desconsolo

não sei se o meu coração,

sem se redimir de sua mácula,

não seja só um'invenção

que me mata.

invenção d'algum provérbio antigo

para provar que é errado

viver sem eira ou juízo,

redundante e condenado.

se não sou eu um passamento

fabricado com intenção maldosa,

quem sabe um vivemento

de parição vergonhosa...

ou se eu sou um'amnésia

que o tempo esqueceu de esquecer...

uma doença venérea

que o púbis do mundo houve de ter.

se não era pra eu não ter nascido...

se deveras eu não sou já morrido.

se, dos meus, não fui eu castigo

ou bênção de um diabo remido

errada, um tiro pela culatra.

se não sou eu um erro tolo

de um deus que por sorte maldada

fez nascer pra curar-se de um dolo.

eu nem sei se eu fiz bem em nascer.

se um dia n'outro mundo existia

e pudera um'outra vez escolher...

não viver desta vez escolhia.