Aprendendo a voar

Já consigo sentir o cheiro da saudade que se aproxima; da dor que hei de sentir; do peito vazio, mas ao mesmo tempo, repleto. Explodindo de tristeza. A saudade do conforto, da comodidade, do afeto do lar. Já sou capaz de tatear a aspereza do mundo que me espera, me aguarda, me venera, pra fazer de mim alguém maior, melhor e também mais experiente.

Já posso sentir meus lábios tremendo, no meio do dia, usando de toda sua força para tentar conter o choro explosivo que já ultrapassa as barreiras lacrimais e, inevitavelmente, molha minha face, desce até os meus lábios e me faz provar do aguçado sabor da solitária melancolia.

Já posso imaginar os dias longos e cinzentos, com um profundo vazio que nada, além do amor do ninho, será capaz de preencher. Já posso prever minha instrospecção e o não-desejo de me aproximar das pessoas ao meu redor. Ou talvez não... Talvez a dor seja tão excruciante, que eu abrace com toda garra as oportunidades de me envolver com as pessoas que então farão parte do meu mundo. Um mundo provisório, mas que ainda assim, é necessário que eu nele viva. Quisera eu poder pular esta etapa e seguir logo para a posterior. Mas pensando bem, quem dera eu poder permanecer pra sempre nesta atual etapa, aninhada ao comodismo, que embora me conforte, também me mata um pouco mais a cada dia desperdiçado.

Vendo por outro lado, é o ciclo da vida. Inícios e fins, quedas, levantes e recomeços. E assim, o tempo passa, e se não houver audácia suficiente para ousar sair do próprio ninho, o tempo findará, e nada terá sido feito. Verás teus companheiros alçando seus próprios voos, enquanto você os assiste. Portanto, ousarei. Deixarei meu ninho para experimentar alçar meu primeiro e, provavelmente, desajeitado voo. E aos poucos, com a constante prática, aprenderei a voar sozinha, abandonando, assim, o meu ninho. Um dia, quem sabe, eu retorne, ou então fixarei meu ninho em outros ares, com outras vistas. É tudo uma questão de costume.