AS PRIVAÇÕES DO MUNDO

As privações devem ser daqueles assuntos, que a maior parte das pessoas se esquiva, se calhar porque viven-nas tão bem que falar delas é excusado, se calhar pela falta de tempo ou até mesmo coragem, pois elas são sempre encaradas como algo maléfico e nefasto, neste mundo, em que possuir sem restrições e consumir sem deliberações passam a ser as divisas mestras.

A incapacidade e inabilidade do ser humano em compreender os desígnios máximos da inteligência suprema que todos reverenciamos pelo nome de Deus, é tão absurda que levan-nos todos os dias ao desespero desnecessário e á angustia. As mudanças da sociedade, uma sociedade cada vez mas ditatorial, consubstanciada em valores “temporários perenes” e leis de separação e humilhação, obrigam ao “homem moderno” esquecer-se daqueles desígnios para sí mais “insignificantes” da vida, como é o caso, do tema que abordo agora. A competição assente entre os homens e o desejo do poder, um poder cada vez mais inreal e intangível que o ser humano busca naturalmente, podem ser substituídos pela reflexão, a reflexão ainda que momentânea e curta, dos problemas que afectam o nosso mundo e Angola por extensão; sim, porque não estamos dissociados desta realidade.

Temos visto no nosso país, todos os dias, os apelos silenciosos daqueles que “nada” tem – o nada aqui, passa a significar a apetência ou o desejo do material para a sobrevivência, pois de contrário, o nada não poderia ser escrito por mim, porque o nada, mesmo quando multiplicado por um milhão, o resultado é sempre nada, portanto, do nada, nem mesmo o próprio nada pode nascer, do nada, nada subsiste – a angústia dos necessitados; necessitados que são criações nossas, e porque serão criações nossas?! Porque quando preferimos comprar o último modelo do Mercedes, do BMW ou da Volkswagem, porque quando preferimos os “ambientes de regressão” e viramos a cara ás necessidades do próximo, ainda que necessáriamente não sejam materiais, estamos a criar cada vez mais necessitados e sobrepujar a nossa ignorância emocional, a falta de amor próprio. Estes podem representar alguns exemplos pontuais, da nossa falta de amor próprio, da nossa incapacidade em ver a raiz e a origem da nossa tragédia. Mas a verdade mesmo, é que algumas destas pessoas, ou melhor, alguns de nós, tem a consciência do que se passa a sua volta e o cerca, alguns de nós tem as origens destes efeitos bem guardados dentro das suas mentes, assumi-las significará para a nossa sociedade a renúncia do próprio homem em ser correta e eticamente bem visto; mas ignoramos, porque o próximo passou a ser da responsabilidade dos seus progenitores, se os tiver, se os não tiver, que seja responsabilidade do “ Deus Governo” que por sí só é tão minúsculo tal a palavra que o descreve e na maior parte das vezes implacavelmente absoleta.

Não é minha intenção credenciar incompetência aos outros, nem a mim, muito menos maldizer daqueles que honesta ou desonestamente, a ferros ou á punhos possuem o que têm, nem seria justo dar á estas folhas de papel tal destinação que fosse a blasfémia e a verborreia. Minha intenção, é estabelecer uma plataforma de entendimento e desimpedimento comum, ainda que seja momentânea em algumas linhas, ainda que seja de poucos minutos. A intenção é realmente fazer com que NÓS, pensemos no assunto , não compelidos ou agrilhoados pelos valores pré-estabelecidos, mas pela nossa imaginação, que não deve ser substimada.

Todos estamos propensos ás privações, uns mais que os outros teoricamente, uns mais cedo do que outros, independentemente do seu grau ou intensidade, o nome nunca muda, é PRIVAÇÃO, de sentido ou de força, mas é PRIVAÇÃO. Ricos, pobres, negros, brancos, mestiços, amarelos etc, sofrem as privações da mesma maneira, ainda que o homem na sua sabedoria impírica, queira tudo quantificar e qualificar com o seu sentido crítico desnaturado e surreal.

Poder-se-ia argumentar em primeira instância que as causas das nossas privações são basicamente de carácter pessoal. E porque? Porque as tendências naturais que todos nascemos, aliadas, á aquelas tendencias qe vamos adquirindo ao longo da nossa vida como resultado dos nossos esforços desnecessários e em vão em sermos sujetos e nao predicados nesta sintática que é a vida, determinam a gradação de tais privações, falo aqui dos desejos, dos sonhos desmensurados, das paixões compulsivas e expontâneas, nao retirando a força de vontade do ser humano, que pode operar milagres e muito menos potenciar as suas vontades para o bem.

O elo de ligação que estabelecemos com um determinado objecto ou pessoa, por vezes é tão forte, que é difícil reconhecer como verdadeiro, algo além daquilo que realmente vivenciamos, tocamos e são acessíveis aos nossos sentidos limitados. Consequentemente, com o decorrer do tempo, o sentimento de posse se agigante e tome proporções colossais e anti-pessoais. A não observação do mesmo sentimento, não permite que saibamos como sobreviver e em muitos casos viver longe deste objecto ou pessoa. Assim se processa, porque realmente poucos somos, os que realmente aprenderam a educar e refrear o carácter dos seus desejos, logo, desespero, angústica, ausencia de opções e frustrações manifestam-se mais rápido que o processo de circulação do sangue nas veias e artérias do corpo.

O entendimento das nossas privações deve partir do humilde principio de que nada somos ou representamos, mais insignificantes então nos tornamos quando não dividimos as privações alheias, actuando assim indirectamente sobre as nossas, mitigando o nosso sofrimento, diminuindo a angustia, subtraindo por completo as frustrações. O leitor, poderá assumir neste último parágrafo, que eu apelo ao conformismo, mas devemos entender que conformismo é diametralmente diferente de comodismo, uma pessoa conformada, compreendeu depois de luta com todas as suas forças e todos os campos de batalha, que a melhor opção é render-se a evidência da superioridade alheia; por anologia, uma pessoa comodista, nunca conheceu nenhum campo de batalha, muito menos sabe o que significa perder ou ganhar; o conformismo emerge da resistência, o comodismo da inércia e da falta de atrito.

O simples acto de abstração, daquelas coisas triviais da vida, constitui o ponto de partida inicial para o alcançe daquela paz que todos desejamos, mas que poucos conhecem a sua origem. Ao longo da vida, por vezes tudo quanto precisamos é uma códea de pão, mas o próximo, devemos entender que o próximo precisa sempre de mais, mais do que nós, e atendendo que todos somos próximos uns dos outros, criaremos um processo de ajuda mútua, em que sempre teremos para suprir as nossas privações, até as privações deixarem de semanticamente significar ausência e passarem a significar obrigação e dever de ao próximo estender a mão. Estes desideratos, não podem ser alcançados se não for pela ajuda desinteressada, do alto compromisso e do altruísmo.

Torna-se dificil precisar quanto tempo tal processo pode levar, pelos métodos comuns e metafísicos humanos, num mundo cada dia mais implacável, mas devemos assim compreender que possuímos capacidades e tendência positiva para fazer o bem, e se acreditarmos que sim, atrairemos mais ideais nobres e quanto a nossa recompensa; esta eu penso que ninguém haveria de desejar, se antes não escrevesse todos os seus defeitos numa folha de papel, queimasse e depois jurava mudar; a nossa recompensa para a cura das privações, é apenas o anonimato e o nosso poder, a de compreender as privações do nosso Cosmos.

Cidade de Benguela, 15 de Janeiro de 2006

DerAlter
Enviado por DerAlter em 10/11/2006
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