Sobre Almas e Multidões

As cidades estão cheias de gente. Cheias de nós.

Os finais de semana são os piores dias: muitas expectativas, mas para o quê? Filas intermináveis?

Todos os dias, inseridos nesse mar infindável de carne, nesses milhares de espectros, gente de bem, cristã.

Posso estar sendo injusto de ver todas as pessoas, todas essas pessoas, de longe e julgá-las tão iguais, tão desinteressantes. Mas e se olharmos de perto? Veremos algo muito diferente? Não.

Tudo vai estar lá: os ensinamentos de família, os dogmas religiosos, os pensamentos da televisão. As pessoas tentam se diferenciar, se sentir únicas de todo o jeito e no entanto são todas tão iguais... E as que tentam ser iguais, os camaleões se adaptando, são as mais diferentes.

Não sinto ódio pelas pessoas, mas elas me cansam. Não me despertam nada, nem afeto ou desafeto, simpatia ou antipatia. Aceno e concordo com a cabeça, mas não estou realmente ouvindo, estou longe demais, isolado no meu próprio vazio. Sou só um observador.

As cidades são multidões aglomeradas, tentando sobreviver e conviver, mas mesmo dentre tantos é tão raro encontrar uma alma! Difícil caminhada, e não há garantias de que entre duas almas haverá reciprocidade, ou possibilidade de conhecer-se intimamente, mergulhar-se, explorar-se... O mundo é um lamaçal onde patinamos sem sair do lugar. Não há escapatória, estamos todos com lama até os joelhos, tentando se afundar mais ou tentando sair afundando outros.

Quanto as massas, as massas famintas, deixo o mesmo alerta feito por outro: Cuidado com os que elogiam, pois precisam de elogios em troca. Cuidado com os ambiciosos, não hesitarão em mentir e enganar para obter o que querem. Cuidado com os estranhos, com os desgarrados, eles são mais fortes que você, eles sobreviveram a uma vida mais difícil que a sua. Cuidado com os que estão sempre sorrindo, com os quais a vida foi generosa, eles não entendem a sua solidão, eles não conhecem as sombras, o lado escuro da cidade, o fracasso, a ignorância deles te esmagará e cuidado com os religiosos, com os pregadores da palavra, eles são capazes de atrocidades em nome de Deus e tentarão te convencer a cometê-las por eles.

Toda essa preocupação vai te revirar o estômago, mas vai te manter vivo, acordado, olhos abertos, você verá mais do que apenas pele nos rostos, mais do que apenas dentes no sorriso, mais do que apenas gestos nos atos e ver tudo isso te fará perceber uma nova realidade, a mesma que você tem vivido desde que saiu do útero de sua mãe.

Só que agora ela te drena, suga tudo que existe dentro de você, como terra sedenta, como ratos famintos, como político brasileiro, como sexo oral, como a morte, como o sol. A verdade mais límpida.

Vinícius Risério Custódio
Enviado por Vinícius Risério Custódio em 07/04/2014
Reeditado em 30/04/2016
Código do texto: T4759814
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