O ADEUS DE UM CÃO

Sinto a dor percorrer todo meu corpo. Estou caído no chão, tremendo e mesmo assim tenho forças para me levantar. Aos poucos, vou me arrastando até a porta e vejo ele desferir um tapa no rosto da mulher que tanto me amou.

Não consigo conter meu lamento e solto um ganido.

Não foi sempre assim. Éramos uma família feliz até ele ser consumido pelo álcool.

Desde então, as surras eram constantes.

CLAP!!

Mais um tapa e ela caiu no chão ao meu lado. Por várias vezes ela quis me levar embora e viver comigo. Mas como?

Sua família estava na Bahia, ela não tinha dinheiro para nos levar pra lá. Dependíamos daquele que um dia nos deu amor e carinho.

Eu protestei. Caído no chão do jeito que estava, rastejei como pode até a sua perna e o mordi. Foi meu último ato de defesa em prol daquela mulher.

Após isso uma saraivada de chutes e socos atingiu meu indefeso corpo. Senti a dor me dilacerar e mesmo em meu coração eu ainda tinha amor a oferecer.

Antes de me entregar a morte, eu pude ver minha dona se erguer com a faca atrás dele. O golpe foi preciso e ele enfim caiu de joelhos com medo em seu olhar. O medo e a certeza de que pagaria por todos seus pecados cometidos até ali.

Ignorando sua agonia, minha dona correu até mim e me abraçou.

Senti suas lágrimas quentes molharem meu rosto e suas mãos carinhosas tocarem minha cabeça. Em gratidão, lambi seus braços, ganindo e sentindo a vida que agora me deixava.

E foi assim que parti. Em meio a dor e prantos, nos braços da mulher que tanto amei e cuidou de mim como filho nunca tivera.

Quanto ao meu dono, peço que Deus tenha piedade dele pois nos momentos mais difíceis de sua vida, eu estive com ele. Apesar das surras diárias, aguentei até aonde consegui, e nunca entendi porque todo meu carinho foi retribuido assim. Agradeço a Deus por conceder liberdade a minha dona que agora chora sobre meu pequeno cadáver.

O ato final se desenrola. Com a pá em mãos é aberta uma pequena cova. Em meio a um lençol a terra cai sobre minhas costas. As cortinas se fecham, as luzes se apagam, e esse é o triste fim da minha história.

Bonilha
Enviado por Bonilha em 15/06/2012
Reeditado em 15/06/2012
Código do texto: T3725265
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