Nos Braços do Vazio

Demorou, mas por fim eu entendi. Depois de todo esse tempo, dessa eternidade de tentar decifrar, descobrir, sintetizar, essa coisa toda resolveu me fazer sentido de uma vez por todas. Eu não aqui para isso, para essa loucura toda, essa paixão, as brigas, as pazes, os amores e dores que a vida oferece, joga na cara da gente. Não. Sou uma daquelas que só assiste, que sente a emoção dos outros, que vive por eles, que os tira da água quando seus braços já não tem mais forçar para lutar contra a corrente. E eu não estou nesse oceano. Estou no deserto, na seca, no fim de tudo, no fim de mim, no começo que das vidas ao meu lado. As minhas palavras, ninguém ouve, e a minha força não tem como sentir. Ela atua escondida, disfarçada nos porões das festas alheias, dos desesperos e alegrias de quem passa por mim, mesmo que eu não seja vista. Aliás, nunca me veem, e sabe de uma coisa? Está tudo bem. Mesmo que inconscientemente, acredito que essa foi a intenção desde o início: ser a bailarina dos escombros, a voz que não sai do vácuo, a sombra que observa e aplaude sem ser notada. O meu universo é privado demais para mostrar, para exibir ostensivamente, com orgulho, com valor. É cheio de traças, de teias de aranha em pensamentos largados, em sentimentos que não valem a pena serem explicados, conhecidos. Eles são meus, meu fardo, meu peso para carregar, largar nuns cantos quando minhas costas já não aguentarem mais, ignorar, aceitar e me render. E por Deus, eu me rendo - me rendo ao sol, a mísera gota d'água que não conseguiu me afogar, ao abraço dum estranho, a paz da solidão. A minha paz. Eu posso viver mil vidas e amar todas elas, mas sei que nunca me pertencerão, e talvez essa seja a graça, a beleza da coisa. Não tenho dono, coleira, mestre ou amor: sou do vento que enche meus pulmões e me faz suspirar por toda essa gente, que me lembra que não existe abrigo para mim. Vou é vagar, correr, vadiar e esquecer de tudo isso que tanto quis e aceitar. Aceitar o mundo que existe dentro de mim e de longe, só de longe, amar e abraçar o dos outros, dos infinitos passantes pelos quais me apaixono dia após dia.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 26/03/2014
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