[Original] Ela me faz - Capítulo 23

(n/a: trechos em aspas são memórias de We Are Young e também de Ela me faz)

Esse é o famoso capítulo "remember" que há em muitas histórias...

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Capítulo 23 – Eu aceito a sua escolha.

Rafaela Marchiori

Eu despertei do que me pareceu um coma com um grito. E foi um grito alto. Doloroso. Nem eu sabia de onde tinha saído tanta vontade de gritar. Estiquei as mãos e comecei a ofegar. Estava com vontade de chorar e não sabia nem o porquê. Em minha visão um tanto embaçada, vi minha mãe e meu pai entrarem no quarto em câmera lenta. Minha mãe chorava muito e meu pai segurou a minha mão com carinho e alívio. Tentei juntar as coisas mas ainda não entendia nada. É claro que me lembro das coisas que Raquel me fez, as marcas não me deixam esquecer. Mas o que aconteceu depois disso eu não lembro.

Por cerca de meia hora meus pais falaram comigo e eu só consegui responder monossilábica. Meu olhar passou pelo chão e eu vi um papel amassado no chão e franzi o cenho, mas não perdi muito tempo o olhando.

Depois minha irmã entrou no quarto e os três ficaram me perguntando como eu me sentia. Novamente fui monossilábica. Toda essa expressão preocupada e sofrida me deixa agoniada, mesmo eu sabendo que eles estão verdadeiramente preocupados comigo. Não que eu não esteja agradecida, mas preciso de respostas que eles não podem me dar.

Eles saíram do quarto, talvez um pouco frustrados comigo, mas não disseram nada. Iasmin entrou logo em seguida.

- Amiga! – Ela me abraçou apertado (um pouco demais) e segurou no rosto. E me abraçou novamente. – Eu estou tão feliz que você esteja bem!

- Iasmin.

- Fiquei tão preocupada...

- Cadê o Lucas?

A expressão dela se fechou, naturalmente. E foi como se eu tivesse dado um tapa na cara dela de surpresa. Iasmin me deu as costas e respirou fundo. Voltei a olhar o papel dobrado no chão e não pude mais ignorar a sensação que a minha resposta viria dali.

- Iasmin, eu não posso descer da cama, pega esse papel aqui que caiu... Por favor. – Pedi a ela, que não me olhou nos olhos. Ao me entregar o papel, seu olhar cruzou o meu.

- Eu não sei o que falar, Rafa.

Abri o papel. E ao ler as primeiras palavras desejei nunca ter feito isso.

“Rafaela,

Quando tu ler essa carta eu não estarei mais aqui, e eu sei que tu vai me odiar por não ter coragem de me despedir, mas chega uma hora que as pessoas precisam ficar longe uma das outras pra saber o que elas querem, se sentirão mesmo falta do que viveram e todas aquelas coisas que fazem parte de um relacionamento. Mesmo que o nosso relacionamento nunca tenha sido um conto de fadas. Acho que não combina muito conosco. Nesses 5, quase 6 meses aqui (bah, passou rápido) eu aprendi várias coisas. Uma delas foi a entender as mulheres, e ver o quanto ser amigo de uma pode ser uma experiência válida pra vida. Mulher é um troço louco.

Eu sei que algo está acabando para algo muito melhor começar para nós dois. Nunca pense que eu desisti, simplesmente dei um tempo. Eu preciso desse tempo. E guria, apesar de toda a dor que eu to sentindo em saber que vou te deixar, saiba que quando eu olhar pro céu, lembrarei do seu sorriso quente, do teu olhar e guardarei os nossos momentos juntos. Desde o primeiro ao último beijo.

E um dia, quem sabe, a gente se encontra novamente.

Eu amo tu, Rafaela Marchiori. Eu amo tu de verdade.”

Toda aquela sensação ruim, a vontade de chorar, o grito. Tudo fez sentido ao ler aquela carta de Lucas. A letra dela meio aristocrática, meio de médico parecia ter sido escrita com dificuldade, como se ele não soubesse o que escrever. Eu fechei os olhos tentando não chorar, não sofrer e nem odiá-lo, como mencionou na carta, mas foi inevitável. Além de eu molhar a carta toda com as lágrimas eu tive uma crise de choro que me fez perder o ar. Os braços de Iasmin me rodearam. Depois senti uma mão alisando meu cabelo com carinho. Era Isabel. Chorei mais. Bem mais.

As duas sentaram sob a cama e vi que elas choravam também.

- Amiga, eu sei que tá doendo, mas talvez isso tenha sido o melhor para ambos. – Iasmin falou, me olhando compreensivamente.

- Rafa, somos as suas amigas, estamos contigo. – Eu deitei minha cabeça no ombro de Isabel. – Eu tenho tanto amor por ti, minha amiga. Não quero te ver sofrendo... E eu sei que é meio idiota dizer isso, mas as coisas vão se ajeitar.

Eu tentei sorrir, mas acabou saindo semelhante a uma careta.

- Que horas ele foi embora? – Perguntei, tentando controlar a minha voz.

- Foi ontem de manhã depois que te deixou aqui no hospital. Não sei se você se lembra, mas esse é o hospital que trouxemos o Lucas naquele incidente há alguns meses.

Visualizei a cena em que Lucas e eu viemos ao hospital quando eu o intoxiquei com bolo. E naquele tempo o meu problema com ele era mínimo, quase nada. Teve um tempo em que ele era a solução. Hoje ele é a despedida.

- Liguei para ele... Mas deu caixa postal. Eu achei que ainda o encontraria aqui em São Paulo. – Isabel murmurou, limpando o rosto. Minha mão foi para a sua barriga. E ela sorriu bem grande. Do jeito Isabel de ser. – Que saudade de vocês, gurias!

- Também sentimos saudades, Bel. – Iasmin também falou, a voz com uma mescla de emoção e tristeza. – Veio sozinha?

- Vim. Eu chamei o Lennon pra vir, mas ele não pode vir e também quando Iasmin me ligou eu dei um jeito de apressar minha viagem. Horrível ter que vir numa situação dessas, mas estou feliz de estar aqui.

- Não sei o que dizer. – Eu falei, suspirando fundo. – Eu passei meses pedindo pra ele desistir de mim. Ele então desistiu. Agora eu to me sentindo completamente perdida. – As duas abriram a boca pra falar mas eu continuei falando. – Eu o magoei esse tempo todo. Quando eu o quis e quando fugi dele. Porque vocês sabem que eu tenho tendência a magoar todo mundo que me ama, que quer me fazer feliz.

- Rafaela. - Isabel disse, num tom que a fez parecer mais velha. - Sofrer, infelizmente faz parte de qualquer relacionamento. Esse tempo que eu estou vivendo como uma mulher casada eu to tendo que aprender a abrir mão de muita coisa do que eu era quando não tinha o Lennon. A gente se perde também quando tá namorando. A gente dá um pouco do que é pra pessoa e torce pra ela cuidar bem.

- Eu me doei pra ele, mas ainda assim as coisas deram errado, Isabel. Primeiro foi o Conrado, depois aquela menina, a amiga dele.

E as lembranças aos poucos começaram me invadir.

“- É isso que você realmente quer?

- Eu quero ficar contigo.

- Eu achei que já tinha feito você desistir de mim.

- Já devia ter desistido, mas acho que no final disso tudo vai valer a pena.”

- Bah, a Pamela. Eu contei pra mãe dela o acontecido... Espero que ela dê um jeito.

- Rafa, a gente compreende a sua dor. Mas o Lucas precisava do tempo dele longe.

Balancei a cabeça, assentindo. Ele precisava disso mesmo. O momento em que nós dois acabaríamos nos odiando de verdade estava chegando. Lucas longe vai ser bom pra mim e pra ele.

Pena que nem as minhas próprias palavras conseguem me convencer.

Isabel e Iasmin continuar falando palavras positivas e por algum tempo eu consegui me sentir razoavelmente bem, mas nada saia da minha cabeça a velha sensação de abandono que me invadia. Era ridículo, claro. Lucas nunca pertenceu a mim, então não tem o menor sentido eu estar com um buraco no peito, como se tivessem me tirado a melhor coisa da minha vida.

Eu devo ter adormecido sem querer, pois quando acordei novamente estava sozinha no quarto. O que foi uma oportunidade perfeita pro fantasma das lembranças me atormentar. Fixei meus olhos no teto e como quem abre uma porta e dá livre acesso, eu deixei as lembranças virem.

“- Eu não vou pedir desculpas.

- Tu quase me matou.

- Dramático.

- TU ME INTOXICOU COM CORANTE!!!”

Dei uma risada alta e esganiçada, até que chorei novamente, lembrando do nosso primeiro beijo aqui em São Paulo e do meu poder em persuadi-lo a participar das minhas loucuras. Como foi a invasão a casa de Conrado.

“- Eu achei que isso nunca fosse acontecer.

- Eu também.”

E teve o primeiro beijo, há cerca de 3, 4 anos atrás, no Rio Grande do Sul. O Lucas era uma pessoa horrível, mas já tinha algum tipo de poder sob mim. E eu não sabia o que era.

Acho que era amor o que eu sentia.

“- Até que pra uma lésbica, tu beijas bem pra caramba.

- Eu não sou lésbica.

- É sim.”

- E então você teve mesmo a coragem de ir embora. – Murmurei, como se falasse com ele. Era ridículo, mas foi tão natural que eu comecei a falar sozinha. – Acho que você só fez isso pra me fazer admitir que eu não consigo ficar sem você.

“ - Tu é linda.

- Você é nojento”

Soltei o ar que eu prendia e me sentei na cama, cruzando as pernas e olhando para a porta.

“- Ah, você quer “parar de gostar de mim” pra poder namorar com a Olívia?

- Isso.

- E como eu posso ajudar, Lucas?

- Me faz te odiar de verdade.

- Claro. E o que mais?

- No momento só isso.”

- Você quer o seu tempo e terá o seu tempo, Lucas...

“- Escuta o que vou te dizer. Escuta bem.

- Estou ouvindo.

- Tu ainda vais ser louca por mim.

- Eu acho que não.

- Não vou apostar porque não tenho dinheiro no momento, mas tu vai.

- Eu acho que você que vai se apaixonar por mim... E tanto, a ponto de sofrer.”

- ...Mesmo que esse tempo custe o nosso relacionamento. Eu aceito a sua escolha.

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Capítulo 24 não foi escrito, então sem spoiler. Talvez haja um bônus, mas o próximo capítulo é de fato, o último.

Será que Rafaela aceita mesmo a escolha de Lucas???????

Tamiris Vitória
Enviado por Tamiris Vitória em 05/07/2014
Reeditado em 02/07/2022
Código do texto: T4870243
Classificação de conteúdo: seguro
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