A presença do Cristo - Certeza de um pasto saudável

Texto reflexivo com base no Evangelho de Jesus (Mt. cap. 2)

“(...) de ti sairá um guia que há de apascentar o meu povo Israel”.

“Apascentar” é a palavra usada pelo evangelista Mateus, registrada na fala dos sacerdotes e escribas judaicos, em resposta à célebre pergunta do rei Herodes: “Onde há de nascer o Cristo?” Pergunta esta, fruto de outra, inquietante, já feita pelos magos do oriente que passavam por Jerusalém: “Onde está aquele que é nascido rei dos judeus?” A primeira, a pergunta de Herodes, expressa o fato do nascimento de Jesus com uma descrição espiritual: “O Cristo”; a segunda, dos magos, traz um tom de certeza e vem com uma descrição de valor político: “rei dos judeus”. A concepção, “O Cristo”, está inserida na ideia judaica vétero-testamentária da vinda de um Messias, alguém com função sacerdotal e, portanto, atrelada à palavra , “ungido”. Já “rei dos judeus” parece transmitir um conceito fora do campo religioso e é interessante que foi transmitido pelos magos do oriente, portanto, pessoas mais distantes do contexto judaico.

É notório que a ideia da profecia de Miquéias, aqui suscitada, aponte para a pessoa de Jesus, como um “guia” e um “pastor”. De acordo com os dicionários a palavra apascentar significa pastorear, levar ao pasto, nutrir, recrear, deleitar. Etimologicamente vem do latim pascere que traz o mesmo sentido. Apascentar: quem? como? onde? quando?

Naquele contexto, ser apascentado era tudo que Israel, como povo de Deus, precisava. Recíproca verdadeira para todos os outros povos, e para cada um de nós, vinte e um séculos depois do primeiro Natal.

É curioso que o vocábulo tenha vindo da fala dos sacerdotes. Afinal eles detinham o conhecimento teológico a respeito das profecias messiânicas. Aquele foi um discurso que denunciou a situação tanto do povo quanto da instituição sacerdotal e escribal. Essas castas não conseguiam pastorear. E, mais tarde diria o próprio Cristo a respeito das multidões que o procuravam: “eram como ovelhas que não têm pastor” (Mt.9.36). Parece mesmo que os sacerdotes da época encarnavam esta necessidade. Por outro lado, a denotação de certeza dos magos também é curiosa. Por que será que Deus permitiu que assim fosse registrado? Estariam eles satisfeitos, nutridos, apascentados, pelas informações sociais e astrológicas? Entretanto, note-se, o cerne do seu discurso é mais político que religioso. Procura-se um “rei” e não necessariamente o “Cristo”.

Hoje, também, pode-se afirmar a pesar dos muitos que se intitulam “pastores”, por vezes, a igreja aparece carente de ser apascentada, necessita de pasto saudável.

Os sacerdotes (pastores) daquela época e de agora, o povo de modo geral, as nações, os líderes, as instituições, tudo precisava e precisa ser apascentado.

Creio que os dias que se seguiram àquela experiência não são diferentes. A pós-modernidade Criou “apascentadores” de todos os tipos e para todos os gostos, situações e perfis. Há os do púlpito, do altar, do gabinete e os virtuais, há também os do campo e de todas as instâncias. Entretanto, ainda se vê uma geração insatisfeita, com nítidos sinais de fome. Será que não é por que numa grande maioria os “pastores” sinalizam “o caminho” apenas com nutrição programada para interesses particulares? Como bem profetizou Judas, o irmão de Tiago: “pastores que a si mesmo se apascentam” (Jd. 12).

É notório que nos cansemos de ver os humanos transformar a Igreja num ponto de comércio, para satisfazer a seus próprios interesses ou ao patrimônio edificado, e não às reais necessidades espirituais que dominam as ovelhas e os próprios pastores. Falta o cultivo de um pasto com nutrientes que verdadeiramente conduzam ovelhas a Cristo, à vida eterna, coisas essas bastante diferentes das preocupações materialistas que campeiam os vínculos religiosos do cristianismo pós-moderno.

Onde há de nascer o Cristo? Ou, onde Ele está? Independente do viés que tomemos para essas indagações, o fato é que Ele, o Cristo, quer nascer e estar em nós, em nossa história, em nossas atitudes em nossas reflexões, e traduzir o nosso cristianismo para além do ritualismo e dos shows em que tem se transformado a cada dia o elemento religioso.