Sob um manto de quaresmeiras
Vi quando ele desceu a serra, entrou na folia e viajou a noite inteira na fumaça da ilusão. Vi quando adormeceu durante o dia naquele canto sombrio para que a luz não lhe desvelasse o outro lado da face. Vi quando se foi o último som da batucada e deixou o silêncio na calçada. Vi quando se desnudou e lavou cada pecado na água salgada. Vi quando a onda o encobriu e a espuma se espargiu. Vi a silhueta de sua alma lavada sob um manto de quaresmeiras. Vi a serra pintada de roxo, paramento de padre e quarenta dias de escuta da ‘Palavra’ envolvendo profunda reflexão. Vi e senti sua dor enquanto rolava na ribanceira forrada de quaresmeiras e pedia perdão. Rolava e pedia perdão. E não parava de rolar... Vi quando braços de ramos verdes acolheram com doçura seu corpo inanimado. Vi como foi carregado e lavado em límpidas águas vertentes.