Depois da neblina

Sabe duma coisa, no final disso tudo, eu vou ficar bem. Quem sabe se tiver um pouco de sorte, até antes disso. Ora, já não fui tão feliz em meio aos furacões, redemoinhos que pareciam não ter fim? Então ainda dá para respirar, fechar os olhos e deixar o tempo fluir de verdade, fluir sobre mim, meus desejos, meus medos que sempre parecem infinitos, perpétuos no meu caminho. Eles vão embora, tanto eles quanto as minhas vontades, darão lugar a novas, novos pensamentos ordinários, novas visões, sonhos até mesmo sonhos para mim. Sonhos, meu principal alimento, chão, confiança. E ao mesmo tempo, desgraça, perdição; sem eles não teria cicatrizes nem sorrisos para lembrar, não seria nada, ninguém com algo para contar, para lutar contra e a favor, sempre perseguindo-os e tentando em vão ser mais forte do que eles. A verdade é que eles são a minha única força: meu ar para suspirar quando o fôlego vai embora nessa velocidade maluca da realidade, meu conforto, meu resto de vontade, minha certeza de que, apesar de todo esse redemoinho que está ao meu redor, existe algo sólido, verdadeiro em mim. Por mais que eu mude, queira sempre ser outra coisa, outro alguém, é caminhando nessas minhas nuvens tão frágeis e ainda assim, tão reais quanto minha própria pele e consciência, que me encontro, lembro de existir, de enfrentar. Enfrentar-lhes, enfrentar a mim mesma, meus erros e tropeços, palavras mal usadas, rascunhos nesse plano cruel e delicioso que pode ser estar aqui. Aqui com toda essa gente, fingindo nada sentir, nada querer e traçando um rumo no mínimo, calmo, normal. Não posso me permitir enlouquecer aqui, sem esse equilíbrio não teria mais nada. Nada para chorar, sorrir e me fazer levantar dia após dia, sempre querendo e perdendo mais. Mais de mim, das pessoas com quem esbarro e tento compartilhar o que tenho guardado em mim, nem que seja só um pouco desse universo todo, universo meu.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 28/04/2014
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