Se tem uma coisa que eu odeio é ter de desviar, enquanto ando, de pessoas morimbundas que parecem não ter nada mais importante para fazer do que ficar ralentando seu passos, atrasando nossas vidas, e, pior, nos fazendo sentir os mais apressados e mal-educados seres do universo.
    Veja só esse aí. Lento quase parando. Curvado, doente, e ainda querendo parar para conversar com alguém que nem pensa em dar-lhe atenção. Veja esse outro. Enquanto tento desviar dele, parece que me vê com seu olho cego e corre na mesma direção me obrigando a quase sair da calçada.
    Já chega! Basta! Não tenho de aturar isso. O próximo vou empurrar. Estou atrasado, tenho meu compromissos. Esse grupo de jovens senhoras será minha cobaia. Vou passar firme. Sem molengar. E...toma...uh...ah...!!!
    Vejo uma jovem senhora com um rosto bem familiar, deformado pelo medo, entregando sua carteira, pedindo de maneira quase desesperada:" -Por favor, fique com tudo, só não me machuque!"
    Essa jovem senhora vestia preto, talvez por luto. Seu calçado, devido ao tombo, voou à beira da rua. Seus olhos eram como o de uma preza daquelas que vemos no canal por assinatura, na boca de famintos leões. O leão era eu. Com a força do impacto, sua saia preta levantou-se, despindo um corpo magro com pernas fracas e impotentes. O rosto enrugado foi instantaneamente coberto por um lençol de lágrimas ardentes, que parecia ser o único mecanismo de defesa daquela pobre e jovem senhora. Digo pobre, pois agora que pude ver, a roupa já é bem surrada, rasgada e desbotada.
    Nessa fração de segundos ainda não havia avistado a carteira que voava longe, que foi recuparada por um transeunte. Que me entregou e disse: "-Aqui está a carteira de sua mãe."
    Ela parecia irritado e inconformado com algo que viu. Seu semblante era de indignação e discórdia.
    Respondi, inconscientemente:"-Ela não é minha mãe."
    Ele concluiu saindo: "-Mas poderia ser."
Prima
Enviado por Prima em 18/08/2008
Reeditado em 07/10/2008
Código do texto: T1134330
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