Dualidade

Engraçado como a gente passa a vida toda ouvindo sobre o amor. Chorando por ele, indo atrás, buscando de todos os jeitos possíveis para nós. Nos dizem que ele é a nossa única salvação, que é a única saída das sucessões de frustrações, de mágoas que carregamos a vida toda.

Mas, pensando bem, acho que não é bem assim; de verdade, eu acho que o amor, o amo de amar já está fadado à dor de qualquer maneira. A gente quer amar, certo? E queremos ser amados no primeiro minuto também.

Aspiramos, sonhamos, idealizamos todo um caminho pra esse sentimento utópico que a gente põe na cabeça, mas, se pudéssemos olhar todo o contexto, todo o rumo para alcançá-lo, veríamos no ato: não tem escapatória dessa dor. Se amamos de longe, dói. Se é correspondido, uma hora ou outra doerá também; um ou outro se vai, nos deixa, nos ataca. Ou a vida simplesmente os leva embora, não nos deixa esquecer de, independente do cenário que inventamos, estamos sozinhos nesse palco.

As pessoas vem, passam, deixam de si, levam de nós, dores e amores, prazeres etéreos que a gente sempre tenta eternizar: é isso que nos compõe. E é isso que será nossa destruição. Eu te quero hoje e posso tê-lo, mas não sei de teu próximo passo, palavra, ação. Não sei se esse chão debaixo de nós irá rachar e separar os horizontes, a vista de cada um-- e isso irá acontecer.

Amanhã meu gosto pode não lhe encantar e saborear outra pele, teu toque pode rasgar-me e me conduzir para longe de ti. Mas sim, os amores eternos! Essa é a imagem que nos obriga a permanecer aqui, dando tiros no escuro à espera duma certeza de que possamos, independente de com quem, um dia não ficarmos mais sozinhos.

E não é possível, o fim não deve nos ocorrer, surgir na mente: um dia, uma hora um desses tantos suspiros será o último e não estará mais contigo para acolher ao lado. Nessa hora a gente não pensa, não sabe o que faz. A dor de amar, de colocar-se à mercê disso tudo é inevitável, paciência; a única coisa que dá pra gente fazer é aceitá-la. Aceitar o corte de quem não nos quer, de quem vem e vai embora, do tempo que os leva daqui. Se é para sangrar a ferida, que seja. Mas antes, vamos sentir a pele macia, vamos roçar os dedos nas linhas de quem está conosco e aproveitar, nos sufocar nesse calor. É dele e somente dele que iremos lembrar quando tudo já tiver desaparecido daqui.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 23/10/2014
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