Borboletas

É tanta coisa na cabeça que pareço estar no eixo da loucura o tempo todo. É tanto medo, tanto sonho. Tanta vontade que nem nome tem, inspiração medíocre que vem, encanta e vai embora. Tanto gosto de tanta gente. Gente essa que, vê se pode, nem experimentei. E nem irei fazê-lo, sei disso. Como sei de seu sabor, então? Eu os imagino.

Os quero de todos os jeitos e formas, todos os aromas que suas peles possam carregar. Quero as brigas e reconciliações, as acusações sem fundamento, os beijos que vem de repente e sugam a gente nesse meio todo. Nesse universo que é o paladar de cada um, a lembrança, o tocar e querer. Tocar agora, querer depois, é sempre assim. Ter toda essa raiva e receio, todas essas palavras que a gente não sabe, consegue soltar na hora. E esse monte de cor, vai pra onde? Os planos, tão tracejados, terão mesmo algum uso no final? Que nada. A gente sabe que vai cair e, olha só, temos a pachorra até de planejar a queda.

Eu o faço, e acredite, os impulsivos sabem dessa também. De jeito diferente, mas tanto quanto eu, quanto a gente, os que admitem o medo. Que seguram as borboletas no estômago e deixam-as voar uma por uma. Admiram a cor das asas, desviam-se da direção torta em que elas voam. Pra quê soltar tudo de uma vez, me diz? Aí elas se vão e a gente fica assim, sozinho. Sem cor, sem vida, sem a cócega que encanta e incomoda internamente o tempo inteiro. Eu quero isso, posso te jurar-- quero esse medo, essa fome que, de migalha em migalha se sacia, se preenche.

Quero matar a sede em pequenas e contadas gotas, quero fingir que não sei da enxurrada que ainda virá e fará-me afogar uma hora ou outra. Apaga essa luz, vem dar tiro no escuro: vale bem mais a pena. Se a gente acerta no ato, falta alvo depois pra torcer a vista e tentar acertar. Eu quero mais é errar, quero o gosto da falha, recolher as balas de festim caídas no chão e sair soltando-as por todo o lado, onde eu puder acertar e colorir, sentir e guardar comigo.

Esse vendaval todo, ah, ele vale a pena sim. Vale no momento em que eu respiro e deixo-o fluir, fluir por mim e minhas matizes, não o nego nem sufoco de uma vez, apenas o permito carregar-me e definir-me, cor por cor e passo por passo. Delírio e dor incessante de cada vez, é assim que eu gosto e escolho por hoje, por agora em que tenho todo esse horizonte lindo e turvo, difuso à minha frente.

Letícia Castor
Enviado por Letícia Castor em 29/10/2014
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