Dominó da vida

Interessam-me as coisas que só existiram no pensamento, ou que até tenham tomado forma, mas tiveram um fim precoce.

Interessa-me a palavra que não foi dita. Talvez um cumprimento ao desconhecido. Uma verdade revelada. Um pedido de perdão. Um pedido de ajuda. Um “eu te amo”. Um pedido de desculpa. Um pedido de casamento. Ou quem sabe um pedido de divórcio.

Interessa-me o gesto contido. O abraço insinuado, mas que não passou disso. O aceno de mão contido ainda no comando cerebral. A mão que tinha intenção de se estender num aperto caloroso, mas reteve-se diante da apatia do outro. O beijo disparado em direção aos lábios que foi parar num lado do rosto pela rejeição sutil. O olhar ávido por contato, que se desviou. O primeiro passo na direção que mudava tudo, e não teve segundo.

Interessam-me os planos preteridos ou desistidos. Fazer aquela faculdade. Deixar de fumar. Ter outro filho. Comprar aquela casa. Ligar praquela pessoa. Fazer aquela viagem. Dizer não. Dizer sim. Não voltar lá mais. Fazer aquela surpresa. Recomeçar. Bancar o doido e jogar tudo pra o ar.

Interessa-me o sentimento que deixou de existir por ter sido sufocado. O amor. A culpa. O ódio. O remorso. A alegria. A tristeza. O ciúme. A covardia. A coragem. A confiança. A sensibilidade. A esperança.

Tudo isso me interessa muito. Cada coisa em suas peculiaridades. Fico a pensar o que cada um desses detalhes causou no desencadear das vidas que a eles se seguiram. Uma palavra não dita, um gesto contigo, um plano abandonado, um sentimento reprimido, tudo isso tem a capacidade de alterar o acontecimento seguinte. A peça do dominó que você usa muda todo o rumo do jogo.

Entende? O que deixamos de fazer ou sentir pode ser nossa salvação, mas também pode ser nosso fim.

Jordana Sousa
Enviado por Jordana Sousa em 08/07/2011
Código do texto: T3082933