Vida



É estranha a vida, cujas lágrimas sempre visitam o ser que a realiza. Falha da vida? Falha do vivente? Não sei. Apenas sei que ser feliz em essência é impossível, mas dai a ser puro sofrimento já é outro caminho.
Sofremos? Sim. Sofremos por nós mesmos, sofremos pelo que a aleatoriedade da vida nos apresenta, e sofremos pelos outros. Mas no geral o sofrimento vem polvilhado de alguma alegria, passageira, mas capaz de nos fazer, horas por outras, esquecer aquele amargor do sofrer.
 
Cada um sabe realmente o que sente, quem sou eu para medir ou criticar o sofrimento dos outros. Entendo apenas, podendo estar errado, que muito do sofrer vem da ilusão de que a vida conspira a favor (os esperançosos), o tempo passa, e para a maioria de nossa esperança, ela não se realiza. Por estas e por outras que abri mão da esperança à muito tempo. Outra grande parte do sofrer vem exatamente do oposto, da sensação que a vida sempre conspira contra, que muitos são contra nós, que sou um coitado ou um nada. Neste sentido nunca fui assim. Para a maioria absoluta de nós, a vida não é tão benéfica, mas também não é tão malévola.  A vida é muito dinâmica e a maioria das vezes as pessoas nem nos notam, quanto mais para estarem conscientemente contra nós. O azar não é nosso companheiro, como a sorte também não é nossa irmã, mas entendo que para alguns a curva da distribuição de ocorrências acaba sendo mais visitada por eventos desumanos, tristes ou sofridos.
Retirada esta minoria, a impressão de sofrimento absoluto provem muito mais de um grau de esperança de retorno da vida muito alto, quando a vida não prove retorno, a vida segue em frente. Se muito espero, muito mais sofro. Assim busco esperar da vida o mínimo, busco aceitar o que tenho e lutar por melhorias, mas uma luta franca e aberta, sem basear a luta em certezas de retorno que podem nunca chegar.
 
Sou um ser humano da média, tenho momentos felizes, e tenho momentos tristes, sofro e me alegro, tenho dores físicas, doenças normais e ao mesmo tempo tenho energia para amar esta mesma vida. Tenho filhos, enorme alegria por isto. Sou humano, jamais poderei ser feliz por completo, pois seria desumano, enquanto crianças sofrerem do abandono, da miséria (social, econômica e humana), da exclusão e da fome. Mas sendo humano sinto alegrias do varejo do dia a dia, que se não me fazem um homem feliz, seria inconsequente, minimiza sobremaneira o sofrimento, e me leva até a momentos de imensa felicidade, felicidade esta que vem e que vai, mas que me fazem conviver com coragem e com alguma satisfação nesta vida.
 
Sei que falo isto porque tenho emprego, saúde mínima, tenho um lar para morar, tenho amigos e família, tenho auto estima, tenho condições sociais dignas, se fosse um dos abandonados e miseráveis, que sequer sabem o que é autoestima, que veem seus filhos morrendo de fome, de doenças, do abandono social e humano, enquanto uma boa parte da população estraga comida, estraga a natureza, seria muito mais difícil manter minha posição de que sou um homem das médias. A fatalidade me permitiu ser quem sou, mas esta mesma fatalidade foi tremendamente desumana para com muitos, em muitos lugares deste nosso planeta.
 
Arlindo Tavares
Enviado por Arlindo Tavares em 20/08/2013
Reeditado em 20/08/2013
Código do texto: T4443933
Classificação de conteúdo: seguro
Copyright © 2013. Todos os direitos reservados.
Você não pode copiar, exibir, distribuir, executar, criar obras derivadas nem fazer uso comercial desta obra sem a devida permissão do autor.