Para que viver?



Um inteligente Amigo me fez, por escrito, esta pergunta.
Na certeza de que não possuo uma perfeita resposta, mesmo assim ouso colocar em míseras palavras e sentenças um pouco do que penso e do como convivo com esta questão.
 
Não crendo em destino, desígnios, sistemas ou planos superiores, entendo que esta pergunta é uma das mais importantes a serem abordadas de forma séria, e para a qual temos a obrigação de ousar responde-la, posto que desta resposta, que pode mudar ao longo do tempo, dependerá a forma como psicologicamente e fisicamente abordaremos nossa forma de viver. Isto posto, não significa que eu possua uma resposta completa, pois a estou completando ao longo da realização de meu presente, ou que possa ser uma resposta universalmente aceita ou mesmo que reflita ela alguma verdade absoluta.
 
Dado que a natureza nos proveu além de alguma inteligência, de uma capacidade de questionamento ampla, e de auto questionamento infinito, nos dando alguma autoconsciência de que temos consciência, entendo existencialmente que exista uma coleção de questões que pertencem a uma classe especial de perguntas. Estas questões são essenciais para a nossa compreensão do porque existe algo e do porque dentro deste algo existimos nós, cada um dos múltiplos EUs que me compõem e que compõem a todos os seres humanos. Cada uma destas perguntas merece ser “encarada” de frente, e para elas necessitamos a ousadia de pensar, e pensar, e pensar, e com alguma resposta aparente devemos ter a coragem de duvidar dela e continuar pensando...
 
Destas perguntas, entendo que a mais forte de todas, da qual todas as outras derivarão, simplesmente porque virá “antes” de todas as outras, e da própria vida, sendo assim para mim “A Questão”, é:  “Porque existe algo, ao invés de simplesmente “existir” o nada absoluto?” Se algo existe, e como do nada não deveria surgir alguma coisa, a pergunta que mais me incomoda é porque existe algo ao invés do nada?
 
Uma vez que algo exista, ou não estaríamos aqui gastando tempo e esforço nesta questão, e limitando esta existência ao natural, a matéria, a energia, ao espaço, e mesmo para aqueles que creem na existência de algo mais, a pergunta continua sendo válida: Porque existe nosso universo? Porque existe a matéria e a Energia? Porque existe o espaço? Porque existe o espaço/tempo? Porque existiriam outros universos? Porque existiriam outras dimensões? Porque existiriam, também, o sobrenatural? Porque existiriam espíritos ou almas ou forças astrais? Porque existiria um deus? Porque existiria algo e não apenas o nada absoluto? Para estas perguntas eu não possuo resposta alguma, por mais trivial ou complexa que pudessem ser. Não consigo sequer imaginar uma abordagem séria e crítica para esta questão. Creio mesmo que jamais existirá uma resposta completa para ela. Podemos ir respondendo do agora para o antes, do presente para o passado mais longínquo, mas chegaremos, entendo eu, sempre, a uma nova barreira no conhecimento, e a nossa resposta volta a ficar incompleta.
 
Posso explicar o Big-Bang. Posso até ousar explicar o que existia “antes” do big-bang, mas logo, de novo, esbarrarei em não ter a resposta para o porquê existe algo antes do big-bang, ao invés do nada, o que impossibilitaria por si só o próprio big-bang.
 
Saindo desta pergunta, a próxima questão de vital importância é: Para que viver? Terá a vida uma razão própria?
Eu pessoalmente não creio em nenhuma razão própria ou especial para ter nascido. Sou, e entendo que todos somos, filhos de um acaso. A vida surgiu de forma aleatória decorrente da complexidade natural, e a evolução, em todas as suas facetas fez o resto, nos trouxe até aqui, sem planos, sem direcionamento e sem motivos. Meu nascimento é fruto de uma quase infinita sucessão de interações e casualidades, sendo um evento de enorme improbabilidade, não havendo nenhum motivo próprio para minha existência. Isto por si só deveria ser suficiente para refrear qualquer vaidade, orgulho ou presunção de superioridade, tanto em relação aos demais irmãos em espécie, mas também quanto aos demais seres vivos. Tenho um nicho ecológico próprio e alguns “qualias” que me definem como Homo Sapiens, mas no fundo sou apenas mais um ser vivo, com prazo de validade curto, a nascer sobre este planeta, e para o qual a morte é o destino certo e garantido. Minha existência, assim, é banal, mas ao mesmo tempo, decorrente de ser uma tão rara e única realização, minha existência deveria me fazer humilde e apaixonado pelo viver.
 
Uma vez que nasci, devo, pela própria raridade de ter existido, Amar a vida, e por pessoalidade devo construí-la em AMOR, e pela impessoalidade devo realiza-la como um ser social, em doação e em compromisso com os demais irmãos e em comprometimento com os demais seres vivos.
 
Uma vez que minha vida é única, e que a morte nos espreita a cada instante, debaixo de nossos pés, dentro de nossa própria existência, sendo nossa única certeza, devo construir meu viver da melhor forma possível. Devo Amar o viver, devo Amar a capacidade que tenho de pensar, de agir, de raciocinar, de construir, de transformar, de ajudar, de revolucionar, de ser útil, de aprender, de me encontrar e de me fazer humano para fazer de minha vida algo benéfico para mim e para os outros.
 
Para que viver?
Ouso responder que para glorificar a raridade de minha existência, não uma glorificação mística ou sobrenatural, mas uma glorificação natural, daquela de dignifica a essência natural que me compõe. Devo aproveitar esta oportunidade, esta única oportunidade, passageira como ela, sem direito a retorno, continuação ou segunda época, para aproveitando desta única experiência do meu viver, realizar uma vida digna, humanamente ética, socialmente humana e naturalmente equilibrada, e assim, quem sabe até servir de exemplo para alguém.
 
Independente de meu enorme AMOR pela vida, não somente pela sua realização, mas muito também pela essência maior da vida biológica, e também independente do meu AMOR pelo SOCIAL, de um tempo para cá tenho dois filhos, e eles são ótimos motivos para viver. Sem desejar ofender aos puristas, digo claramente que mesmo que eu não tivesse nenhum outro motivo para viver, meus filhos seriam por si só ótimos e suficientes motivos para valorizar a vida.
 
Entendo que esta resposta seja muito simplista, frente a complexidade e a importância desta questão para nosso comportamento enquanto vivos. Entendo também que esta resposta possa não possuir maior interesse para os demais amigos, mas é para mim importante por me dar motivos de continuar a viver e a me questionar, além de me permitir continuamente duvidar dela e assim continuar pensando, pensando e repensando... duvidando das respostas, me questionando de novo, e assim voltar a pensar sobre ela.
 
Para que viver?
Para realizar minha humanidade, construindo meu eu e minha existência.
 
Para que viver?
Para Amar, ajudar, doar, construir e se comprometer com a complexidade do viver.
 
Para que viver?
Para buscar a felicidade, não a qualquer custo, mas aquela felicidade decorrente da maximização do estado mental de felicidade por uma maior área geográfica possível, por um maior número de pessoas possíveis e pelo maior espaço de tempo possível.
 
Enfim, para que viver?
Para continuar buscando respostas e para participar da transformação social de nossa existência.

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 19/05/2012
Código do texto: T3677136
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