Dizei ao tempo, Senhor, que não me tire esse amor, pois seria tirar-me a vida.

A vez primeira que ouvi teu nome, tive medo. Aquilo ecoou na minha insanidade por tanto tempo que eu não conseguia, sequer, respirar sem dor. Eu tive medo de descobrir o que havia por trás do teu nome. E quis te matar. De alguma forma, e sem qualquer motivo, eu quis te matar. E sumir com teu corpo, com teu nome e com tudo o que me lembrasse você. Então, tentei te esquecer. E viver apesar de.

Mas havia uma angústia, uma espécie de vazio, um não sei o que de... saudade. De alguma forma estranha, restava em mim alguma coisa de ti, do teu nome. Uma sombra, talvez. Eu quis ignorar, mas ouvi gritos e senti sorrisos dentro de mim. E era você. Inteiro. Corpo, nome e poesia. Você. E eu não tive medo ao abrir a porta e dar de cara com você. Pelo contrário, eu queria você. Mas não consegui dizer uma só palavra. E nos olhamos, somente. Eu te olhava como se pudesse descobrir o que havia por trás daqueles olhos que pareciam ter vida própria. E você me olhava como se quisesse me salvar. Deixei que entrasse em minha vida, definitivamente. E tranquei a porta para que não saísse. Queria te manter perto, já não sabia por quê. E todos os dias eu ia dormir achando que era só mais um sonho. Mas todos os dias você estava lá, no mesmo lugar. E só me olhava, sem dizer uma palavra. E os teus olhos pareciam ter vida própria.

Um dia resolvi que podia confiar em ti. E decidi te deixar livre. Então abri portas e janelas. Quis deixar o sol entrar. Mas, justo nesse dia, o céu estava carregado com toda a sua tristeza, e deixou que suas lágrimas inundassem tudo o que era vivo. Quis ficar triste. Não consegui. Ter você por perto aquecia a minha vida. De certa forma, você estava conseguindo me salvar. De mim.

Mas no dia seguinte, o sol gritava lá de cima toda a sua felicidade. E eu quis ficar alegre, mas não consegui. Eu sabia que não estaria comigo pra sempre. E sabia que aquela era a última vez em que estaríamos juntos. Ainda assim, mantive todas as portas e janelas abertas. Quis te dar a liberdade que eu mesma não tinha. Para minha surpresa, você permaneceu comigo todos os dias. E todos os dias. Sempre ali, com esses olhos que desnudam a alma até dos que não tem alma. E eu já estava tão acostumada com a tua presença. Mas já nem ousava dizer teu nome. Não poderia fazê-lo sem enlouquecer.

Mas era a tua presença a minha vida. E com tanto tempo te olhando, senti a necessidade de te ouvir. Ah, como eu queria te conhecer como você me conhecia! Queria te comer em todas as refeições do dia. E inventei lanches fora de hora só pra ter você cada vez mais perto, cada vez mais junto, cada vez mais sempre. Um dia, porém, notei um cansaço incomum. Aqueles olhos tinham vida própria e, de repente, pareciam ter perdido a vontade de viver.

E, com o teu choro, eu chorei. E, com a tua dor, eu me doía inteira. E, com a tua morte, tão aparente, eu morri mil vezes. E eu quis achar a cura e eu quis achar culpados. E ficou tão claro aquele verso, tantas vezes lido, tantas vezes gritado, mas que parecia ter tão pouca importância: a mesma mão que acaricia é a mesma que apedreja. Mas eu não consegui sentir raiva dela. Eu até senti gratidão. Agora você poderia ser meu. Agora você poderia ser só meu. Quanta pretensão! Quanta pretensão? Quanto amor! Me deixa juntar teus pedaços. E me deixa juntar teus pedaços aos meus, e me completar com teu corpo, e te preencher os espaços vazios com o meu desejo...