às pressas. Não seria legal ser pega pela mãe do Conrado. Desci pelas escadas primeiro e Lucas em segundo. Corremos para pular o muro e só quando já estávamos na rua e montados na bicicleta, comemoramos o sucesso do plano.

- Tu vai fazer o que com essas fotos?

- Divulgar pra todo o Amália ver.

- Bah, tu é cruel mesmo, hein?

- Um pouco.

- Sem dúvidas.

Sorri satisfeita demais com todo o plano, e também com o parceiro que escolhi. Olhei o céu e vi a beleza da noite repleta de estrelas, deu uma vontade de ir embora a pé para aproveitar tudo aquilo, mas a ameaça de chuva ainda era certa.

Parecia que a noite ia ser perfeita, porém, distraída com o céu, não vi quando a bicicleta topou numa pedra, o que fez eu Lucas cairmos. Eu na guia da rua e ele em cima da calçada.

- Ai meu joelho! – Gritei, colocando a mão sob a área que agora sangrava.

- Rafaela...

- O que?

- Um gato tá vindo na minha direção.

- E o que tem?

- Eu morro de medo de gato. – Segui seu olhar e realmente um gato negro e gordo vinha em nossa direção em passos ameaçadores. E como se ele sentisse o medo de Lucas, olhava diretamente para o mesmo.

- Calma! Gato não ataca!! – Eu nem sabia o que estava dizendo, mas precisava fazê-lo se acalmar.

- Calma nada, sobe nessa bicicleta e vamos embora. – Fiz o que ele mandou, mas dessa vez eu pedalei e ele guiou a bicicleta. Eu nunca em minha vida vi um gato sair correndo atrás de humano, mas esse correu e não foi pouco. Basicamente, ele só parou quando chegamos em casa. E ainda entramos pelos fundos, passando pela casa do vizinho do outro lado, que para a nossa sorte, o muro era baixo. O dilema maior foi em como passar a bicicleta.

- Bah! Deixa eu resolver isso! – Lucas pegou a bicicleta com as duas mãos e a jogou nos fundos da nossa casa. – Espero que não acorde a Iasmin.

Pulamos o muro juntos e dessa vez para meu total conforto, cai em cima de Lucas próximos a bicicleta no chão, toda torta. Ambos rindo, cansados de uma aventura que com certeza nos lembraríamos por anos.

- Tu está gorda mesmo, hein! – Disse, brincalhão.

- Idiota!

Ele não parou de rir.

- Até que foi legal.

Eu o fitei por um longo tempo, admirando cada pedacinho dele, desde o sorriso largo, até o cabelo sempre bagunçado. Ele me olhou também, gostando de ser admirado. Suas mãos pousaram sob minha cintura. Muitas perguntas passaram pela minha cabeça, várias. Perguntas que me fariam desistir do que viria a seguir. E eu não quero desistir. Era claro que depois de todas as nossas brigas, esse momento era o mais esperado por nós.

- Eu achei que isso nunca fosse acontecer. – Lucas murmurou, com a voz baixa. Ele era tão lindo que as vezes eu perdia o ar.

- Eu também.

Rocei meus lábios sob os dele, calando qualquer objeção. O beijo tão ansiado por nós dois começou calmo e depois tomou uma proporção absurdamente quente. Era bom beija-lo, senti-lo. Rolamos pelo grama do quintal, o céu estrelado como única testemunha do momento.

- Tu é muito linda quando não está brigando comigo, sabia?

- Sabia sim.

Ele me beijou novamente e agora por cima de mim, prendeu-me em seus braços, explorando a vontade de me dominar. E em nenhum momento eu resisti. Algumas horas a sensação de infinito me invadia. Eu nunca havia tido isso com outra pessoa. Foi sem dúvidas a melhor coisa que senti.

Quando nos soltamos, sem fôlegos, rostos quentes e corados. Me levantei da grama e o olhei mais uma vez, desejando que ele não esquecesse daquela noite, pois eu jamais me esqueceria.

- Boa noite. – Eu falei, sem muita certeza de que queria mesmo ir embora.

- Boa noite, Rafa.

Antes de sair, vi Lucas deitar novamente e olhar o céu com um sorriso. Ele, assim como eu, estava perdido em seus pensamentos.

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 19/04/2014
Reeditado em 25/06/2022
Código do texto: T4774367
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2014. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.