Ultimato

E mesmo que eu nem saiba bem o porquê, daqui mesmo dou meu jeito de ver além. Além da vista dessa janela embaçada, da sujeira das lentes dos meus óculos, do que meu olho cansado e sempre ardendo por mais sono consegue. Eu vejo que tudo vai ficar bem. Eu vejo, eu sei. E assim, eu sinto, e nada me é mais extraordinário, mais difícil de aceitar, de acreditar. Mas eu irei, escolho acreditar nesse sentimento, por mais tolo, vazio e sem razão que possa ser. Que provavelmente é, digamos a verdade. Que isso é estúpido, infantil, oco e tudo mais de simplório, de banal que eu vivo tentando evitar. Mas não é a vida a coisa mais banal possível? Ora, ela é construída disso. Dos pequenos risos largados, das palavras que saem sem querer, dos passos que nós esquecemos de planejar, dos sonhos que nós nem ousamos achar possíveis tornarem-se reais. Sabe esse impossível? Eu o quero para mim. Quero esse êxtase bobo, essa euforia, paixão desenfreada pelo nada, pelo nada e tudo ao mesmo tempo. Eu me quero, quero toda a vida que possa habitar em mim, quero segurá-la, quero só por uma mísera vez, acreditar nessas minhas loucuras, aceitar as suas, as deles, de todos. Quero sentir só uma vez o gosto do insano, o prazer dos perdidos, enganados, feridos que assumem-se como são. Quero fazer parte desse redemoinho todo. Chega de ver, de assistir de longe e só imaginar como o gosto deve ser: por mais que me machuque, me escorrace sem dó, eu aceito. Aceito e até mesmo peço, imploro por essa fagulha de vida, de gente, de mim. Vou andar, correr e sentir o vento cortante no meu rosto, rasgando meus pulmões, tudo para mentir e dizer a mim mesma que valeu a pena. Simplesmente mereço a inocência, a vontade pelo simples estar, ser o que posso, consigo, sempre quis. E serei, disso tenho certeza. Por uma única vez que seja, serei-me em todas as faces possíveis, tudo que conseguir extrair de mim. Tudo para lhe dar, oferecer essas tentativas de vida, ser quem eu quase quero, mas antes e acima de tudo, quero ser para você. Então por Deus e por tudo-- me aceite, somente me aceite de uma vez.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 02/06/2014
Código do texto: T4830165
Classificação de conteúdo: seguro