Pulsos
Vamos sair, gente. Vamos lá, agora abrir as portas de casa em plena madrugada, vamos sentir o cheiro e o gosto da noite, dessa gente toda, dessa vida toda tão desconhecida e despercebida aos nossos olhos. Vamos dar uma chance, isso sim. Chance ao estranhos, a nós mesmos, nossas vontades, dúvidas e impulsos esquecidos. Temos mais é que reavivar a juventude, por mais estranho que isso possa soar. Todos os dias, almas velhas morrem e renascem por pura obrigação, todo dia a gente desiste, deixa a fantasia pra lá, se compromete com o supérfluo, o vazio, aquilo que a gente não precisa. Vamos armar uma tenda, deixar o relento rasgar nossa garganta, arrebentar as cordas dum violão: vamos amar, vamos viver, deixar a raiva correr, o ritmo controlar nosso passo, dançar feito louco até amanhecer. Eu não acho que a vida seja curta ou preciosa demais, muito pelo contrário. A vida é uma piada de mau gosto, uma brincadeira infame pra nos enganar e nos fazer criar valor pro inexistente - chega disso. A vida é um escracho, então sejamos também. Um escracho gostoso de sentir, de lembrar, de marcar nessas páginas velhas que há muito não recebem palavras ou assinaturas de ninguém.