boring

Eu já nem ouso mais a escrita de alguns poucos versos fracos, pois a maioria deles, se tivessem cor, seriam nudes. Nem a literatura me move mais. Só sei começar frases com a maldita primeira pessoa do singular. Tenho sido tão eu que estou perdida em mim. Nunca consegui escrever diários, nem seguir agendas, nem fazer anotações, nem colar lembretes num mural gigante no meio da parede mais vibrante do quarto. Eu sempre quis fazer todas essas coisas. Parece complexo, coisa de gente que se conhece e estima. Não eu. Eu que me encaixo em todos os lugares mas nunca caibo em nenhum. Eu, que sempre quero o que não posso ter, e me dói o clichê, mas estou sentada no quarto ouvindo a Charlotte Gainsbourg cantar enquanto penso no furo que você tem no meio do peito, não o oco do coração, mas aquele, no meio da tua magreza. Penso também nos goles de conhaque afobados que minha melhor amiga dará pela vida, enquanto chora, sorri, ou transa. E nas cinturas que meu atual amor desenha com as mãos quando estou longe, e me excito com a possibilidade de não serem tão curvadas quanto a minha. O sentido disso tudo talvez esteja em algum autor, pensamento, filosofia, mas ultimamente ando lendo muito, já até aprendi a escrever Nietzsche sem olhar no Google, e ainda não encontrei nada transcendental. Fernando Pessoa, Mia Couto, Hilda Hilst… algum mais? Por favor, o meu fiel companheiro Drummond já não fala mais comigo e nem me põe no colo pra chorar. Alguns conflitos familiares me pesam as pálpebras mas nada é pior do que a sensação de ter todo esse peso nas ideias e tanta leveza nas ações.

Por previsibilidade, não terminarei esse pensamento, pois nunca termino nada (quiçá esse filme do Tarkóvski que acabei de dar play). Continuarei dentro de mim tentando chegar na grande epifania que procuro. E, até lá, dissolver-me-ei na minha própria mistura insossa.

Keuri Caroline
Enviado por Keuri Caroline em 09/08/2014
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