Corrosão

Estranho. É estranho demais passar pela mesma sala todo dia e não te ver lá. Não ouvir a tua voz, o teu riso grosso, grave passeando pelo meu ouvido. É insano demais isso, te amar desse jeito e ainda ver que teu rosto se embaça todo quando tento buscá-lo em minha mente. Ele só vem quando quer, quando dá na telha. Estou sozinha, quieta, parada, só dedicando meu ócio para a sua contemplação, mas não adianta. Dá aquela inquietude, euforia desgraçada que só quer que eu levante e me obrigue a viver. Que eu ignore a lembrança e a vontade de ti como se nem ao menos existissem. Aí que fica impossível: eu corro, sumo, caio e me arrasto com o dia pra ver se faço dele algo que preste, que valha toda a dor, mas não adianta. Quanto mais eu puxo o fôlego em mim pra fugir de você, mais tangível e ardilosa tua sombra se torna ao meu lado; parece que não há meio de eu sair disso duma maneira bonita, resoluta-- agora é minha obrigação de sentir toda essa dor. Eu abri as feridas, então que me corra o sangue solto só para eu não esquecer. Eu pedi esse amor, o prazer e o ardor corrosivo que ele traz consigo, então não posso me queixar. Até mesmo quero esse final, contanto que seja em teu nome. Que eu possa acreditar num sacrifício nisso tudo, que seja só para não te perder. Pra isso, eu te juro, morreria todas as vezes que me pedisse. Pra você, só pra acordar mais e mais infinitas vezes ao teu lado.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 03/10/2014
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