ELE ME ODEIA - capítulo V

Eu estava em prantos sobre o peito de meu avô, almejava ouvir seu coração, mas estava tão silencioso. Meu tio ligou para meu pai e contou do mau ocorrido, depois passou o telefone para mim à pedido de papai.

- Pai, o senhor não vem?

Falei, em lamúria, e no outro lado da linha ele respondeu:

- Vou pedir a permissão de meu chefe e reservar o mais rápido uma passagem para aí, meu amor.

Sua voz, mesmamente, estava fraca e emitia uma vasta tristeza, no que as palavras foram curtas e o choro foi constante. Eu sabia que a vontade de meu pai estar ali naquele momento era grande, embora a viagem fosse demorada e ele poderia somente chegar quando já nada pudesse presenciar e, assim foi, ele só conseguiu chegar um dia após o velório e só restou visitar o túmulo de meu falecido avô. Também naquele mesmo dia, fomos visitar a vovó no hospício, porém, ela mal reconheceu-nos, estava delirando e nos confundia com outras pessoas que nunca conheceu.

- Mamãe, não lembra de mim, seu filho a quem tanto amou?

Falava meu pai para ela, mas, era inútil, ela não o reconhecia e dizia:

- Eu não sei quem você é, mas sei que quer me matar! Joana, tire esse monstro daqui!

- Mamãe, o que está dizendo? Sou seu filho Edgar! E esta aqui é sua neta, Iva.

Ela me fitou com desprezo e começou a apanhar pedrinhas e jogar contra nós. A auxiliar veio para contê-la e tentar acalmá-la e disse para meu pai:

- Ela tem andado muito assustada e em todo mundo que se aproxima ela atira objetos e pedras.

Olhei aflita para meu pai e ele estava sem palavras. Voltamos para casa e meu tio Ricardo havia preparado algumas iguarias, nos servimos. Um jantar silencioso, como se provássemos de nossas próprias dores. Quando todos acabaram de comer, achei o momento propício para esclarecer minhas dúvidas, perguntei:

- O senhor vai ficar por aqui, não é, pai?

- Humm... Não posso, Ivinha, meu chefe só me deu esta semana de folga, terei que voltar na segunda.

- Mas, já?

- Por que você não vem comigo? Pode conseguir um trabalho me...

- Pai! O senhor sabe que eu gosto muito daqui.

Na verdade, eu gostava mesmo era de um homem de olhos verdes e que trabalhava comigo, um homem que eu nunca poderia esquecer e não teria coragem de me afastar de seus olhos, ainda que estes somente me condenassem.

- Não se preocupe, Edgar, eu cuido de Iva. Pretendo ficar por aqui mesmo e já estou quase entrando num emprego aí.

Falou meu tio, sorrindo para mim. E disse-me ainda meu pai:

- Eu queria que você fosse para Nova York comigo. Mas, se prefere ficar...

- Já me acostumei muito por aqui, pai, estou bem aqui. Só basta que o senhor nos visite mais vezes.

Eu falei, a me espreguiçar, estava cansada e meus olhos inchados. Então, fomos dormir, eu em meu próprio quarto, meu pai no antigo quarto de meus avós e meu tio no quarto de hóspedes. Dia seguinte, levantei já pronta para aquela mesma rotina de sempre... Quando acordei totalmente e recuperei todas as lembranças adormecidas durante aquela noite de sono, lembrando-me de que não me despederia mais de meus avós com um doce beijo e nem sentiria o cheirinho gostoso das panquequas que só minha avó sabia fazer. Tão somente abracei meu pai e me despedi.

Entrei desanimada na empresa, apenas almejando cumprir mais um dia de trabalho e quem sabe conseguir olvidar todas as perdas. Surpreendentemente, Dante me abordou, mas não chegou muito perto e nem me olhou diretamente nos olhos, somente disse:

- Eu... Lamento pela morte de seu avô... Eu não sabia, foi Paloma quem me contou.

- Ele faz muita falta...

- Sinto muito.

Nada mais ele disse e deu de ombros. Eu deveria estar encantada por Dante ter vindo até mim e se demonstrar sereno, mas o luto me consumia. Depois de atender diversas ligações e resistir à inúmeras reclamações, chegou a hora de voltar para casa e esfriar a cabeça, mas, quando eu ia saindo da empresa, vi meu chefe saindo depressa do carro e vindo falar comigo. Disse:

- Por favor, Iva, estacione ligeiro meu carro, preciso correr para o banheiro!!

- Tá...

Ele me entregou as chaves e eu entrei no carro. Eu não tinha tanta habilidade em dirigir, tampouco tinha carta de habilitação, mas conseguia fazer alguma coisa. Liguei o carro e fui dando ré, no quando Dante estava saindo da empresa e gritou com a mão na cabeça:

- Não, não, não...!

Mas, dispropositamente, eu acabei amassando o capô de seu carro que estava bem atrás. Dante veio até o carro do chefe e falou, com um ar de angústia:

- Ahhh... Chefe... O senhor...

E quando ele me viu sair do carro sua ira se acendeu, à medida que eu me desculpava.

- Me desculpa, Dante, é que o chefe me pediu para estacionar o carro, então... Eu não quis bater no seu carro, eu...

Dante passou a mão no rosto e deu meia volta, depois virou-se para mim e vociferou:

- Me diz, eu te fiz algum mal quando na infânvia ou em outra vida toquei fogo na sua casa, pra você querer destruir a minha vida assim? Fala pra mim!

- Não, Dante, eu não fiz por mal!

- E agora quem vai pagar por esse prejuízo?

Ele verificava o carro amassado e eu quis me aproximar, mas notei a falta de algo...

- Oh não, as chaves do chefe...

- Bem feito. Isso é por ter destruído o meu carro.

Eu Procurava as chaves de um lado a outro e Dante andava oprimido de um lado para o outro. Gelei quando vi o chefe sair aliviado da empresa e caminhar até mim, Dante me fitou com um olhar vingativo e meu chefe disse a mim:

- Obrigado, Iva. As chaves, por favor...

Engoli a saliva a seco e ele pegou as chaves presas na alsa da minha bolsa e falou:

- Obrigado.

O chefe saiu em paz com o carro e Dante fez uma cara de intriga para mim, posto que falei:

- Diz de quanto foi o prejuízo...

Mas ele entrou no carro e bateu a porta, no que o retrovisor caiu. Agora, mais irritado, ele foi embora e eu engoli fumaça. Ao chegar em casa, senti aquela recente mudança no ambiente, nada era mais a mesma coisa.

- Tio?

Eu o procurava pela casa. Ele saiu do quarto e disse:

- Estou aqui.

Me sentei no sofá e respirei fundo, olhei para meu tio e tomei constância para perguntar-lhe:

- Tio, por acaso o senhor teria uns R$ 300 para me emprestar?

- Para te emprestar?

- É.

- E para quê?

- É para... Para fazer uma coisinha urgente. Não se preocupe, eu logo te devolvo, quer dizer, assim que eu receber o salário desse mês.

- Humm...

Ele pegou sua carteira de dinheiro e me entregou aquelas belas notas azuis.

- Espera, por acaso você não está envolvida em confusão, está?

Ele perguntou e eu respondi:

- Não, claro que não!

- Humm...

- E meu pai, onde está?

- No quarto, ao telefone. Parece que é o chefe dele.

Fui até meu pai, esperei ele encerrar a conversar, assim pude perguntar:

- Era seu chefe?

- Sim, e ele quer que eu volte sexta.

- Mas, já? O senhor disse que ficaria aqui a semana toda!

- Estamos a ponto de fechar um grande contrato e minha presença é indispensável.

Revirei os olhos e soprei um ar de decepção, meu pai segurou meu rosto e sorrindo, disse:

- Prometo que sempre que possível os visitarei, meu amor. Eu queria que você viesse comigo, mas...

- Já discutimos sobre isso, pai.

- Ok... Agora, preciso reservar uma passagem para sexta.

Continua...

Lyta Santos
Enviado por Lyta Santos em 25/10/2015
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