São Paulo: Porque me mete medo!

I

Qual o teu segredo? Na baixada ou no penedo – quando noite ou cedo.

Tens prédio e vinhedo, a velocidade eu excedo – cuidado é um torpedo.

O gatilho sente o dedo; recorro no arvoredo - quieto em segredo.

Levanto a mão e sedo; a tudo concedo – na língua o gosto azedo.

São Paulo, que medo; meu Deus não sou brinquedo – para o rochedo escafedo.

II

Nem me diga; tanta gente parece formiga – eterna fadiga.

São Paulo bendiga; deles encha a barriga – a bexiga.

Não maldiga; gente que mendiga – a fome castiga.

Milhões ela abriga; também desabriga, briga – há choro e cantiga.

Gente que imigra, migra; nascida, desaparecida - lembrada e esquecida.

III

São Paulo do mundo inteiro; todo cheiro – do banheiro e bueiro.

Da seca e do aguaceiro; que barreiro, pisei no atoleiro – quero um chuveiro.

Olha o pistoleiro artilheiro; açougueiro faqueiro – o barbeiro bate no dianteiro.

O baderneiro desordeiro; bilheteiro leiloeiro – solteiro ligeiro.

O batuqueiro gaiteiro; aventureiro festeiro – violeiro e traiçoeiro.

IV

São Paulo viveiro; atrai o roqueiro o romeiro – padeiro e o pedreiro.

Não tens mar mas tem veleiro; regateiro – mosqueteiro e marinheiro.

Tem guerreiro; quadrilheiro – petroleiro e muito dinheiro.

Exporta prisioneiro; embusteiro – o fuzileiro e o guerrilheiro.

Sem roteiro e paradeiro; nada ordeiro é arteiro - eterno forasteiro.

V

São Paulo famoso “Sampa”; cedo levanta – teu hino se canta.

A todos encanta; não dói a garganta – tua manhã encanta.

A alegria é tanta; vou ao parque ver a anta – ela se espanta.

De pé se agiganta; o sol faz uma manta – do lado a governanta.

A mendiga sem janta a desencanta; grita sacrossanta – a irmã é santa.

VI

São Paulo nua na rua, um poema à rua – a rua que é tua;

Muito se atua; muito se come e jejua – a coberta e nua.

Na pele tua; marcas perpetua; mesmo que se usufrua – não há quem substitua.

Gente que avança e recua; enche e evacua – fogem da falcatrua.

O medo pontua, o barulho tumultua – minha pele nua tatua.

VII

São Paulo da dor, do amor – do suor e terror.

Do homem trabalhador; pecador – acusador e cantor.

Homem de cor; do calor sem valor – da maldição e louvor.

Do perfume o fedor; da fralda e babador – do beijador e mordedor.

Do musico que vai compor; do garoto batedor – do diretor ditador.

VIII

São Paulo da flor; do pastor enganador - do político traidor.

Do funcionário servidor; usurpador – procurador sem pudor.

Do reitor redentor; jovem sonhador sem amor – do ator criador.

Do clima afogador, da esperança animador – dos sonhos arrasador.

Tua noite é um terror, assustador sou jogador – o futuro animador.

IX

São Paulo não me amotina; velho lobo felino – olha a menina.

Meto a buzina; tomo uma creolina – lustro a botina.

Sou paulista tenho dez na disciplina; tudo combina – tomei a vacina.

Tenho a tina, na rua e na colina nada obstina – o eixo não patina.

São Paulo sem rotina; tudo se afina – rasgo a cortina

X

São Paulo do pais a matriz; tua força motriz - aqui sou aprendiz

O que te fiz? Me escreve com giz; me banha com chafariz.

Me cria cicatriz; força hostis – não foi o que eu quis.

Teu futuro sem diretriz; tua grandeza nada bendiz – o bem não prediz.

Crescestes sem raiz; São Paulo “Quo Vadis?” – me diz!

Samoel Bianeck
Enviado por Samoel Bianeck em 25/08/2006
Código do texto: T225210