_________________O truque

Na volta da padaria deu por falta da bolsinha de mão:  certamente a tinha perdido no trajeto das três quadras que acabara de fazer. Não se assustou, nem ficou ansiosa. Afinal, quem iria se interessar por objeto tão gasto, surrado, com zíper estragado? Voltou calmamente pelo caminho que fizera e, para sua alegria, na segunda quadra avistou seu pertence tranquilamente repousando sobre um paralelepípedo da rua.

Viu e ouviu de perto suas suposições se confirmarem: um moleque arrumadinho, com cara de quem ia pra missa, que seguia pela mão da mãe, chutou a bolsinha para um lado sem qualquer pudor, peripécia que lhe valeu um safanão e a advertência de sua genitora:
"Quantas vezes já te falei pra parar de chutar lixo, Antenor?!”.

Toda contente, ela abaixou-se e  apanhou a bolsinha. Só pra conferir checou o interior: lá estava, ainda intacto, em notas novinhas de cem, o pagamento da aposentadoria retirado na casa lotérica. Sorriu satisfeita. Aquela não era a primeira vez que acontecia. O truque da bolsinha-lixo era infalível! Rumou feliz para casa: podia até ter se tornado uma velhinha meio lerda — como os filhos diziam — mas era esperta pra chuchu, isso ninguém podia negar...