Loucos a caminho

“Ensina-nos a contar nossos dias, de tal maneira que alcancemos corações sábios.” Sal 90; 12

Ninguém se torna sábio contando dias; o que temos aqui é uma linguagem poética pedindo a Deus sabedoria ao longo da vida.

Embora seja Dom Dele, essa frutifica também na árvore da experiência; sorvemos seivas de frustrações mediante raízes dos relacionamentos, firmada no solo do tempo.

Por razões lógicas, as pessoas buscam sempre o que lhes falta; ou, o que imaginam faltar. O enfermo ora por saúde; o que está em perigo, por proteção; o faminto, por pão; o desempregado, por emprego; o arrependido, por perdão; etc. Poucos oram por sabedoria. Por quê?

Porque, satisfeitos com o que sabem, não identificam sua maior carência; o maior dano desse lapso é seguir opaca a vidraça da autocrítica, do discernimento. Salomão chamou aos tais de sábios aos próprios olhos. Não alimentava expectativa alguma quanto a esses. “Tens visto o homem que é sábio aos seus próprios olhos? Pode-se esperar mais do tolo que dele.” Prov 26; 12

Na Grécia, o oráculo de Delfos dissera ser Sócrates, o mais sábio dos homens de então; ele, confrontado com tal “acusação” disse o seguinte: “Significa, segundo creio, que a sabedoria humana vale muito pouco; ou, nada; serviu-se do meu nome para dizer: O mais sábio dentre vós é aquele que reconhece, como Sócrates, que não sabe nada”.

Saber da própria ignorância não é desprezível. Embora alguns psicólogos advoguem que carecemos mais autoestima, o que precisamos desesperadamente é humildade. Até temos para suportar nossas quedas; mas aceitar o talento alheio, aí seria demais.

Os piores de nós, moral, ou intelectualmente, no fundo, se acham bons. Logo, poucos se ocupam de tentar melhorar.

Há diferença entre a “sabedoria do alto” na linguagem de Tiago, ou, “segundo Deus, oculta em mistério” na exposição de Paulo, e a humana, natural.

Alguns sofrem quando adversários da fé os adjetivam de loucos. Isso é um elogio. A Bíblia não faz diverso e expõe o motivo: “Visto como na sabedoria de Deus o mundo não O conheceu pela Sua Sabedoria, aprouve A Deus salvar os crentes pela loucura da pregação.” I Cor 1; 21

Paulo explicou em qual contexto a coisa soa a loucura: “Porque Cristo enviou-me, não para batizar, mas para evangelizar; não em sabedoria de palavras, para que a cruz de Cristo se não faça vã. Porque a palavra da cruz é loucura para os que perecem; mas, para nós, que somos salvos, é o Poder de Deus.” I Cor 1; 17 e 18

Onde a discrepância, pois? Na cruz. A renúncia das coisas como são aos meus olhos, em favor das que são propostas por Deus. Enquanto em meu ser houver resíduos que seja, de minha “sabedoria” fatalmente estarei refratário ao Conselho Divino. Aquele ao qual A Palavra Santa “ofende” ainda foge da cruz.

Desde o início, o homem olhou para a Árvore da Ciência e não se preocupou com a da Vida. Vida já tinha, pensou; queria o “salto” proposto pelo traíra. Mesmo na inocência de então, era possível agir sem noção; o primeiro casal não desperdiçou a oportunidade de novas experiências.

Um mal que nos assola é olharmos mais para o que ansiamos que para o que temos. Quantos dizem em dado momento: Eu era feliz e não sabia. Uma dupla confissão; de ignorância e erro de alvo, ao buscar o que não carecia e desvalorizar o que tinha.

Sabedoria seria, tão somente manter-se em plena comunhão com O Criador, dando-lhe ouvidos. A desobediência fez nascer o ego; rival do Eterno. Aí negar a esse, em prol do Evangelho é a “loucura” que nos resta, caso a Salvação nos interesse.

Ao Santo interessa muito, haja visto o preço inefável que pagou, dado Seu Ser Bendito, que É Amor.

Contudo, nem me esforcei em provar o argumento que são pouquíssimos que buscam sabedoria, mesmo carecendo desesperadamente; afinal, a Bíblia vai além; ela apresenta a Sabedoria personificada buscando adeptos, seguidores ante uma geração de surdos. “A sabedoria clama lá fora; pelas ruas levanta sua voz. Nas esquinas movimentadas ela brada; nas entradas das portas e nas cidades profere suas palavras: Até quando, ó simples, amareis a simplicidade? Vós escarnecedores, desejareis o escárnio? E vós insensatos, odiareis o conhecimento?” Prov 1; 20 a 22

A consequência de rejeitá-la é grave: “Então clamarão a Mim, mas Eu não responderei; de madrugada Me buscarão, porém não Me acharão.” Prov 1; 28

Entretanto, há o outro lado da moeda: “Mas o que Me der ouvidos habitará em segurança, estará livre do temor do mal.” V 33

O nosso tempo passará, necessariamente; nossa aquisição de sabedoria é mera possibilidade, que só existe, à sombra da cruz.