HÁ TEMPOS...

Há tempos...

Em que dizemos coisas para os outros, que precisamos dizer a nós mesmos. E que falamos, aconselhamos com palavras, das quais mais à frente teremos sede de ouvir. E quase sempre no momento de uma intensa dor, é que dizemos nossas maiores “besteiras” sem querer nada ter dito.

Há tempos...

Em que a alma cansada já de tanto se agitar, acaba se acalmando pelo seu próprio cansaço. E que algumas perguntas insistem, insistem, e pensamos que talvez não estejam certas. Que nos perguntamos se existiria um modo certo para falar, para pedir... E já exauridos sentimos como se a alma muda e sem voz, já tudo por nós dissesse.

Há tempos...

Em que ouvimos de alguém uma resposta diferente de todas as outras. E de repente o modo como nos sentimos em relação às nossas indagações muda totalmente. E assim sentimos que nos é dado um tempo para esquecermos do próprio tempo. E então, finalmente a pequenez do nosso entendimento alcança, o que de fato é importante que seja tocado por nós.

Há tempos...

Em que nos olhamos no espelho e não vemos a nossa própria imagem.

E o reflexo de nosso passado, mais que ultrapassado, insiste em ser presente. E nos sentimos melhor, pelo ato singelo de alguém querer insistir conosco e não desistir, por que enxergou além de uma imagem.

Há tempos...

Em que deixamos de ser uma mera projeção do que não aconteceu, do que falhou, do que não deu certo. E refletimos como podemos dar tanto sentido ao que não fez tanto sentido assim. E acabamos vendo que pesamos coisas certas em balanças erradas, e vemos que nos foi roubada uma porção boa de nós.

Há tempos...

Em que algo de nós fica perdido em algum lugar sem a nossa permissão. E em contrapartida, ganhamos muito do que não queremos com o nosso consentimento. E não contamos o presente, o hoje, o agora como algo que mais está valendo.

Há tempos...

Em que conseguimos distinguir a voz de quem realmente nos ama. E que as vezes, uma pessoa deseja dialogar conosco apenas para sentir-se bem. E de repente nesse simples diálogo com alguém, é que podemos ser devolvidos a nós. E finalmente somos arrancados do esquecimento e lembramos que temos e podemos também ser voz.