Sentença

Falando bem a verdade, eu já estou mais do que cansada disso tudo. Sabe, de toda essa minha segurança, certezas inquebráveis, de sempre ter tudo ao meu controle, a palavra final na ponta da língua, as rédeas presas nas minhas mãos. Eu preciso, simplesmente preciso acreditar que sou mais do que isso.

Mais do que esse monte de fortaleza bonita, de cercas de arame farpado protegendo esse meu jardim seco, morto, sem cor. Ele pode ter tantas cores! E terá, por Deus, terá. Terá por mim, eu juro. Eu nunca confiei nas minhas promessas, minha palavra para mim mesma nunca foi das mais sólidas, pois a minha confiança nunca tive de ganhar-- era sempre o teu olhar que eu perseguia. Mas não posso mais depender dele, sabe? Olhe, admire e devore quem você quiser, eu lhe peço. Lhe peço, lhe suplico que o faça. Que arranque de mim qualquer mísera esperança de que ainda posso viver das tuas migalhas, que meus choros abafados te alcançam, que posso despertar em ti algo além disso, mera compaixão, mera consideração por alguém que sente e não sabe o que fazer com isso. Não, chega. De você, eu quero a vida; quero o ar, o sangue que corre nas veias, a voz no grito e no murmúrio, o toque do cumprimento cortês e do abraço impensado, maluco, insano. Quero toda insanidade que possivelmente exista em você. E eu sei, simplesmente sei que nada disso irá acontecer, então por mais que eu sonhe, queira e acredite, eu não apenas preciso, eu devo pôr meus pés no chão.

Nesse ato definitivo, eu selo minha sentença, eu admito o que posso ser e entrego-lhe minhas vontades, desejos e possibilidades. E não o faço com orgulho, viu. Faço com humildade até. Por mais que me doa, rasgue e despedace, eu sei que vale (ou espero eu, valerá) a pena. Eu me entrego a mim mesma, ao que sinto e quero do mundo, da vida e tudo que ela pode ser para mim. E nesse contexto de louca aceitação, de ousar olhar a verdade nos olhos e brigar, bailar, cair e voar com ela, nesse você não tem espaço. Não, o teu gosto serve-me apenas no sonho e nada mais, então lhe digo "adeus", mesmo que não queira, mesmo que esteja lutando para não te prender aqui comigo só mais uma vez.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 14/06/2014
Código do texto: T4844064
Classificação de conteúdo: seguro