[Do que me Comove]

Lugar ermo, sombrio, som gutural, cavo

de um córrego que escapa, por entre

barrancos altos, íngremes, inóspitos,

de uma grota escura e funda.

A água estreita-se em um valo cravado

de inúmeras árvores sedentas,

e mais abaixo, coalha-se de folhas podres

que a corredeira rápida revolve.

Eu procuro esse lugar tantas vezes visto,

tantas vezes visitados em outras horas mortas...

É destas águas que bebemos eu e o meu cavalo;

é destas águas que eu bebia ali, bem junto

aos focinhos dos arfantes bois de guia.

É para provar que sou sublime,

para demonstrar o meu amor

pelas causas dos homens,

para provar o quanto me comovem,

para provar o quanto valorizo a sociabilidade,

que eu procuro essas águas ermas...

Águas que parecem verter não da terra, mas do inferno

[se mais fundo, melhor, pois segundo Dante, o inferno é cônico].

Que eu desça aos infernos,

ou que os infernos venham até mim

cantarolando maldições nestas águas —

tanto faz, pois repito, tudo tanto faz!

Se não me comovem as lágrimas,

se não me comovem o riso, a dor,

se eu prefiro a face dura,

o que é que me comove?

Se me atrai, me incomoda;

e se me incomoda; me atrai:

pago para ver — truco!

[Desterro, 26 de novembro de 2011]

Carlos Rodolfo Stopa
Enviado por Carlos Rodolfo Stopa em 26/11/2011
Reeditado em 09/12/2011
Código do texto: T3357744
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2011. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.