Imutável

De todos os meus medos, a solidão é o menor deles. Na maior parte do tempo nem medo é, de verdade. Chega a ser até prazer, orgulho, motivo até de uma arrogância vazia que eu teimo em sustentar. Mas de vez em quando, ela torna-se algo maior. Diferente, ruim; de repente, não tenho mais a mim mesma, não quero ter. Quero outra coisa, outro alguém. Esse sim é o meu verdadeiro desastre.

Querer você, eis a minha ruína. Seja lá quem for, é sempre aquele lembrete de que existe uma vida lá fora para eu viver, conhecer, sentir. Passei tanto tempo sem ver tua face que hoje me é como despertar dum sono quase que eterno. Eu não acreditava que isso ainda existia para mim. Eu amei, sim. Amei, quis, sonhei mais do que uma pessoa possa imaginar e achei que isso iria me completar. De uma maneira, até que o fez sim, mas de tão certa que eu estava disso tudo, quando esse fio de vida que tu me trouxe resolve aparecer, eu perco meu chão. Meu chão de nuvens, de certezas intocáveis, seguranças e crenças só minhas, amores que o mundo nunca iria conhecer. Isso sempre me foi de um valor imensurável, sabe. E agora, simplesmente desapareceu. Eu não tenho mais nada, e é nessa hora que a solidão realmente mostra sua face. Quando perdemos a nós mesmos que notamos o quão sozinhos e vazios estamos, que afinal de contas, não podemos viver apenas com o que está contido em nós. É tudo maravilhoso, sim, isso eu jamais irei negar. Mas só a visão de um sorriso como o seu, sua voz perto de mim, um simples toque sem pretensão alguma já é o suficiente para me fazer desacreditar de aquilo tudo. E nessa hora, eu desmaio, caio, desapareço de vez. Me desfaço nas sílabas que tu proferes sem intenção, no ar que está entre nós, nos sonhos que eu de maneira ingênua até, tento conter, esconder e fingir que não quero saborear. Se o sonho é tudo o que eu tenho, ao negá-lo, o que me resta? Eu sei que a realidade não irá me abraçar. Por alguma razão, eu não pertenço à ela. Tento, me arrasto para sobreviver de suas migalhas e dizer que está tudo bem, mas nela não há verdade alguma para mim. Ela não me quer, sabe-se lá a razão. Não acontece para mim, é como uma tela sem cores que, por mais que eu queira, tente enxergar, colorir e apreciar, eu não consiga fazer parte.

Adoraria fazê-lo mais do que posso expressar. Quem sabe lá existiria algum jeito de viver em paz com o que se foi, o que quero e não posso ter. Poderia conciliar tudo isso e quem sabe, pertencer à alguém numa hora ou outra. Até mesmo a você, por mais insano que isso pareça. Agora eu não tenho o acalento de estar sozinha, mas sim os choques contínuos de estar solitária. Não sou nada por mim e jamais serei para você. E por Deus, como gostaria de ser. Ser a fortaleza que merece, precisa para repousar desse caminho tão bonito que traça todo dia mesmo sem saber. Se eu tivesse um resquício só disso tudo, já me consideraria a pessoa mais preenchida do mundo. A pessoa que mais me inspira amor deu-me um rastro da beleza que possui, é lindo só de imaginar. Mas eu não posso, não devo. Para o inferno com a ilusão, eu mereço essa dor. Mereço por não ser uma peça do teu dia, tua vida, teu chão. E nem toda fantasia que possa existir dentro de mim jamais irá fazer isso desaparecer, esse vazio que tu criou e deixou lá para o vento, os teus ecos passarem e me lembrarem de quem sou.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 11/07/2014
Reeditado em 11/07/2014
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