INERTE

Sei de muita coisa que não vi.

Pego-me entendendo assuntos que sequer ouvi falar.

Nunca sei como começar. Pois todas as coisas já existem aqui dentro de mim.

Estou reduzida a pó de estrelas... Ai de mim.

Andei inerte na minha lucidez, ou seria lúcida na minha inércia? Não sei.

Só sei que estive inerte e parecia uma bolha de sangue coagulando.

Sinto-me envenenada... tampada num vidro e na contra-mão uma clareza gigantesca arregala meus olhos.

Escrevendo isso agora e penso se estou dedilhando silenciosamente. Minha letra não pode gritar, ela tem medo dos segredos aqui expostos.

Bom, não sei.

Preciso de ajuda.

Sinto-me infinita. Não me alcanço e também não consigo pensar em ninguém que ao me tocar com as mãos, me faria sentir o pulsar do seu-meu coração. Não sinto.

Minha clareza me faz enxergar que ando impulsiva, intuitiva, tudo além do normal. Ando realizando, mais do que pensando.

Minhas palavras me roubam da morte e transfundem essa energia que me envolve.

Fugi da realidade... seja lá o que ela signifique.

Enxergo uma ideia, um hálito sôfrego por beijos, enxergo a magia passeando no precipício.

Esse estigma da mentira e da inconstância. Essa gente que quebra o coração e se dá por feliz com os mil pedaços de espelhos que voam e cegam mais um monte.

Ando cansativa?

Não sei. Você acha?

Seja paciente por favor.

Estou tentando somente atingir a palavra perfeita. A nota harmônica. O golpe de clemência. O ápice dos amantes. Quero atingir alguma lógica nessa minha alucinação.

Como disse, não ando sabendo começar. Sim, isso é o começo... e pode ser que nele já estejam o meio e fim. Isso depende de como você está me lendo e sentindo.

Pareço conhecer uma versão de mim que já foi... Não me alcanço. Estou entre dois pontos, dois fatos, dois mundos, dois muros, dois filhos e dois amores.

Estou sentindo a respiração do mundo no meu pescoço. E isso me dá muito medo mas também me dá tesão.

Sinto agora que me perdi de vista diante dessa imensidão descrita acima.

Sinto somente o gosto do chá de canela ardendo a língua. Essa ardência me faz escrever para confessar que ando perigosa também. Ando a ponto de matar ou a ponto de morrer. Pois quando vejo esse nosso último suspirar, vejo também a vida toda. Ironicamente a vida está no fim da morte.

E a vida é essa mulher que ama blues, com complexo de idade , veste-se com roupa de baixo de seda barata e vive com os cabelos cheio de bob's. Ela - a vida - por saber de seu real estado veloz e voraz - essa coisa detestável - nem se preocupa em vestir seu melhor vestido, pois sabe que num piscar de olhos vai sucumbir. Então, ela pegou e me deu muita coragem, um nome, alguns muitos defeitos e uns números de identificação e me jogou nessa arena.

Da arena, construí reinos. Mas não escreverei sobre meus reinos aqui pra vocês, pois muitos me julgariam incauta.

Acho que aqui do fim cheguei ao começo. Culpa dessa minha gula feroz pela história toda. Metades não me sustentam. Essa minha impaciência em pensar na hipótese de não espalhar todo meu pó de estrela.

Estou com um sono agudo e de tão agudo chega a ser covarde.

E tem gente que ainda virá me perguntar:

__ Mas, quem é você?

Como prenúncio já lhe respondo:

__ Aí você está querendo saber demais. Eu não faço a menor ideia. Talvez eu seja isso:

Uma eterna interrogação. Uma versão detalhada daquela que eu poderia ser ou já sou - tudo depende do momento em que você me lê.

Angélica Vespúcio
Enviado por Angélica Vespúcio em 30/07/2014
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