Neblina e a Ninja capítulo 11: A torre de energia

 

A TORRE DE ENERGIA

 

(No capítulo anterior a cidade subterrânea de Nova Brasília sofreu um audacioso raide dos piratas, que conseguiram tomar uma estação de tv para ameaçar as autoridades. Quando os policiais organizavam o cerco o primeiro-ministro resolveu atacar com sua própria guarda pessoal e com armas pesadas, tumultuando tudo. Neblina penetrou na emissora e resgatou a repórter que havia sido feito prisioneira, mas os criminosos com sua líder, a Ninja, conseguiu escapar.)

 

Os dias que se seguiram foram terríveis e confusos. A morte desnecessária de seis funcionários da tv, nos desabamentos ocorridos com o bombardeio, provocaram uma série crise governamental agravada com o escape da Ninja e todos os seus asseclas, incólumes. Em meio a tudo isso apenas avultava a figura de Neblina como a salvadora da popularíssima Iracema Guaracy.

Para piorar tudo, o único Bandido Negro prisioneiro — o que Neblina havia capturado — escapou inexplicavelmente da cadeia, o que fazia pensar em corrupção no organismo policial. A crise se agravou e na sexta-feira, sete de maio, Darci renunciou e foi substituído às pressas. Eleições porém temporariamente não foram marcadas, para que a quadrilha disso não se aproveitasse.

As ameaças da Ninja, por mirabolantes que parecessem, estavam se concretizando. O governo caíra; o país estava desestabilizado.

Uma coisa preocupava Neblina sobremaneira: a fuga dos bandidos dera-se por subterrâneos, isto é, os subterrâneos dos subterrâneos. Tudo aquilo que existe em baixo das cidades, mesmo cidades subterrâneas.

 

 

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Em batidas no exterior da cidade a polícia conseguiu apenas matar as três panteras negras, numa operação comandada por Barracuda, que se utilizou de cachorros para acuarem os felinos. Esse fato causou considerável cólera em Neblina:

— Diga a esse imbecil que nós estamos em guerra com seres humanos, não com bichos.

Madeira, que parecia cansado e envelhecido, desviou o assunto:

— Eu também acho, Neblina, só que agora temos coisa mais importante a tratar.

— Deveras?

— Sim. “Z” nos convocou para uma conferência.

— Nós dois? E quem mais?

— O Secretário de Segurança.

— E a que horas será?

— Hoje à noite — às oito horas. Espero que não falte.

 

 

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Na penumbra da sala, o misterioso “Z”, assim que teve os três reunidos à sua frente, começou sem preâmbulos:

— O caso é o seguinte. Tendo em vista o agravamento da situação e o colapso em que nos encontramos, determinei, de comum acordo com o Ministro da Justiça, duas providências que serão tomadas de imediato.

“Uma delas é que a Torre Energética terá de agora em diante uma guarda permanente. Sim, eu sei que já tem (e aqui “Z” atalhou uma intervenção de Adolfo) mas eu a quero lá em cima, no terraço, junto à caixa de energia. Isso terá que ser feito.

Adolfo objetou: — Eu posso fazer isso, senhor. Mas terá de haver um fluxo constante nas vias de acesso e isso pode justamente por em risco a segurança da caixa...

— Seu argumento é ridículo. O abandono da caixa lá em cima é um risco maior. Suponha que cheguem lá por via aérea...

— Mas senhor “Z”, é proibida a fabricação de aviões!

“Z” riu-se, um riso escarninho.

— Não estamos lidando com escoteiros, Adolfo. Criminosos fazem suas próprias leis...

Madeira tentou contrapor: — As dificuldades técnicas...

— Não conto com isso. Que me dizem de um balão? De qualquer forma, nós vamos fazer isso. Terá de haver guarda permanente na sala superior.

— Bem, e qual é a outra providência? — indagou Adolfo.

— Neblina irá ver a caixa.

— O que? Só isso?

A decepção do secretário era evidente.

— Você me ouviu. Estamos tentando defender o maior bem da cidade. É importante que Neblina tenha acesso ao local onde estão os cristais de energia, que conheça a topografia do lugar. Neblina, senhor Secretário, está na linha de frente da defesa desta cidade e deste país.

Ana sentiu-se tentada a uma manifestação de modéstia, mas absteve-se de fazê-la. Sabia que Adolfo não a apreciava e era importante que “Z” a prestigiasse.

 

 

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Imaginem um imenso farol perdendo-se nas alturas; só que não é um farol, embora tenha quase a forma de um. Como imensa Torre Eiffel de concreto armado, curvando-se lentamente em concavidade, a Torre Energética projetava-se até além da cúpula de cobertura, que protegia a parte central de Nova Brasília, pois as imediações já se encontravam sob camadas naturais reforçadas por grandes pilares.

Em volta da base da torre existia um vagão circular dela totalmente separado mas que servia de alojamento aos soldados da Guarda Nacional (o órgão que sucedera ao exército e que era apenas uma polícia sofisticada) que vigiavam em turnos contínuos.

Existiam duas entradas para o vagão; dentro, duas portas comunicavam para o pátio de cimento que rodeava a torre. Alguns cachorros dálmatas e pastores komondor lá se encontravam, beneficiando-se de canteiros de terra.

Neblina acompanhava o Inspetor Madeira, que levara também Tadeu (um policial alto, negro e muito magro), Letícia (policial que já fazia parte do fã-clube de Neblina) e os inspetores Ruiz e Empédocles, além do detetive Robson.

Adolfo não quisera participar da amostragem da torre a Neblina. Decididamente não apreciava a mascarada.

Terêncio Madeira tinha um certo orgulho das medidas de segurança do local, algumas das quais ele ajudara a desenvolver. Mostrara a Ana as seteiras de periscópio eletrônico, que apareciam em toda a circunferência do vagão.

— Como você pode constatar, quem estiver em volta do vagão poderá sempre ser visto e alvejado.

— E se não puder ser visto?

— Não me diga, Neblina, que você acredita naquelas lendas bobas de que ninjas podem se tornar invisíveis!

— Não, eu não acredito. Estou me referindo ao teto do vagão, que é muito plano para o meu gosto.

— Ora, ninguém pode subir aí sem ser percebido!

— Isso é o que você pensa. Bem... que me diz de irmos ao pátio?

— Vamos.

Quando saíram ao pátio Letícia observou:

— Você crê, Neblina, que essa defesa é fraca?

— Acho perfeitamente possível que os bandidos cheguem ao pátio. Não me pergunte como. Devem existir dúzias de respostas.

Empédocles, fiado na sabedoria dos seus sessenta anos, deu de ombros:

— Vamos, vamos, guria. Não fantasiemos! Os Bandidos Negros podem ser terríveis, mas isso não quer dizer que tenham poderes sobrenaturais!

— Não disse isso. Puxa, vocês têm cães lindos aqui!

— Sim, mas cuidado com eles!

— Se são cães policiais, Robson, não me atacarão.

Tadeu explicou:

— Um bom cão policial só ataca quando recebe ordem ou diante de atitude hostil. Conheço bem esses bichos. Você não corre perigo algum.

Sem nenhum medo, Neblina afagou alguns animais e fitou o teto do vagão:

— De lá os cães podem ser facilmente alvejados.

Madeira impacientou-se;

— Peraí, como é que vão chegar...

— Existem alarmas nesse teto?

— Não existem — Madeira estava decididamente contrariado. Dera àquelas duas palavras uma entonação de: “E precisa?”

Neblina voltou-se para a torre.

— Bem, vamos vê-la, por favor.

A secura de Neblina indicava claramente a sua insatisfação. Madeira chegou diante de uma porta de vidro inquebrável e digitou um código no teclado eletrônico ao lado. A porta se abriu, entrando na parede, e Neblina, sem acreditar no que via, dirigiu-se mais uma vez ao policial:

— Inspetor, inspetor... isso é tudo?

— O código é mudado com frequência, se isso a consola.

Neblina entrou, visivelmente contrariada. Um oficial da Guarda Nacional cumprimentou-os. O salão era como uma rosca cujo centro continha um elevador gigante.

Grandes dutos negros podiam ser vistos implantados na parede do salão: por eles fluía a energia vinda da superfície e de muito além, milhões de milhas além, do Sol. Ana pôs-se a examinar tudo com muita atenção e minúcia, se bem que não houvesse muita coisa para ver. Existia, sim, um painel de monitoração da aparelhagem situada no alto da torre. No momento tudo estava em perfeita ordem.

Neblina aproximou-se do cidadão com físico e vestuário de “Professor Pardal” que estava sentado junto ao painel e a olhava com desconfiança;

Madeira fez a apresentação: — Este é o Professor Quentin Stocker, um dos monitoradores.

Cumprimentaram-se e o Prof. Quentin apressou-se a explicar:

— Eu não sou brasileiro, mas norte-americano. Trabalho aqui há três anos.

— E quantos são os técnicos que entendem esse painel?

— Há mais três.

— Só?

— Quanto menos gente melhor, minha senhora.

— Não sei não... vocês fazem quatro turnos ou o que?

— Não há necessidade. Isto aqui funciona automaticamente. Um de nós vem aqui uma vez por dia para ver se está tudo em ordem...

— Ah, sim. Eu já devia esperar por isso.

A atitude de Neblina estava deixando o pessoal meio irritado, mas a figurinha de máscara não se deu por achada e voltou-se para Madeira:

— Vamos lá em cima?

— Sim, claro... para isso viemos aqui.

— São quantos elevadores?

— Apenas um, é claro.

— Como, só um? Não é possível! E se ele escangalhar?

— Ué, nós consertamos.

— Inspetor Madeira, o senhor se dá conta de estar me dizendo que o acesso ao alto da torre é feito por um único elevador?

O “Professor Pardal” (perdão, Quentin), ouvindo tudo isso, pulou do painel e teve um acesso na frente da mascarada:

— Escute, dona fantasiada: isto aqui é um local de segurança máxima. Que é que a senhora queria? Que a torre estivesse no roteiro turístico, com guias e tudo? Ora, se proibimos até os aviões para que ela não corra perigo...

— Mas, homem, já ouviu falar na história do aprendiz de feiticeiro?

— Hein?

A estranha resposta de Neblina deixou o temperamental cientista embasbacado. A moça deu-lhe as costas e procurou o elevador. Letícia segredou-lhe:

— Neblina, que há com você? Ninguém está gostando...

— Nem eu tampouco. E nem “Z” gostaria, creio. Procure compreender... tem que haver alternativas de acesso ao alto da torre1 Porque se acontecer alguma coisa...

— Ora! O que poderá acontecer, que a gente não possa dar jeito?

— Devem ter falado isso a propósito do Titanic... bem, Deus queira que eu esteja enganada.

 

 

 

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— Inspetor, se esse é o único elevador por que razão o secretário falou em “vias de acesso”, no plural?

— É que existe uma escada de caracol... que não é mais usada e fica lacrada. Em caso de necessidade...

— Oh, sim! São só 300 metros mais a curvatura, ou seja...

Madeira conteve-se. O sarcasmo da garota o incomodava.

O elevador era muito espaçoso e — justiça seja feita — moderníssimo. Seu painel de segurança, totalmente informatizado, agradou Neblina. Seu conhecimento de causa era grande, e seu exame resultou satisfatório. A tensão relaxou um pouco: pelo menos alguma coisa agradara à moça de capa e máscara.

 

 

imagem pinterest

 

No próximo episódio, Neblina completa a vistoria da Torre Energética, ficando pouco satisfeita com o que viu.

Para a vigilante mascarada, a torre não está satisfatoriamente protegida.