Aviso

Agora já é tarde demais, entenda. Não posso, não quero mais deixar-lhe partir daqui. Não quero e não farei-o, isso te prometo; se tu fores embora, não será por mim. Gritarei, farei de todas as cenas, discursos de amores perdidos que me vierem em mente. Desgraça, já me controlei demais aqui. Me proibi, permiti a entrada de nada além dessas minhas velhas certezas, vontades comedidas, desejos sem maldade. Agora não, agora chega; quero nada além da malícia, do ópio que és o gosto sutil da tua pele rosada, teu toque pesado e cheio das piores pretensões. Quero-lhe, quero-lhe de todas as maneiras possíveis, das maneiras que tu deres-me permissão, licença para dizer, arriscar a menor expressão. Se tu queres ir, imploro que vá, que corra o mais rápido que puder. Não alimente-me com suas migalhas, não deixe-me arrastar pelos teus pés. Prefiro infinitamente o golpe misericordioso duma vez do que apenas viver na mendicância ao seu redor. Me mate, se fores esta tua real intenção. Mas mate logo, de golpe certeiro, sem piedade nenhuma-- e eu te garanto que meu rosto irá lhe assombrar. Tu lembrarás de meu semblante faminto todas as noites e irá pedir por esse gosto de volta. Mas eu já terei partido, e só lhe restará a lástima, a amargura de ser, afinal de contas, o amante que termina só. O que chora, o que quer. E por mais que eu lhe ame, terei comigo a maldita vaidade de saber que sim, meu rosto ficou lá contigo.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 29/08/2014
Código do texto: T4941179
Classificação de conteúdo: seguro