Sou louco

Uns me acham louco. Eu também me acho louco, mas por diferentes razões. Muitos me acham louco por ser materialista. Outros, louco me acham, por eu não acreditar no transcendental. Alguns mais me acham louco pelo que escrevo.

Eu também me acho louco por escrever, mas me acho louco porque o que escrevo não é suficiente para me revoltar de verdade contra a realidade hostil, desumana e perversa que discrimina, que segrega, e que divide seres humanos em seres de primeira classe e animais de segunda classe. Acho-me louco por não escrever a mais tempo, por não ser mais duro e realista no que escrevo. Acho-me louco pela tentativa de escrever sem magoar demais os outros. Acho-me louco por ser indiretamente conivente com o que aqui está, posto que não revolucione a sociedade e a mim mesmo, me revoltando contra as atitudes e comportamentos dos que com poder se perpetuam neste mesmo poder e fazem parecer normal esta realidade de indiferença social e humana que perpetua a miséria, o abandono e a discriminação entre aquilo que deveria ser um nicho social e humano.

Sim sou louco, mas um dia a loucura vencerá e a sociedade acordará do sono e da inação, e ai quem sabe ao custo de sofrimento desnecessário, tenhamos nossa mente e olhos abertos contra a domesticação secular e religiosa que nos acomete, sustentada pelos mesmos que dela diretamente se locupletam em poder politico e financeiro, convencendo por blasfêmias e mentiras, se comportando muitas vezes como profetas que prometem a salvação, nos convencendo que devemos ser pacientes na esperança que o depois será a remissão de nosso sofrimento, na incerteza de um amanhã que nunca chega, para uma multidão de sofridos seres abandonados por esta mesma sociedade que julga ser digna e humanitária.

Sim sou louco, louco de não ser louco o suficiente para dizer não, dizer basta, dizer é chegada a hora de revolucionar nossa humanidade, revolucionando-me primeiro a mim mesmo, em nome de uma dignidade humana e social para todos, de um mundo livre de dogmas e preconceitos, livre de falsas promessas, livre de falsas esperanças, livre de livros sagrados que mais dividem, pela simples necessidade de não perder poder, livre de nações, livre de bandeiras, livre de religiões, não necessariamente livre de religiosos que amem em primeiro lugar a vida pela vida, que amem a dignidade humana pela dignidade humana, sem amarras ou preconceitos, sem os limites que segregam e ofendem a humanidade que deveria nos dignificar como seres sociais.

Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 26/12/2012
Código do texto: T4053219
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